Prejuízos

Fobia social: ‘Vi que seria difícil, entrei em depressão profunda’

Vítimas de transtorno desabafam sobre o drama que as impede de ser felizes

Dom, 05/11/17 - 02h00
A baterista Amanda Dias* tem grande dificuldade de subir ao palco para desempenhar sua profissão: ‘Ansiedade, tremedeira, suadeira, nervosismo e noite sem dormir’ | Foto: Leo Fontes

Dias antes de ter que subir ao palco, Amanda Dias

, 26, começa a passar mal. “Ansiedade, tremedeira, suadeira, nervosismo, e não consigo dormir. É insônia e tudo mais”, conta. Os prejuízos causados por esse transtorno talvez pudessem ser mais bem contornados se ela não fosse musicista. “Sou patrocinada por uma grande marca. Geralmente tomo calmante fitoterápico, mas sempre dá algo errado”, diz.

Amanda não recebeu o diagnóstico sociofóbico, mas também admite que “foge de médico”. “Não me incomoda não ir aos locais; na verdade, me incomoda ir. Desde nova fujo de qualquer encontro social, e, devido a isso, nenhuma amizade se manteve. Não ia a festas, fugi da formatura. Hoje estudo à distância justamente para não conviver com pessoas. Eu saí do estágio porque não aguentava ter que ligar para gente que não conheço. Eu me veto de todas as formas para não conviver com pessoas”, afirma.

Para a estudante de engenharia química Camila Máximo, 20, o diagnóstico veio há dois anos. No entanto, assim como Amanda, ela recorda dos sintomas desde a infância, época que acredita que tenha deixado marcas em seu comportamento. “Sofria muito bullying. Nunca tive amigos, era tímida também, tinha medo de cometer erros ou de falar algo errado. Os colegas roubavam meus lanches e me ameaçavam por qualquer motivo fútil. Devo ter uns quatro amigos, e olhe lá. Não acho ruim, pelo menos são confiáveis”, avalia.

Camila tentou se libertar do transtorno por meio da terapia comportamental, mas logo abandonou o tratamento. “Eu não vi muitos resultados e desisti”, diz. Outra tentativa foi apostar nos desfiles. “Subi na passarela com muito medo da adrenalina do momento. Quando desci passei muito mal, quase desmaiei e tive que tomar calmantes. Estou tentando enfrentar. Gosto de desfilar como um hobby”, conta.

As crises e os altos e baixos também fazem parte da história do programador Lucas Carreiro Pinheiro, 27, natural de Resende, interior do Rio de Janeiro. Segundo ele, sua vida pode ser divididas em fases. “Até os 18 anos, sofri com a fobia em silêncio. Dos 18 aos 23 anos, lutei contra a minha fobia. Aos 24 anos venci a fobia, mas, dos 25 anos em diante, vi que vencer a fobia seria muito mais difícil do que eu imaginava, e entrei em depressão profunda”, afirma.

Hoje, Pinheiro considera-se livre da fobia social. “Eu consegui superar a fobia por um tempo e depois ela voltou com tudo. Fiz um tratamento psicoquiátrico. Ou seja, com psicóloga e psiquiatra. E o que mais funcionou comigo, no entanto, foi a Terapia Cognitiva-Comportamental (TCC)”, relata o programador.

(nome fictício)

Entenda o Transtorno de Ansiedade Socia (TAS) aqui.

Depoimento

Eu recebi o diagnóstico de fobia social em 2013, por uma psiquiatra, mas eu já apresentava os sintomas muito antes. Eu não tinha consciência do que era, e todos pensavam que eu era apenas tímido. Além disso foi receitado sertralina (medicamento utilizado no tratamento da depressão). Acredito que o bullying foi o maior desencadeador da fobia. Na escola eu sofri rejeição, e, a partir da sétima série, comecei a sofrer um bullying mais ofensivo. A medicação me ajudou a ter mais ânimo, mas a fobia nunca sumiu. Nas férias, eu fico mais tranquilo, pois posso ficar em casa sem ter contato com as pessoas. Quando voltam as aulas, eu tenho muitas crises. Com o tempo algumas situações que eram quase insuportáveis foram ficando mais leves, como é o caso de andar no ônibus. Hoje eu tenho grande dificuldade em falar, atravessar ruas movimentadas, sair para festas ou eventos. Falar tem sido meu maior desafio, pois é algo que é exigido de mim para minha futura profissão, além de me atrapalhar em relacionamentos e a encontrar emprego. Nas crises, eu tenho hiperventilação, isso gera muita dificuldade para falar; tremor nas mãos (às vezes parece até que estou com muito frio, porque os dentes ficam batendo); minha boca repuxa; minha memória falha; eu perco um pouco da noção da situação. A voz some, a boca fica seca, minha dicção fica muito ruim, começo a dizer tudo errado. Eu perdi um número muito grande de oportunidades: amizades, relacionamentos, escolar/acadêmico, empregos. Evitando tantas situações, isolado e sem interação social, eu não me desenvolvi como um jovem normal. Chega um ponto em que a própria manutenção da vida exige muito esforço. Isso cansa, gera stress, depressão, angústia. Coisas que parecem simples para a maioria das pessoas são muito difíceis para um fóbico social.

Lucas Silveira
21 anos
Estudante de psicologia

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