Referendo

Diferenças que conduzem a Escócia rumo à independência

Partido Nacional Escocês, que defende o “sim”, quer se livrar de armas nucleares e ajustar salários

Qua, 17/09/14 - 03h00
Nas ruas. Mundell faz campanha pelo voto contra a independência no referendo de amanhã | Foto: KIERAN DODDS

David Mundell, único membro do Partido Conservador entre os 59 parlamentares britânicos eleitos da Escócia, gostaria de ter um colega ou dois para ajudá-lo nas participações dos programas matutinos de TV e de rádio. Ao mesmo tempo em que diminuiria a sua carga de trabalho, isso também responderia à gozação de que, como membro conservador do Parlamento britânico, Mundell é mais raro na Escócia do que um urso panda gigante (existem dois no zoológico de Edimburgo).Moffat, Escócia.

“Não me sinto isolado, e não me sinto marginalizado, não me sinto não amado”, disse Mundell, que, no entanto, admite uma leve irritação com tantas pessoas “contando a piada do urso panda achando que eu nunca a ouvi antes”.

A piada pegou porque ela se refere a um fato central do debate sobre a votação da independência da Escócia do Reino Unido: existe um grande abismo ideológico entre a Escócia, cujo centro de gravidade política é distintamente de esquerda, e a Inglaterra, que é a base geográfica dos conservadores.

Política. Se os escoceses votarem pela independência, isso será, pelo menos parcialmente, uma rejeição ao Partido Conservador, que na administração de Margaret Thatcher reformou a política britânica, e que agora tem uma coligação governista com os Liberais Democratas de centro. Isso também será um reflexo do desejo de políticas diplomáticas e socioeconômicas bem à esquerda de tudo o que o governo britânico oferece.

Mesmo antes da votação pela independência, a Escócia está buscando um rumo bem diferente do governo central em Londres, graças aos acordos anteriores que davam a ela bastante liberdade para criar suas próprias políticas públicas. Os escoceses gozam de vários benefícios que são mais generosos do que os disponíveis na Inglaterra, alguns deles gratuitamente, em áreas abrangendo cuidados médicos domiciliares para os idosos, mensalidades gratuitas na universidade, prescrições médicas e viagens de ônibus para os aposentados.

Mudanças. O Partido Nacional Escocês, que controla o governo escocês e defende a independência, quer se livrar das armas nucleares, ajustar o salário mínimo de acordo com a inflação e iniciar uma expansão abrangente das creches. E o partido é mais favorável à imigração do que são a União Europeia e o governo britânico.

“Há muito da perspectiva comunitária na Escócia que vê o valor de se unir e oferecer serviços públicos, de reconhecer a força da comunidade no país”, declarou Nicola Sturgeon, vice-primeira-ministra da Escócia. Ela argumenta que isso “se reflete em algumas das escolhas divergentes nas políticas públicas”, acrescentando que a Escócia podia aprender ainda mais com as sociais-democracias nórdicas.

Uma das reclamações dos escoceses é de que a partilha do dinheiro dos impostos é feita de forma injusta. Portanto, em caso de vitória do “não” é possível que seja realizado um ajuste na regra que determina o montante de recursos públicos destinados aos escoceses.

Além disso, o movimento independentista questiona decisões de Londres sobre políticas públicas, como o programa de habitação popular e impostos do setor aéreo e sobre a renda.

Defensores do “não” acreditam em adiamento

Moffat, Escócia.
Mesmo alguns adversários políticos que são contra a independência escocesa acreditam que a discórdia está a caminho, inclusive Henry McLeish, ex-primeiro-ministro, ou chefe do governo escocês. Como membro do Partido do Trabalho, o qual se opõe à independência, McLeish afirma que votará contra a secessão amanhã, mas que um voto de “não” pode tão somente adiar a separação.

Alguns insinuam que as diferenças políticas entre os dois países sejam um exagero. Um estudo feito por dois acadêmicos, John Curtice e Rachel Ormston, concluiu que, embora a Escócia fosse mais parecida com uma social-democracia do que a Inglaterra, “as diferenças são, na melhor das hipóteses, pequenas”.

Outros sustentam que a separação não é entre a Escócia e a Inglaterra e sim entre o sul da Inglaterra, e o resto da Grã-Bretanha. Politicamente, a Escócia tem mais em comum com o norte da Inglaterra do que Londres, afirmam.

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