Cuidado

Falhas levam a obras sem fim 

Mal detalhados, projetos levam a aditivos que encarecem contratos

Seg, 27/04/15 - 03h00

A visão de que a vantagem na contratação de serviços é unicamente a obtenção do menor preço coloca em xeque a importância que se dá à qualidade das obras. Profissionais da área de engenharia e especialistas em licitações ouvidos por O TEMPO criticam o processo como um todo, no qual, muitas vezes, gasta-se mais tempo executando do que planejando os empreendimentos. O resultado são construções intermináveis, e ou estruturas frágeis que apresentam falhas logo após a entrega. Sem contar os gastos além do programado.

No complexo de viadutos da avenida Pedro I, nas regiões da Pampulha e de Venda Nova, as obras ainda estavam sendo executadas quando o Montese teve um deslocamento de 30 cm, em fevereiro do ano passado. Foi o primeiro sinal de que algo estava errado. Em julho, uma das alças do viaduto Batalha dos Guararapes desabou, matando duas pessoas e ferindo 23. Tempos depois, constatou-se que todos os elevados da via tinham problemas de sustentação.

“Uma correção na obra na fase de projeto custa de 1% a 2% do valor total do empreendimento. Já uma alteração do empreendimento em execução ou após sua conclusão pode custar 10% a 20% do custo total, porque é preciso novos estudos, mobilização de equipe e, às vezes, demolição”, explica o vice-presidente do Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia (Ibape), Frederico Lima Coelho.

O erro, segundo analistas, começa na elaboração do projeto básico, com base no critério do menor preço.

Mais detalhes. “Há uma tendência do gestor e da própria engenharia de sempre jogar o valor para baixo. É uma visão de que nunca se tem dinheiro para nada. No fim das contas, as obras não terminam, e a economia se torna inviável”, argumenta o presidente do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Minas Gerais (Crea-MG), Jobson Andrade.

Segundo ele, além do menor preço, outro grande problema é que as obras são licitadas tendo como base, na maioria das vezes, apenas o projeto básico, que traz uma concepção da obra, o que se pretende executar e o orçamento para tal. “A definição nunca é clara, e, quando é, não é bem entendida. A pressa de muitos gestores (para fazer a obra dentro dos mandatos) faz com que eles abram mão de projetos mais detalhados, o que é incoerente, pois, se não há detalhes do que se quer, não é possível colocar o preço adequado”, completa Andrade.

Os aditivos que encarecem a obra durante a execução e a demora na conclusão por falta de verbas são as consequências desse ciclo vicioso. No caso da Lei 8.666, são permitidos aditivos de até 25% do valor contratado – já o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) não permite aditivos de preços.

“Quando se licita uma ponte, a obra está orçada no projeto básico. Na hora de executar, descobre-se que a sondagem é mais profunda. Aí vem aditivo, e a obra não termina nunca”, exemplifica o engenheiro civil Berilo Torres. O que falta, segundo o mestre em direito público e professor do Centro Universitário Una Felipe Mucci, é um bom planejamento. “Tudo o que começa mal termina mal e tende a dar problema”, concluiu.

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