São Paulo

Eleições 2020: Subprefeituras expõem loteamento e 'centrão paulistano' de Covas

Aliança de Covas inclui legendas que, no Congresso Nacional, integram o chamado centrão, bloco parlamentar que se aproximou do presidente Bolsonaro e, em SP, ao governo Doria

Por FELIPE BÄCHTOLD E JOSÉ MARQUES (FOLHAPRESS)
Publicado em 26 de novembro de 2020 | 14:32
 
 
Bruno Covas (PSDB) em campanha na Zona Norte de São Paulo Foto: Fotoarena

Dono da maior coligação no primeiro turno, o prefeito Bruno Covas (PSDB) reparte atualmente entre indicados de ao menos oito partidos as 32 subprefeituras de São Paulo, estruturas de alta relevância no xadrez político da cidade.

Os 11 partidos da chapa já o apoiam na Câmara Municipal, movimento recompensado com indicações políticas nos cargos da prefeitura.

O arco de alianças de Covas inclui legendas que, no Congresso Nacional, integram o chamado centrão, bloco parlamentar que se aproximou do presidente Jair Bolsonaro e que no plano estadual está alinhado com o governo João Doria (PSDB).

Algumas das siglas são marcadas pelo comportamento político fluido. Em troca de espaço na prefeitura, deram apoio a diferentes gestões, inclusive do PT.

O PP, que em São Paulo foi por muito tempo liderado pelo ex-prefeito Paulo Maluf, integra hoje a chapa dos tucanos e comandava uma subprefeitura neste ano.

No quinhão do MDB nas regionais há um caso curioso: o subprefeito Valderci Machado, de Capela do Socorro (zona sul), já havia dirigido outra subprefeitura, a de Santo Amaro, na gestão Fernando Haddad, do PT –partido que é historicamente o maior rival dos tucanos. O MDB foi aliado do PT naquela época.

A indicação de Machado é associada ao vice na chapa de Covas, Ricardo Nunes, hoje vereador. Conforme o jornal Folha de S.Paulo revelou, ele é sócio de uma empresa que aluga prédios para creches conveniadas da prefeitura, modelo investigado por supostas irregularidades.

Já o Cidadania comanda a Subprefeitura da Lapa (zona oeste), com Leonardo Santos. O Pros tem influência na regional de Sapopemba (zona leste), dirigida por Christian Lombardi: o secretário-geral municipal do partido é chefe de gabinete.

O comando de uma subprefeitura tem um forte apelo para aliados do prefeito, ainda mais em um ano de eleição, já que amplia a influência em determinados redutos eleitorais da cidade por meio de obras e serviços.
Esses órgãos formalmente têm como função planejar e executar ações locais, articulando diferentes áreas da administração municipal.

A gestão de João Doria, eleito com Covas em 2016, tinha um plano de descentralização na qual o poder desses órgãos seria ampliado. Doria até trocou a nomenclatura –elas passaram a se chamar "prefeituras regionais", nome abandonado em 2018, já sob o governo do ex-vice.

O próprio Covas acumulou, no primeiro ano de mandato de Doria, o papel de vice-prefeito com o de secretário responsável pelas prefeituras regionais.

A divisão de poder nas subprefeituras hoje inclui filiados a partidos que não se aliaram a Covas e que mesmo assim permaneceram comandando suas regionais.

Foi o caso de Guaracy Monteiro Filho, do PTB, e Gilmar Souza Santos, do Republicanos, que comandam respectivamente as regionais de Guaianases e de Itaim Paulista, ambas na zona leste. O Republicanos lançou neste ano para a prefeitura a candidatura de Celso Russomanno, apoiado pelo PTB e pelo presidente Jair Bolsonaro e que foi derrotado no primeiro turno.

Não teve a mesma sorte o presidente municipal do Solidariedade, Pedro de Sousa Filho, que comandava a Subprefeitura de Santana/Tucuruvi e acabou exonerado em setembro, às vésperas da disputa eleitoral.

O partido dele resolveu apoiar o candidato Márcio França, do PSB, que ficou apenas em terceiro lugar.

O mesmo ocorreu com Decio Fernando, também ligado ao Republicanos e exonerado já durante a campanha. Ele era subprefeito de São Miguel Paulista (zona leste).

O time de subprefeitos de Covas também conta com indicados que fizeram carreira política fora do município, mas acabaram nomeados para chefiar essas estruturas regionais da cidade.

Três vezes vereador em Santos pelo PPS (Cidadania atualmente), Marcelo del Bosco, ex-candidato a prefeito no litoral, dirige a regional de Casa Verde/Cachoeirinha.

O subprefeito da Vila Guilherme/Vila Maria, Joel Bomfim, foi vereador em Guarulhos e hoje é secretário-geral do PSC (Partido Social Cristão) na cidade vizinha.

O PP esteve à frente da Subprefeitura do Jabaquara (zona sul) com o ex-deputado Arnaldo Faria de Sá, veterano do Congresso alocado na gestão tucana após ser derrotado na eleição de 2018.

Ele deixou a subprefeitura em março, para concorrer a vereador, e se elegeu com 34 mil votos.

A tucana Sandra Santana, ex-subprefeita da Freguesia/Brasilândia, também foi eleita agora para a Câmara Municipal. Outros quatro candidatos a vereador tinham sido subprefeitos recentemente –três pelo PSDB e um pelo MDB.

O cientista político Cláudio Couto, professor da FGV Eaesp (Fundação Getulio Vargas), afirma que o loteamento de regionais da prefeitura tem sido uma forma de os prefeitos construírem a sua base de sustentação na Câmara Municipal.

"O presidencialismo de coalizão em nível municipal na cidade de São Paulo passa muito pela barganha de cargos nas subprefeituras, mais até do que no secretariado", diz Couto.

"É na subprefeitura que o vereador se reelege, que ele vai poder dizer que resolveu um problema do bairro, que ele vai poder dizer que levou uma determinada obra para lá e aquilo que não estava funcionando agora está graças a ele."

O problema não é a existência dessa partilha de poder entre o Executivo e o Legislativo, aponta. Mas é frequente que vereadores capturem as subprefeituras e deem "a elas um direcionamento que impede o atendimento de demandas daqueles que não comem na sua mão, por meio de práticas clientelistas, de algum tipo de lealdade pessoal e, muitas vezes, com esquemas de corrupção".

Questionada pela reportagem sobre as nomeações nas subprefeituras, a prefeitura disse, pela assessoria, que o critério determinante é a "competência técnica e administrativa".

"Tanto é verdade que a gestão avançou significativamente no volume de trabalho realizado pelas subprefeituras. Em janeiro de 2017, havia mais de 210 mil solicitações de serviços recebidas por meio Central SP156 paradas, hoje são 13.900", diz em nota.

A prefeitura não comentou a divisão por partidos nesses órgãos nem se há contrapartida no Legislativo, mas listou uma série de ações tomadas nessa área da gestão.

Disse, por exemplo, que, no setor de zeladoria, houve redução nos prazos de atendimento das solicitações da população e que investiu em sistema de gerenciamento tecnológico das atividades para monitorar os serviços prestados.