Cuidados

Dermatite atópica não tem cura, mas pode ser controlada

Doença crônica, que atinge crianças e adultos, tem crises mais graves com a chegada do frio

Por Da Redação
Publicado em 21 de abril de 2019 | 03:00
 
 
Coceira, vermelhidão, descamação e até feridas e bolhas: sintomas da dermatite atópica levam a desconforto e a uma vida de cuidados e combate ao preconceito Foto: Mats Hanson/Pixabay

A chegada do outono, com suas temperaturas amenas, gera alento em muitas pessoas que não toleram o calor. Mas é exatamente o oposto o que sentem aqueles que sofrem com a dermatite atópica, uma doença inflamatória não contagiosa que deixa a pele vermelha, com coceira intensa e descamação em partes como rosto, joelho e cotovelos, e cujos episódios de crise, em geral, se agravam nesta época do ano. Isso porque a enfermidade, incurável, está diretamente associada à pele ressecada, o que, obviamente, tende a ocorrer mais com a baixa temperatura.

Mas quem dera apenas a falta de hidratação por causa do frio piorasse o problema. Para quem sofre com dermatite, a lista de razões parece não ter fim: “É a alimentação, é o teste de novos produtos, ou produtos que uso há meses e, um belo dia queimam meu rosto, é a pomada de dermatite para acalmar que a piora, é a fronha do travesseiro, a água quente, o tingir o cabelo, o suor, o ar, o ficar abalada emocionalmente, estressada, e tantos outros motivos que nem sei dizer”, relatou a influencer Jana Rosa no perfil Bonita de Pele, sobre a doença com a qual convive.

O compartilhamento de algo desafiador para quem trabalha com a beleza ao menos serviu como bálsamo aos que também passam anos lutando contra a doença. “Quem sofre de dermatite e alergias não pode baixar a guarda, tem que estar alerta. Sempre me consulto com dermatologista, pelo menos uma vez por ano, ou em caso de crise forte. Ando com comprimido antialérgico, pois nunca sei quando posso sofrer uma crise”, relata a assessora e empresária Yumi Miyake. Ela descobriu a doença na infância, quando foi parar no hospital cheia de bolhas no braço, e sabe que, em seu caso, está associada a alergias e histórico familiar.

Preconceito. O médico dermatologista Lucas Miranda ensina que, de fato, esses são fatores comprovadamente ligados à dermatite atópica e que os primeiros sintomas normalmente já chegam na infância. “A prevalência da doença em crianças, com idades em torno de 6 e 7 anos, é de 7%”, diz. De acordo com a Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), até 25% das crianças podem apresentar episódios eda doença e até 7% dos adultos podem ser acometidos.

“Não se sabe exatamente quais são as causas, mas já foram levantados fatores na literatura médica. O que é bem sedimentado é que existe forte relação genética, sabe-se que há uma relação também com o tipo de pele, sendo que a ressecada é mais propensa. E também que crianças com histórico pessoal ou familiar de problemas como rinite, asma e bronquite estão mais propensas”, explica. 

Porém, mesmo quem não tem casos na família pode ter a doença e, aí, o problema da desinformação acentua a angústia. Foi o caso da estudante e cantora Juliana Tostes. “Na minha cidade (Barbacena), eu não encontrava ninguém que tinha a doença e, na minha família, ninguém tem. Era difícil não saber lidar com ela sozinha”, lembra. Por causa disso, ela criou um grupo no Facebook sobre o tema. A ideia, conta, era encontrar algumas poucas pessoas para conversar sobre o assunto: hoje, são 19 mil membros. 

Com poucas informações concretas sobre a dermatite, o espaço para o preconceito fica aberto, um problema tão sério quanto a própria doença. “Sofria mais quando criança e adolescente, pois foi a pior época e de lesões aparentes. Uma vez, um menino da escola perguntou, em tom de deboche, se eu mastigava meus dedos pois eles viviam com feridas. Fiquei muito chateada. Hoje, não vejo mais como preconceito, mas curiosidade: a pessoa que não conhece a doença me olha meio torto, achando que vai ‘pegar’”, conta Yumi. “É incômodo porque ficam perguntando e nem sempre têm empatia, ficam com nojo”, lamenta Juliana. Para a dermatologista Gisele Viana, da Sociedade Brasileira de Dermatologia – seção MG, a informação ajuda a minimizar o sofrimento. “Já tive que emitir atestados para escolas para pessoas com essas doenças de pele estigmatizantes. Vejo o sofrimento das famílias, mas creio que a conscientização pode ajudar a minimizá-lo”, diz. 

Por dentro da dermatite atópica

O que é? Uma doença genética, crônica e que causa pele seca, erupções que coçam e crostas.
O que causa? Não se sabe exatamente, mas há fatores de risco para o desenvolvimento, como alergia a pólen, a mofo, a ácaros ou a animais; contato com materiais ásperos; exposição a irritantes ambientais, fragrâncias ou corantes adicionados a loções ou sabonetes, detergentes e produtos de limpeza em geral.
É transmissível? Não é uma doença contagiosa. Podem-se tocar as lesões à vontade que não há nenhum risco.
Tratamentos. O principal é a hidratação da pele.
 
Hidratar a pele é a recomendação
 
Viver com dermatite atópica é lidar com a coceira e a autoestima baixa pela aparência pela doença. Mas a dermatologista Gisele Viana, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia, explica que cuidados diários podem minimizar os episódios de crise. “O principal é evitar banhos quentes e longos, não esfregar o sabonete, que precisa ser neutro (ela sugere usá-lo só nas partes íntimas) e fazer uso de emolientes para hidratar a pele. O sol também pode ser grande aliado para melhorar, apesar de termos pacientes que relatam uma piora com a sudorese”, explica. Além disso, ela recomenda evitar produtos com fragrâncias.
 
Após anos comprando produtos diversos, Yumi Miyake decidiu estudar a área. “A necessidade de informação por conta da dermatite atópica me levou à cosmetologia natural, e hoje criei uma marca artesanal, junto a uma amiga, a Amana Cosméticos”, conta. 
 
Para a jornalista Deborah Morais, não se estressar também é fundamental: “Tento manter o controle e a calma, além de sempre hidratar a pele”, revela. 
Nos episódios de crise, pode ser necessário usar corticoides e até antibióticos. Neste mês, um novo medicamento imunobiológico chegou ao país e promete ajudar nos casos graves da doença. “São medicamentos muito avançados. A pessoa toma uma injeção no mês ou na semana. Porém, são indicados para casos graves”, diz Gisele. 
 
A médica também faz uma ressalva em relação à automedicação ou indicação de leigos: “Há muitas doenças de pele com sintomas parecidos. O médico, preferencialmente o dermatologista, é quem pode identificar o que é”, conta. “No caso da automedicação, ainda tem o problema de que muitos medicamos geram efeito rebote”, alerta. 
 
Apesar de relatos, estresse não estaria ligado a problema
 
Quem tem dermatite atópica provavelmente vai manifestar os primeiros sintomas ainda bebê. Para alguns, a fase da infância e da adolescência será ainda mais grave, mas, com o passar do tempo, as crises podem diminuir consideravelmente – apesar de a cura da doença não existir.

“Em geral, no bebê, ela se manifesta no rosto, principalmente nas áreas externas, na moldura do rosto, vamos dizer assim. Em crianças um pouquinho maiores, a partir de 6 meses, 1 ano, a dermatite atópica se manifesta principalmente em áreas de dobras, pescoço, região anterior do cotovelo, região posterior do joelho, com bastante coceira, pequenas vesículas ou crostas”, relata o dermatologista Lucas Miranda. 

A assessorae empresária Yumi Miyake se lembra de ir a vários médicos ainda criança, e se recorda do que ouvia: “Eles diziam que na idade adulta ia melhorar, e realmente melhorou bastante. Não tenho lesão aparente sempre, hoje, só nas crises – mas a frequência ainda é alta, só que atualmente sei lidar melhor com ela. O estresse influencia 100% (para a doença nela): sofri uma perda familiar recentemente, e se desencadeou uma crise que atacou a parte interna do braço e do pescoço, e demorou semanas para sarar”, conta.
 
Emocional. A jornalista Deborah Morais também observa que a questão emocional interfere em muito na sua saúde. “Quando estou mais preocupada, nervosa, ela ataca mesmo, principalmente no rosto. Meus episódios de crise são ligados ao estresse, véspera de algum evento em que estou trabalhando, algo importante. Na adolescência, mesmo que fosse algo bom, como uma viagem, meu rosto empolava”, conta. A estudante e cantora Juliana Tostes faz coro às duas: “Lá pelos meus 10 anos, meu pai faleceu e foi desencadeando a alergia, aumentando e pegou o corpo inteiro. Hoje em dia, o estresse é bem ‘importante’ na minha dermatite: por conta de faculdade, algo que vai acontecer e eu fico preocupada, já começo a me coçar muito”, conta ela. 
 
Porém, apesar dos relatos similares, o dermatologista Lucas Miranda afirma que não há comprovação de que estresse e fatores emocionais estejam, de fato, relacionados à doença. “Os principais fatores são os que ressecam a pele, como no inverno, quando as pessoas tomam banhos demorados e quentes, com sabonetes inadequados, e usam buchas. Com relação ao estresse, não existe nenhuma comprovação, apesar de que, clinicamente, notamos alguns indícios de que isso aconteça”, diz. Ele ainda lembra que também não existem referências que liguem a doença a alimentos. “Não há nada que justifique a restrição de grupos alimentares em pessoas com dermatite atópica”, diz.