FIT-BH

Tempos de hoje revisitados pelo passado 

Grupo Clowns de Shakespeare apresenta “Abrazo, neste fim de semana, no Teatro Francisco Nunes

Por joyce athiê
Publicado em 27 de maio de 2016 | 03:00
 
 
Dramaturgia. Sem uso da palavra oral, “Abrazo” constrói narrativa pela ação Rafael Telles / Divulgação

Dois casais homoafetivos se beijam e compartilham afetos aos olhos de homens da política que manifestam seu preconceito ao regerem as regras de uma sociedade, de forma a limitar a expressão das individualidades.

É exatamente na semana em que vimos circular pelas redes socais a foto descrita acima, tirada na Câmara do Deputados, no dia 24 de maio, que Belo Horizonte recebe hoje, dentro da programação do Festival Internacional de Teatro Palco e Rua – FIT-BH, o espetáculo “Abrazo”, obra que cria um espaço onde não é permitido o ato de abraçar.

“O que era para ser uma história que revisita o passado acaba sendo um registro documental mais natural do que estamos vivendo no país, mas também é o que se vive na Argentina e no Peru, com a candidatura da filha do Fujimore, que foi um ditador”, contextualiza o diretor do espetáculo, Marco França.

“Parece que ‘Abrazo’ foi construído nesta semana”, diz o diretor. Para ele, graças a acontecimentos recentes, “Abrazo” “acaba sendo uma triste fotografia do presente, o que o torna ainda mais importante para que possamos refletir sobre todas essas questões, de forma simbólica, poética e metafórica”.

A peça é do grupo Clowns de Shakespeare, do Rio Grande do Norte, e é a segunda parte da trilogia que traça caminhos paralelos para a companhia, dedicada a pensar o dramaturgo William Shakespeare pelos olhos do clown. A dramaturgia de “Abrazo”, embora assinada coletivamente, é livremente inspirada em “O Livro dos Abraços”, do uruguaio Eduardo Galeano.

Sem se desligar do bardo inglês, o grupo se abre a pesquisar o contexto latino-americano, na busca de uma história compartilhada. As demais peças que compõem a trilogia são “Nuestra Senhora de las Nuvens”, de Arístides Vargas, argentino radicado no Equador, e “Dois Amores e um Bicho”, do venezuelano Gustavo Ott.

“Há um tempo, o grupo vinha com o desejo de investigar o universo latino-americano, a nova dramaturgia e as temáticas ali presentes, que nem sabíamos o que seriam, mas enveredamos para o que temos em comum, no que diz respeito aos processos ditatoriais que vivemos, questões culturais e políticas”, diz França.

Mas, dentro desse traço que unifica a pesquisa, “Abrazo” traz algumas peculiaridades. Diferente das demais, ela é voltada para o público infantojuvenil, mas traz a dimensão de um tema de interesse também para os adultos. “É para a infância de todas as idades, para a que você teve, para a que eu tive, para a infância de quem tem 80 anos”, diz.

A peça se passa em um momento em que um ditador determina regras que devem ser seguidas dentro de um determinado espaço onde os personagens contam histórias de encontros, despedidas, opressão, exílio.

Entre as proibições que vivem, também é impedido que as pessoas falem. O mote possibilitou uma continuidade da pesquisa que o grupo vem desenvolvendo a respeito do não uso de palavras para criar uma narrativa. “Não temos a palavra oral, é importante frisar. Mas o corpo fala muito, assim como os objetos, a música, a construção dramatúrgica. Tudo fala, mas isso não se dá pela oralidade, mas pela ação”, conta o diretor.

A trilogia é também o espaço em que o grupo experimenta outras funções. “Queríamos elencos distintos em cada peça e experimentamos trocar alguns papéis. Esse, por exemplo, é o primeiro espetáculo que dirijo. É a primeira dramaturgia que César Ferrario [ator do grupo] assina em nome do coletivo”, comenta.

Serviço. Espetáculo “Abrazo”, hoje, às 19h, amanhã, às 17h, e domingo, às 19h, no Teatro Francisco Nunes (parque Municipal). Ingressos. R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia)