“Parem as obras”, dizem ambientalistas mineiros

PUBLICADO EM 12/10/13 - 03h00

O projeto da transposição do São Francisco determina que 1,4% da água do rio vai ser retirada e levada aos canais dos eixos Norte (com 260 km de extensão) e Leste (217 km). À primeira vista, pode parecer um percentual irrisório diante da magnitude do Velho Chico, mas os números, na opinião dos especialistas ouvidos pela reportagem, enganam – e muito. O maior problema é a falta da revitalização dos rios que compõem toda a bacia e do assoreamento do próprio São Francisco.


Diante desse quadro, ambientalistas mineiros fazem coro ao bispo de Barra (BA), dom Luiz Flávio Cappio, que, em entrevista exclusiva a O TEMPO, defendeu a interrupção dos trabalhos. “Se interromper a obra, não resolve. Porém, se continuar a obra, também não resolve. Criaram um problema. Se parar, o prejuízo será menor. Então, é melhor parar e arcar com o prejuízo e aumentar o investimento em adutoras, por exemplo”, afirma o professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Apolo Heringer Lisboa, coordenador do projeto Manuelzão e uma das referências em recursos hídricos no Estado.


As adutoras, além de transportarem um volume menor de água e exigirem menos gastos em sua concepção, impedem que haja perdas com evaporação, como acontecerá com a transposição. Especialistas estimam que um percentual entre 15% e 20% da água será perdido pelo efeito físico nos canais do Velho Chico.

Lisboa fez, em julho deste ano, uma expedição pelo São Francisco e classifica a situação como “gravíssima” e de “magnitude civilizatória”. “A maioria dos municípios da bacia não trata nada que joga no rio. Metade trata o esgoto, e a outra metade não trata com qualidade. Não é só revitalizar o rio. Há de se olhar a bacia hidrográfica: todos os afluentes e afluentes dos afluentes. Todos são rios que estão secando pelo desmatamento e assoreamento. O São Francisco e seus afluentes estão gravemente doentes”, avalia.

Também coordenador do Manuelzão, o professor da UFMG Thomaz Matta Machado acredita que a transposição está longe de ser o melhor caminho para fazer a água chegar aos rincões nordestinos. “Eu acho bom essa transposição não sair. A gente falava que ia começar e que não ia terminar. A Agência Nacional das Águas (ANA) tem um atlas que indica que adutoras e sistemas interligados podem ser uma solução mais interessante. Porque o governo não adotou esse sistema?”, questiona.

PROPOSTA. Pelo projeto da transposição, a água é retirada do rio, levada até estações elevatórias, que a levam até os canais, de onde seguem por efeito de gravidade até represas. Os canais terminam em leitos de rios que secaram, que, por sua vez, abastecem açudes que também estão secos. O governo promete entregar os 53% da obra que ainda restam até dezembro de 2015, se novos atrasos não ocorrerem.