‘Era das telas’ dobra problemas de visão

Pesquisa feita pelo Conselho Brasileiro de Oftalmologia mostra ainda que quatro em dez crianças com distúrbio visual apresentam miopia

Dom, 11/02/18 - 02h00

As seguidas horas diante de uma tela – seja do celular, do tablet, do computador ou da televisão – já apresentam reflexo na saúde dos olhos de crianças e adolescentes brasileiros. Uma pesquisa do Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO) mostra que o número de crianças que usam óculos de grau dobrou nos últimos dez anos, passando de 10% para 20%. Dessas, quatro em cada dez apresentam problemas de miopia, ou seja, há dificuldade para se enxergar com nitidez tudo o que não esteja próximo. O estudo foi realizado com 583 jovens.

O oftalmologista Luiz Carlos Molinari, diretor da Sociedade Mineira de Oftalmologia, explica que, diante de uma tela, a criança pisca menos e se esforça para manter o foco. “Isso causa fadiga, que traz mudanças no olho e que podem levar à miopia e a outros vícios de refração”, diz.

Segundo Molinari, os principais sintomas de algo errado na visão costumam ser dificuldade para identificar objetos a distância, esforço para manter o foco, hipersensibilidade à luz, lacrimejamento em excesso e vermelhidão nos olhos. Para evitar esses problemas, o ideal, segundo especialistas, é que o acesso a esses dispositivos não ultrapasse duas horas por dia.

Dentro de casa. Em apenas um ano, Bruno Henrique Valiceli Pin, 9, teve o grau de miopia aumentado por causa do uso excessivo de celular. “O grau passou de 2 para 3. O médico disse que a visão dele é equivalente à de um idoso, algo muito preocupante para uma criança dessa idade”, afirma a professora Christiane Valiceli, 39, mãe de Bruno Henrique.

O menino afirma que se adaptou rápido. “Os óculos me ajudam a ler, a estudar e a brincar com os meus amigos”, conta. No celular, ele diz que gosta de ver vídeos e filmes e acessar jogos. Depois do diagnóstico, as regras se tornaram rigorosas. “Hoje, meus filhos não ficam mais do que duas horas por dia, só até as 18h. O médico proibiu depois desse horário porque o considera perigoso”, declara Christiane, que também é mãe de Anna Gabrielle Valiceli Pin, 16. A jovem tem miopia e astigmatismo. “O grau aumentou um pouco porque ela não largava o celular”, revela a mãe.

Para a adolescente, é difícil ficar sem o aparelho o tempo todo. “Uso o celular para conversar com os meus amigos, ver vídeos e ouvir músicas. Queria poder usar por mais tempo, mas sei que faz mal”, diz.

Na família da professora Lidiane Castilho, o filho caçula, Davi Castilho, 4, foi diagnosticado aos 2 anos com astigmatismo. “Ele não conseguia se concentrar nas atividades, ficava inquieto, irritadiço. Por isso eu e meu marido o levamos ao oftalmologista”, conta.

Davi se adaptou bem ao uso dos óculos. “Eu gosto de usar porque posso brincar e fazer o que eu gosto”, diz o menino, que utiliza o tablet e o celular para jogos e desenhos. “Tenho mais dois filhos além dele. O Marcelo, de 12 anos, e a Sofia, de 6, não têm problemas de visão, mas limito o acesso. Cada um tem seu celular e só pode gastar uma bateria por dia”, afirma.

Mundo. Uma epidemia mundial de miopia pode estar muito próxima. Segundo o instituto americano IAPB Vision Atlas, até 2050, cerca de 50% da população do planeta – incluindo crianças que vivem em cidades grandes e nas regiões metropolitanas – devem ter miopia.

Um estudo feito em 2010 pelo instituto indicava que pouco mais de 28% dos habitantes do planeta tinham o distúrbio visual. Os pesquisadores alertam que a criança deste século vive em local fechado, quase sem acesso ao ar livre, é transportada para a maioria das atividades e gasta cada vez mais tempo na frente de tablets, TVs ou smartphones.

 

Miopia é o tipo que mais exige correção

Entre 20% e 25% de todas as crianças em idade escolar terão algum problema oftalmológico, desde simples erros refracionais até doenças oculares mais sérias. “Destas, cerca de 10% a 15% necessitarão de óculos. Estamos identificando cada vez mais quadros já existentes que não eram diagnosticados. No caso da miopia, ela é o tipo de grau que mais requer correção com óculos ou lentes de contato”, explica a oftalmologista pediátrica Débora Pinheiro, médica do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Débora ressalta que, principalmente nas crianças menores, mesmo sem prejuízo das funções e do comportamento, existem graus que devem ser corrigidos com o objetivo de promover o desenvolvimento visual adequado referente a cada idade.

Mais danos. A oftalmologista alerta que, além da miopia, outros problemas oftalmológicos têm surgido entre adultos e crianças ligados à tecnologia. “São casos de síndrome do olho seco e cefaleia secundária”, exemplifica.

A médica ainda destaca que o tipo de luz emitido pela tela tem natureza potencialmente nociva para as estruturas oculares, principalmente para a retina, podendo alterar também a qualidade do sono dos usuários, conforme pesquisa em andamento.

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