Sem barreira

A vida sem muro dos alemães  

Personagens lembram, 25 anos depois, como foi o dia 9 de novembro de 1989 para eles

Por Raquel Sodré
Publicado em 12 de novembro de 2014 | 04:00
 
 
Transformações. Nadja afirma que queda do mudo deu início a uma série de mudanças na sua família Arquivo pessoal

A queda do Muro de Berlim, que completou 25 anos neste mês, foi um evento internacional de proporções incalculáveis. Até hoje, a Alemanha tenta encontrar seu equilíbrio social e econômico, e o mundo se beneficiou da tranquilidade de não haver mais a iminência de uma guerra nuclear.

As maiores mudanças, talvez, foram no âmbito pessoal. Para muitas pessoas, principalmente as que moravam do lado oriental, a queda do muro significou o início de uma nova vida.

A produtora de documentários Nadja Smith, 35, tinha 10 anos quando o muro caiu. “Eu fui para a cama, como de costume. Meus pais não me contaram nada, nem na manhã seguinte. Fui para a escola e fiquei muito surpresa, porque ela estava quase vazia. Alguns dos meus colegas vinham me cumprimentar dizendo: ‘Você sabia que o muro está aberto e agora todos podem ir para o oeste?’ – é claro que eu não sabia. Me senti um pouco traída pelos meus pais e senti que eles não me levavam a sério”, conta ela.

Mal sabia Nadja que os segredos da família eram ainda maiores. Após a queda do muro, o pai dela reuniu as três crianças para contar que havia perdido o emprego. “Ele me contou que trabalhava como agente secreto da polícia e que ninguém deveria saber disso – era segredo”, lembra ela.

O pai e a mãe dela – que também perdeu o emprego – tentaram conquistar outros postos de trabalho até se acertarem em alguma atividade no “livre mercado”. “Mas, entre tantas mudanças, o relacionamento deles não resistiu, e eles se separaram sete anos depois”, conta. Ela própria veio a romper relações com o pai, que se tornou uma pessoa difícil com as mudanças. Tentando lidar com todas as reviravoltas em sua vida e em sua cidade, Nadja se mudou várias vezes, até retornar para Berlim em 2011. “Agora acho que vou ficar”, diz.

Dormiu. Para o cientista da computação Arne Leissner, 56, a queda do muro também foi um choque. À reportagem de O TEMPO, ele contou que começou a ver os primeiros movimentos pela televisão, mas foi dormir, porque não acreditava que as coisas fossem evoluir tão rapidamente. Parecido com o enredo do filme “Adeus, Lênin”, ele dormiu em um país socialista e acordou em um mundo capitalista.

“Na manhã seguinte, eu ouvi no rádio entrevistas de pessoas que estavam indo para o trabalho. Fiquei pensando sobre aquilo, porque não há nada de espetacular em pessoas irem para seus trabalhos. Então me dei conta de que elas estavam indo direto de sua primeira visita ao lado ocidental para seus trabalhos. Nesse momento, soube que estava acontecendo uma mudança enorme em nossas vidas, e eu não sabia em qual direção. Para mim, foi um misto de alegria e choque”, recorda-se.

Logo depois da queda, Leissner se mudou com a família para o lado ocidental e logo encontrou um bom emprego. Mas ele enxerga grandes mudanças advindas da queda do muro.

“Acho que os jovens se beneficiaram mais. Minha filha é um exemplo: ela frequentou uma universidade estrangeira, conheceu outros países, culturas e línguas. Ela tem todas as possibilidades de formar sua vida a partir das suas próprias escolhas e responsabilidades”, analisa o cientista.

Comemoração

Berlim. A cidade celebrou o 25º aniversário da queda do muro com eventos no último fim de semana. Entre as atividades, houve música, exibição de filmes e uma instalação com balões de luz.