Senhoras modelos

Moda aposta nos mais maduros, questionando os padrões de beleza atuais; agência russa criada recentemente foca em casting grisalho

Dom, 25/02/18 - 03h00

Cabelos grisalhos, marcas de expressão e outros efeitos do avanço dos anos no corpo foram destaques nas recentes temporadas de moda internacional e também aqui, no Brasil. Modelos com idade média de 60 anos atravessaram a passarela mostrando criações de importantes marcas – e dá-lhe aplausos. Na última edição do São Paulo Fashion Week, por exemplo, a estilista Glória Coelho convocou mulheres de todas as idades. Caso da cantora Marina Lima, de 62 anos. O desfile firmou parceria com a Natura, que, na campanha #velhapra, da linha Chronos, trocou o termo “anti-idade” para “antissinais”, como uma espécie de apelo para que a indústria da beleza repense o conceito de envelhecimento.

Na semana passada, foi a vez da fast-fashion Renner apresentar seu desfile de inverno em São Paulo e replicar a aposta em um casting diversificado. Na verdade, em edições passadas, a rede já havia escalado a modelo Vera Valdez, 81, queridinha de Coco Chanel e primeira modelo brasileira a fazer sucesso lá fora. Agora, incluiu mais quatro modelos maduros em seu casting. “Foi um movimento bem natural para a gente. Resolvemos abrir a possibilidade de englobar todos os estilos na marca e trabalhar com mulheres reais, para que nossas consumidoras pudessem se espelhar nelas na hora de vestir. Algumas clientes ainda não se sentiam contempladas, e começamos a trabalhar mais o conceito de inclusão com diversidade do casting”, diz Luciane Franciscone, gerente geral de marketing da marca.

Para muitas agências, os 30 anos de um modelo podem significar o final da carreira. Ledo engano. A agência russa Oldushka, inaugurada neste mês, segue o caminho contrário, trabalhando apenas com modelos acima de 45 anos. Criada pelo fotógrafo Igor Gavar, a iniciativa começou apenas como um blog, em que ele retratava a beleza de pessoas na chamada “idade avançada”.

Hoje, a maior parte dos agenciados são mulheres em torno de 60 anos, mas a idade máxima dos modelos chega a 85. Basta visitar o perfil do Instagram da agência para ver que cabelos completamente grisalhos, ali, são onipresentes. Aliás, diversas marcas e revistas de lá já apostaram nos modelos idosos para editoriais – inclusive a Saint-Laurent Russia e a Gucci. “Eles são um exemplo de que é possível ser muito bonito e assumir a própria idade”, explicou Gavar à “Vogue” norte-americana.

Luciane Franciscone concorda. “Todo mundo fica feliz em ver que não existe só um único estereótipo na passarela. As pessoas estão tendo mais chances de ter uma trajetória mais longeva. Por que um modelo precisa interromper a carreira mais cedo?”, questiona.

Beleza não tem idade. Provando que beleza independe de idade, a modelo (e também veterinária) Valéria Chaves ingressou há pouco tempo no mercado. Aos 51 anos, é uma das responsáveis por difundir a beleza em produções de moda, e conta sobre a oportunidade que tem agora, na maturidade. “Nunca pensei que poderia ser modelo. A gente assimila a ideia de que modelos precisam ser jovens, altas e magras – e eu sou baixa! Hoje, existe uma tendência forte para esse perfil de modelos mais velhos, principalmente no exterior. As modelos mais velhas são, também, belíssimas, mesmo com suas rugas, suas marcas e suas histórias”, avalia ela, que é agenciada pela agência mineira Doze.

Valéria também enxerga nessa oportunidade de modelar uma forma de envelhecer com privilégio. “Me vejo bem melhor agora, aos 51 anos, e não os trocaria pelos 41, 31... e muito menos pelos 21. Me sinto de fato mais bonita agora, com minhas rugas, meu corpo e meu cabelo grisalho. Uso cremes para a pele, mas não gosto de fazer procedimentos estéticos para correções. E nunca ninguém me elogiou tanto quanto agora”, conta.

Como marcas têm apostado em modelos mais maduras como estrelas de desfiles e campanhas, o setor parece estar, de fato, mais aquecido. “O mercado da moda ainda está começando a abraçar mais esse perfil de modelo. Até as campanhas de moda têm procurado isso, um exemplo são as protagonizadas por modelos negras e albinas. Tem espaço para todos”, avalia Alessandra Marx, booker da Clarks Model.

O caminho para ingressar no mercado é o mesmo percorrido pelas modelos mais novas. “É preciso procurar uma boa agência, não necessariamente voltada à terceira idade. É necessário também fazer um pequeno material. Já a agência deve dar um direcionamento de carreira à pessoa. Um curso de fotografia e um pouco de passarela são outras formas que ajudam no preparo para o mercado”, ensina Alessandra.

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