Dicas para dias de quarentena

Titane é a convidade de hoje da Orquestra Sesiminas Musicoop

Na live, que se insere no projetom Dando Corda, a cantora vai falar sobre cultura musical afro-mineira

Por Patrícia Cassese
Publicado em 29 de abril de 2020 | 15:29
 
 
Titane: a cantora já dividiu palco com a orquestra Musicoop em três ocasiões, como em uma comemoração ao Dia da Mulher Luiza Palhares

Dando sequência à maratona de lives que compõem o projeto "Dando Corda", a Orquestra Sesiminas Musicoop conversa hoje à noite - mais precisamente, a partir das 21h30 - com a cantora Titane. Conduzida pelo maestro convidado Marco Antônio Maia Drumond, o bate-papo será norteado pelo tema "A Cultura Musical Afro-mineira", elemento que permeia toda a obra da artista. A transmissão ao vivo pode ser vista pelo instagram: @orquestrasesiminasmusicoop.  Titane, vale dizer, já teve três encontros profissionais com a orquestra, entre eles, o concerto "Mulher em Canto", realizado no dia 8 de março de 1999, em homenagem ao Dia da Mulher. 
"Hoje nós vamos falar sobre as relações da cultura afro-mineira e a música.
 
E quando me refiro a cultura afro-mineira, campo que é muito vasto, eu vou tratar dessa vertente mais ligada ao congado mineiro, propriamente", diz Titane, ao Magazine. "A gente chegou até a década de 80 sem que os elementos da música feita por essa tradição em Minas Gerais fossem conhecidas dentro do universo da música brasileira - e isso também porque o próprio congado se mantinha basicamente dentro de seus lugares de origem. Na verdade, históricamente, o congado sempre viveu uma relação de conflito nas suas próprias cidades/comunidades, caso, por exemplo, de Oliveira. Ao mesmo tempo em que as pessoas tinham orgulho da festa, durante vários momentos da história da cidade, o evento era interrompido, suspenso, por pressão de segmentos de bastante conservadores - diria racistas mesmo, que o impediam de acontecer. Ouvi muitos relatos de velhos capitões que ouviam que 'se tocasse tambor, dava cadeia'. Só por volta das décadas de 80, 90, é que essa questão se inverte, historicamente", repassa ela, referindo-se ao período no qual o congado passa quase que a ser assimilado por outros setores da sociedade. "Na verdade, o conceito que envolve o termo folclore não diz tudo sobre o congado. Ele é uma cultura, um reinado do rosário, uma maneira de entender a vida, o cosmos, as relações sociais. É muito particular, e é de uma beleza, de uma riqueza, de uma complexidade, muito grandes".
 
Perguntada sobre o que vem ocupando seus dias de quarentena, Titane conta que está se dedicando a um trabalho, mas não exatamente novo. "Na verdade, trabalhos novos, a gente sempre tem em mente, mas o que estou objetivamente fazendo agora é finalizando, junto ao Grupo dos Dez, o novo trabalho deles, que é a respeito de um personagem histórico, Baquaqua, um negro africano que veio para o Brasil, foi escravizado aqui, e fugiu, passando por vários países. Ele e deixou uma autobiografia, e é com base nela que o grupo está montando o espetáculo". A cantora conta que a produção tinha sua estreia programada para junho. "Mas, diante da quarentena, tudo está sendo revisto. Estamos refazendo tudo, mantendo o mesmo texto, claro, as cenas, mas adaptando a formatos 'pandêmicos', eu diria (risos), porque, claro, por ora não vai poder ser assistido presencialmente. Então, a gente está aqui, mas também está sendo uma experiência boa pensar esse espetáculo de outra maneira".
 
Já sobre a proliferação de lives em função do momento de distanciamento social, Titane o avalia como interessante, rico e divisor de águas. "No meu caso, as primeiras que fiz, não foram propriamente de música ao vivo, mas sim sobre espetáculos que foram recentemente colocados no YouTube e os quais eu gostaria muito que mais pessoas assistissem e pudessem ter contato com os vários elementos que compuseram esses processos de trabalho. Montagens reconhecidamente afro-mineiras, que misturam a música e teatro de forma muito particular, claramente colocando a música dentro do espaço das artes cências, e colocando o movimento cênico afetando a realização músical".
 
Ela prossegue: "É raro o artista conversar diretamente com o público, porque, nos espaços tradicionais, sempre há intermediários, e não há tempo ou espaço para conversar com mais profundidade sobre nossos processos. A live está permitindo isso, é esse espaço para que a gente possa conversar sobre esses assuntos relacionados aos nossos processos de trabalho, então, nesse sentido, é algo especial, uma boa novidade. Ao mesmo tempo sinto que, como tudo nas redes, elas podem se esgotar rápido. Talvez evoluir para outros formatos".
 
Quanto a isso, Titane diz ser necessário cautela. "O que era uma live bem simples, e que tinha valor justamente pela simplicidade, por expor nosso dia a dia, uns aos outros, ela começa a ganhar tratamento de eventos, ou de evento ao vivo filmado, ou de evento cibernéticos, eu diria (risos). Daí começam a surgir lives com bastante intervenção tecnológica na edição, por exemplo". Mesmo assim, ela entende que, na balança, o pêndulo pesa mais para o lado positivo. "Estamos assistindo a lives desprentesiosas, que eu acho maravilhosas. Inclusive, deixam um registro muito bonito das performances musicais, da espontaneidade com que a música pode acontecer dentro do músico. De todo jeito, acredito que se não seremos mais os mesmos depois dessa pandemia,  por uma série de questões, isso se dará tempo neste âmbito mais particular, de testar formatos e criar novas relações entre nós, músicos, e as pessoas que gostam de música, e nos assistem e escutam. Tudo está para acontecer. Mas é importante apenas salientar que essas lives e outros novos formatos não têm solucionado a questão financeira da vida do artista. Nisso continuamos com as mesmas questões de sempre,  cobrar, não cobrar, quanto cobrar, as pessoas pagarão para ouvir algo novo, não pagarão... E também não esquecendo que entre nós todos estão as grandes empresas que pensam esses grandes portais, como Facebook, Instragram ou YouTube, com regras que são extremamente mercantilistas. Desse ponto de vista, a coisa é séria, porque estamos de dominar os meandros, o  que deve ou não prosperar dentros dessas redes. É uma ilusão pensar que temos domínio do que faz uma postagem circular. Não temos controle algum disso".