Sétima arte

‘Crowdfunding’ sobre voadores 

Especialistas e público fazem comentários sobre viagens astrais

Ter, 29/03/16 - 03h00

Eles são muitos, têm perfil eclético e estão espalhados em todo o mundo. Alguns são mais discretos, preferem se resguardar, outros revelam que quando dormem saem por aí, voando, se relacionando, colecionando experiências.

Os desinformados acreditam que a capacidade que o espírito tem de se desprender do corpo enquanto ele dorme e ter a liberdade de ir e vir é loucura.

No entanto, a experiência fora do corpo (EFC), também conhecida como viagem astral, projeção astral ou desdobramento da consciência, é relatada desde que o mundo é mundo.

O antropólogo Dean Sheils publicou em 1978, no jornal da Society for Psychical Research, sua pesquisa sobre a crença em experiências fora do corpo. Ele estudou 54 culturas, e a ideia das experiências fora do corpo estava presente em 46% delas.

Wagner Alegretti, engenheiro eletrônico e investigador da EFC, tem obtido resultados incríveis fazendo experimentos por meio de imagens por ressonância magnética funcional para detecção, medição e compreensão da bioenergia.

Experiência. O tema fisgou Nathália Vernizzi Boscaro, 29, nascida em Americana, no interior de São Paulo que, atualmente, mora em Barcelona, na Espanha. Ela trabalha como realizadora e técnica do departamento de fotografia (câmera e luz) em filmagens profissionais de cinema e publicidade e fotografia cinematográfica.

Ela revela que teve sua primeira experiência lúcida fora do corpo em março de 2004, quando tinha 17 anos. “Me deitei muito cansada. Meu corpo adormeceu, mas, de repente, senti como se escorregasse para fora do corpo. Primeiro, comecei a sentir os pés e as mãos desencaixando do corpo físico, logo as pernas e os braços, mas a cabeça continuou encaixada. Chegou um momento em que estava praticamente de cabeça para baixo, totalmente desesperada por não entender o que estava acontecendo, tentando voltar para o corpo e acordar, mas sem sucesso. Isso se repetiu durante um ano, a cada duas semanas, aproximadamente. Às vezes, eu saia rodando para o lado da cama, às vezes de ponta cabeça, às vezes rolando feito um ioiô”.

Não foi fácil passar por essa experiência principalmente porque ela não sabia com quem conversar sobre o assunto. Sentia-se como um peixe fora d’ água.

“Algumas pessoas me chamavam de louca, dizendo que eu precisava de um psiquiatra ou perguntavam o que eu tinha tomado antes de dormir. E eu tinha 17 anos! Na escola meus amigos não falavam dessas coisas. Além do mais, quando procurei na internet, encontrei sites interessantes, mas não me identifiquei com as experiências relatadas. As pessoas pediam técnicas para sair do corpo, tinham muita vontade de experimentar aquilo. Não entendia porque elas queriam viver algo que eu vivia nem queria nem achava legal”, diz a cineasta.

Financiamento coletivo. Daí veio o desejo de criar, em 2013, após uma dessas experiências fora do corpo, o site Voadores. “Voltei ao corpo com a ideia de fazer um documentário de longa-metragem para divulgar o assunto de uma forma diferente, partindo da minha experiência. Criei o site com a intenção de encontrar voadores para entrevistar e divulgar o projeto. Logo vieram as páginas nas redes sociais com o objetivo de criar uma comunidade de voadores e simpatizantes que estivessem interessados no assunto”, diz Nathália.

O próximo passa é viabilizar um longa-metragem por meio do “crowdfunding”, alternativa para viabilizar e financiar projetos de forma coletiva pela internet, por meio da colaboração de amigos, familiares e interessados no assunto.

A meta é lançar o filme em novembro. Todos os ouvidos passaram pela experiência fora do corpo e são chamados de “voadores”.

“São especialistas, cientistas, pessoas que dedicaram a vida a investigar o assunto a partir de suas experiências pessoais, mas alguns são pessoas comuns, que poderiam ser seus amigos, sua avó. O que os une é que eles são voadores. Não queremos dar explicações científicas complicadas nem criar espetáculo e mistério, mas mostrar que essas experiências são naturais, ocorrem independentemente de crenças, raça, sexo, idade, profissão”, diz Nathália.

Campanha está rodando o mundo

“Voador” é uma palavra originária do latim, volator, que significa “aquele que sai voando do corpo enquanto dorme e é consciente disso”.

O longa-metragem da cineasta Nathália Vernizzi Boscaro pretende colher depoimentos de “voadores” de várias partes do mundo e exibi-lo em festivais de cinema.

“Quero atingir um público que não esteja necessariamente interessado no assunto, não para convencer ninguém, mas para aproximar as pessoas de um mundo desconhecido, usando um estilo diferente. Finalmente, o filme ficará disponível pela internet para que possa alcançar o máximo número de espectadores”, comenta.

Para que tudo isso seja possível, Nathália criou e lançou nas redes sociais a campanha de crowdfunding que termina no dia 13 de abril. Até lá, a cineasta terá que arrecadar, no mínimo,€ 6.080.

“A equipe só vai receber o dinheiro se atingirmos 100% ou superarmos essa cifra, caso contrário o dinheiro será devolvido a cada pessoa que doou, e ficaremos sem nada. É uma filosofia de ‘tudo ou nada’, onde nos comprometemos a oferecer um produto de qualidade, mas, para isso, calculamos o valor mínimo para obtê-lo. Qualquer pessoa pode colaborar a partir de € 5, e é possível escolher diferentes recompensas em função do valor da colaboração”, convida e cineasta.

A ideia da cineasta é “filmar a partir de uma perspectiva humana e natural sobre o assunto, livre dos tabus, dos preconceitos e dos mitos que costumam acompanhá-lo”.

SERVIÇO: A página de crowdfunding com todas as informações sobre o projeto pode ser acessada em http://br.ulule.com/voladores (“voladores” com ‘L’ mesmo, que é como se escreve “voadores” em espanhol).


Depoimento

Aposentada de 83 anos é ‘voadora’


“Eu era ainda criança, muito pequena, quando comecei a sair do corpo. Quando ia deitar, minha irmã Wilma fazia uma prece. Logo que dormia, eu saía do corpo, era como se eu voasse. Primeiro ficava só dentro de casa, tinha medo de sair e não poder voltar. Depois comecei a sair de casa e não guardava para onde ia e nem o que eu ia fazer. Sabia que ia fazer alguma coisa.

Naquela época não se falava sobre isso. Na juventude, eu continuava saindo do corpo. No dia do meu casamento, isso voltou a acontecer. Fui à casa da minha sogra, onde eu iria morar, para resolver algumas coisas. Senti que fui perdendo as forças, me sentei em uma poltrona por alguns minutos e, não demorou muito, saí do corpo. Naquele dia, tive a sensação de que alguém estava me levando, mas não sei pra onde e nem para quê. Com o passar dos anos adquiri um controle maior, aprendi a dominar, mas foi preciso exercitar”.

Laila de Macedo Pereira, 83, aposentada

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