Tecnologia

Robôs ‘do lar’ viram aliados na rotina doméstica

A era da Rosie dos Jetsons já chegou para quem aposta na robótica como aliada da vida doméstica

Por Da Redação
Publicado em 31 de julho de 2016 | 03:00
 
 
A engenheira Aline Maia usa e abusa de seu robô aspirador de pó “antiguinho”, mas reforça que ele não substitui uma boa faxineira Foto: DENILTON DIAS

Quem foi criança nas décadas de 60 a 80 conheceu o robô Rosie, empregada na residência dos Jetsons, que viviam em um futuro muito distante. Quem diria que chegaríamos àquele tempo – e mais: que conviveríamos com “Rosies” da vida real. Os robôs domésticos já são uma realidade, e alguns deles conseguem, inclusive, realizar tarefas como servir café e correr.

Esse sonho de consumo, porém, é acessível para poucos. O robô Asimo, um dos mais avançados do mundo hoje e fabricado pela Honda, pode ser comprado pela nada módica quantia de US$ 2,5 milhões. Ele é capaz de tarefas como servir suco ou água, dobrar roupas e subir escadas, entre muitas outras.

Enquanto as economias guardadas no cofrinho não alcançam o preço da modernidade, outros modelos, muito mais simples e bem mais baratos, também já são encontrados mundo afora. O aposentado Tarcísio Alves Oliveira, 63, apostou em um robô aspirador de pó depois que a pessoa que fazia faxina em sua casa parou de trabalhar por motivos de saúde. “Somos só eu e minha esposa, e nós mesmos damos um jeito na casa agora. Pesquisamos muitos modelos e marcas antes de comprar. Eu estou achando muito bom, tanto a limpeza como para mexer nele. É muito fácil”, relata.

O robô de Tarcísio tem detector de poeira, não faz barulho, vai sozinho para o carregador quando está com a bateria fraca, tem sensor para não bater nos móveis e barreiras que limitam sua área de trabalho. “O chão fica tão limpo que até brilha”, conta ele, contente com a aquisição.

A engenheira Aline Maia, 30, optou por fazer a experiência com um modelo mais simples. Ela e o marido compraram, há cinco anos, um robô aspirador pela internet. Na época, ele custou cerca de R$ 20. “O robô não limpa tão bem, mas dá uma economizada no seu tempo. Ele aspira a poeira, mas alguns fios de cabelo e outros fiapos acabam ficando para trás. Não substitui uma faxina de verdade”, revela Aline.

Os robôs também entram na água. “Recentemente, pude testar um modelo capaz de aspirar uma piscina. Confesso que esse robô me impressionou, pois ele se assemelha a uma raia e leva junto a mangueira de aspiração, evitando que ela se enrosque ao longo de seu percurso. Ele é capaz de percorrer toda a superfície da piscina, fundo e laterais e avisa quando finaliza a aspiração”, conta o professor Hugo Michel, membro do Grupo de Validação de Sistemas (GVAS), da Escola de Engenharia da UFMG. Esses limpadores de piscinas podem ser encontrados no país por preços que variam de R$ 500 a R$ 9.000.

No Brasil, a inserção dos robôs no cotidiano ainda é tímida. Já em outros países, é muito comum o uso de robôs de serviço, como os que aspiram o pó; os de assistência, que auxiliam no cuidado de idosos e pessoas com mobilidade reduzida; e os de reabilitação, que ajudam na fisioterapia.

“Existe um robô que se chama Riba. Ele é usado para fazer a transferência de pessoas da cadeira de rodas para a cama. Outro se chama Jaco e é um braço mecânico, usado para auxiliar pessoas com mobilidade muito reduzida a fazer tarefas do dia a dia, como pegar um copo. No Japão isso já é uma realidade”, comenta o professor de robótica Bruno Vilhena Adorno, coordenador do Grupo de Pesquisa em Mecatrônica, Controle e Robótica (Macro), da UFMG. Mas, para ele, brasileiros ainda demorarão mais de uma década para alcançar esse nível, existente no Japão hoje, de utilização de robôs em larga escala.

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Máquinas substituem jornalistas escrevendo matérias em redações

O jornalismo não ficou fora da onda da robotização. Uma matéria apurada pela agência espanhola EFE menciona que os robôs seriam os “jornalistas do futuro, sem cabeça para pensar ou mãos para escrever”. A técnica, já utilizada pelo jornal francês “Le Monde”, pode produzir notícias que não necessitem de análise e que se nutram principalmente de dados, como resultados de eleições ou de eventos esportivos.

A agência americana Associated Press é outro exemplo de empresa jornalística que aproveita as máquinas para a redação de matérias esportivas e financeiras. Nos meios digitais, o blog da “Forbes” também divulga ações negociadas nas bolsas de valores por meio de um software de inteligência artificial.

“O uso em esportes e economia é bem comum, especialmente em agências de notícias. Nesse caso, os robôs servem como fonte para jornalistas de verdade, automatizando o trabalho de obtenção da informação”, conta o designer de informação Gabriel Giandorli. Ele aposta que os robôs irão continuar trabalhando em áreas que demandam uma cobertura rápida, mas que eles não devem substituir os repórteres de carne e osso – e sim dar suporte a eles. (RS)

No Japão, robótica tem soluções para o dia a dia; no Brasil, uso de máquinas em larga escala se restringe à indústria

FOTO: IAR / divulgação
Rogério Vitalli “cumprimenta” protótipo industrial da marca Kuka; para ele, robôs são aliados em fábricas e vão demandar especialização de operadores

Vários foram os fatores que levaram o Japão a ter uma inserção tão grande de robôs no dia a dia. O primeiro deles foi um poder aquisitivo real para comprar essas máquinas. Depois, há o fato de a robótica ser bem presente nos currículos das faculdades japonesas – e, além disso, conta muito a questão cultural.

“Lá, a pirâmide etária não é como a nossa. Ela é bem mais larga na faixa dos 40-50 anos, e o número de pessoas com 60-70 também é alto. Os japoneses não têm a noção de que os mais novos cuidarão do idosos, eles prezam muito a independência. Então, encontraram na robótica a solução para esse problema”, explica o professor de robótica Bruno Vilhena Adorno, da UFMG.

Adorno atenta também para o fato de os brasileiros já estarem usando robôs, mas muitas vezes sem saber: “Quando falamos em robô, a noção geral é do humanoide que tem braços, parece uma pessoa. Mas o daVinci, por exemplo, é um robô cirurgião que faz operações menos invasivas. Ele, inclusive, é usado no SUS”, comenta o professor.

Experientes. O uso de robôs no cotidiano não é novidade na Terra do Sol Nascente. “Há cerca de cinco anos, fui ao Japão para uma convenção e lanchei em uma hamburgueria onde um robô era quem preparava os sanduíches. Ele pegava a carne do freezer, colocava na chapa, virava e colocava no pão”, conta Rogério Vitalli, diretor executivo do Instituto Avançado de Robótica.

Para ele, o Brasil vai ter mais robôs industriais antes de eles passarem a fazer parte direta da vida das pessoas. Nesse campo, aliás, os robôs já estão com uma boa inserção. “Disparadamente, eles estão muito presentes nas montadoras e indústrias automobilísticas. Depois, na aeronáutica. Fazer carros envolve coisas muito perigosas, como soldas. Se você pensar que tudo isso era feito por humanos e com um alto índice de acidentes, essa mudança é extremamente interessante”, comenta Vitalli. E ele garante que, ao contrário do que diz o senso comum, os robôs não “roubarão” os empregos dos seres humanos. “Eles criarão empregos porque vamos precisar de pessoas para operar esses robôs, para dar manutenções”, prevê ele, sobre a necessidade de qualificação dos trabalhadores. (RS)

Minientrevista

Bruno Vilhena Adorno
Professor de robótica da Universidade Federal de Minas Gerais

De que forma os robôs estão se inserindo na vida cotidiana?

A robótica de serviço, que abrange aparelhos como esses robôs aspiradores de pó, pode ser utilizada no cotidiano. Mas outro tipo são os robôs de assistência, que são utilizados para acompanhar idosos ou pessoas com problemas de mobilidade. E há ainda os robôs de reabilitação, que ajudam no tratamento de pessoas que tiveram alguma lesão.

Esses modelos são acessíveis para a população?

Os de serviço, nos EUA, custam de US$ 300 a US$ 500 aproximadamente. Aqui, eles saem por cerca de R$ 2.000. Os de assistência e reabilitação, normalmente, são adquiridos por hospitais ou universidades. Hoje em dia, esses robôs não são produzidos em grande escala – então não saem por menos de R$ 100 mil. Na UFMG, temos o Jaco, que é um braço robótico. Ele custa em torno de R$ 35 mil.

Por que o Brasil ainda não entrou com tudo na era da robótica?

O que eu percebo é que a relação da sociedade com a robótica é muito diferente da que existe no Japão, por exemplo. Por uma questão cultural, os japoneses não têm muito a noção de que os mais velhos serão amparados pelos mais jovens, eles querem independência. Então, eles encontraram na robótica a solução desse problema. Aqui, há uma questão da falta de informação (de utilidade dos robôs), com um poder aquisitivo baixo da população para comprar esses produtos. Nós estamos uns 20 anos atrasados com relação a eles.

Personalidades como Stephen Hawking vêm criticando a forma como estamos lidando com a robótica e a inteligência artificial. Qual a sua opinião sobre isso?

Existe uma área específica que se chama “roboética” para lidar com isso. Em casos em que os robôs assistem pessoas, os dilemas éticos serão gerados, mas acredito que os problemas serão discutidos à medida que surgirem. Já aquela questão da revolução das máquinas é mais complexa. Não consigo ver robôs que consigam, em um futuro próximo, criar esse cenário de “Exterminador do Futuro”. (RS)