Judaísmo

Conheça a primeira rabina da congregação de São Paulo

Fernanda Tomchinsky-Galanternik assume função, até então, masculina

Ter, 25/04/17 - 03h00
Responsabilidade. A psicóloga Fernanda Tomchinsky-Galanternik durante sua posse em cerimônia que reuniu mais de 200 pessoas | Foto: Fernando Almeida Carvalho/ Congregação Israelita Paulista

Ela é jovem, tem 30 anos, nasceu e foi criada em São Paulo, é formada em psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, é casada há cinco anos e tem uma filha de 2 anos.

Fernanda Tomchinsky-Galanternik foi apresentada formalmente durante cerimônia na sinagoga Etz Chaim, como a primeira rabina da Congregação Israelita Paulista, a maior comunidade liberal judaica na América Latina, com 1.500 famílias associadas.

Ela é a quarta rabina brasileira, sendo que as outras três estão atualmente nos Estados Unidos. Para se tornar uma conselheira religiosa, ela estudou o equivalente a sete anos e meio em Israel e na Argentina.

Segundo ela, sua entrada no rabinato se soma às funções como coordenadora de ensino.

“Com isso, passo a ter maior presença e atuação nos serviços religiosos e no acompanhamento às famílias. Em algumas dessas tarefas, minha entrada vai acontecer de forma mais lenta, já que entendemos o igualitarismo na congregação como um processo e, portanto, não queremos impor às famílias algo que possa fazer com que se sintam incômodas em situações que já são delicadas. Em outras, minha entrada já está acontecendo, como na condução de serviços religiosos, prédicas e produção de conteúdo religioso para os canais de comunicação da instituição”, relata a rabina.

Dentre suas atribuições como coordenadora de ensino, Fernanda tem vários projetos para aumentar o pertencimento das crianças e dos jovens, com os quais mais trabalha.

“Busco uma educação de qualidade que seja interessante, dinâmica e permita que essas crianças e esses jovens possam se apropriar da tradição judaica de maneira lúdica e vivencial. Por isso, adaptamos as aulas para incluir cada vez mais vivências e desafios para acompanhar o ritmo deles”, comenta.

Pergunto a ela o que é preciso para ser uma boa rabina. “Não existe fórmula mágica, mas é necessário estudar as fontes com um olhar crítico e atualizado, ter boa escuta e percepção do outro, e é fundamental dialogar. É preciso estar apaixonado por ensinar e aprender e também assumir o papel de líder. Com isso, talvez, seja possível começar, mas nada é garantia. Tudo vai depender de onde estamos, com quem estamos e o que estamos fazendo. É preciso muito jogo de cintura”, sustenta.

Fernanda explica que no rabinato não existe um mandato com duração determinada ou pré-estabelecida. Na verdade, trata-se de um trabalho diário de criação e fortalecimento de identidade judaica. A rabina terá ainda um longo caminho a ser conquistado com diligência e diplomacia.

“Dentro da congregação existe pluralismo, que é parte fundamental, mas, também, opiniões diferentes, que estão presentes no convívio diário de 80 anos. O igualitarismo que vem crescendo”, avalia a rabina.

Segundo ela, há poucos anos, homens e mulheres ainda se sentavam separados durante as cerimônias que acontecem ao longo do ano. “A sinagoga passou desse modelo para um em que as pessoas se sentam todas juntas e por um período em que havia três possibilidades: só de homens, só de mulheres nos extremos, e no centro uma seção mista. Hoje, homens e mulheres sentam-se separados somente durante as grandes festas (Rosh haShaná e Iom Kipur)”.

A participação ativa da mulher dentro da sinagoga também cresceu muito nos últimos anos “indo de uma participação mais passiva, sem a possibilidade de liderar serviços ou de ler a Torá, para uma possibilidade de participação total. A mulher já tinha participações muitíssimo ativas em todas as outras áreas da congregação, como voluntária e como profissional. A grande mudança é de fato na área sinagogal. Essa transição vem acontecendo com cuidado e com respeito aos associados”, ressalta a rabina.

Congregação Israelita Paulista. Suas lideranças defendem que a mulher pode realizar mitsvót (preceitos da Torá) e participar em posição de igualdade nos serviços religiosos.

FOTO: Fernando Almeida Carvalho/ Congregação Israelita Paulista
A rabina está assumindo algumas funções gradativamente


Preceitos

Deus. Para os judeus existe somente um Deus, o Todo-Poderoso, que criou o universo e tudo o que há nele.

Cidade. Jerusalém, conhecida como Cidade Santa, é considerada a capital de Israel há 3.000 anos.

Nomes. Os símbolos judaicos mais conhecidos são: a menorá (candelabro de sete braços) e a estrela de Davi (seis pontas).


Como a ala ortodoxa vê a presença da mulher

A rabina Fernanda Tomchinsky-Galanternik pertence à Congregação Israelita Paulista, considerada mais liberal, mas nem por isso está imune à resistência dos mais ortodoxos.

“A verdade é que há muitas pessoas que não se consideram ortodoxas, mas que já se posicionaram contra o rabinato exercido por uma mulher ou que simplesmente não reconhecem meu trabalho. Mas isso não é algo recente. Durante toda minha formação tive encontros com as mais diferentes pessoas, e muitas delas eram contrárias à posição de liderança religiosa da mulher”, comenta Fernanda.

Algumas pessoas, ao mesmo tempo que discordavam de sua opção pelo rabinato, a respeitavam. Outras passaram a ter um comportamento agressivo. “Acredito na pluralidade e respeito as opiniões dos outros, porque se não o fizer, não posso querer que os outros respeitem a minha. Fico triste quando não sou respeitada, já que é um valor judaico extremo”, finaliza a rabina.

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