Mudança

Jovens cobram transformação e não idolatram ‘comandante’ 

Admirado por quem viveu a revolução, Fidel não tem mesma popularidade entre os mais novos

Por Cynthia Castro e Evie Gonçalves
Publicado em 25 de janeiro de 2015 | 04:00
 
 
Educação gratuita e de qualidade é um dos orgulhos do país DANIEL DE CERQUEIRA

Havana, Cuba. Se os cubanos que vivenciaram o período revolucionário ainda admiram a figura de Fidel Castro e o que o regime socialista representa hoje, o mesmo não pode ser dito em relação a muitos jovens. O anseio por mudanças é explícito entre eles.

Apesar de reconhecerem o esforço do governo para oferecer educação, saúde e segurança de qualidade para o povo, a juventude almeja usufruir de pequenos luxos característicos do sistema capitalista e sonha em conhecer uma vida diferente.

“Quero ter um apartamento, um carro e não ganho para isso. Aqui, até para comprar uma cerveja é difícil. Eu nunca andei de avião. Os turistas conhecem meu país melhor do que eu”, lamenta o produtor de eventos Noel Rozo. Ele é graduado em educação física, mas, sem mercado de trabalho, atua em casas noturnas em Havana.

Segundo o cubano de 29 anos, a educação é tida como um dever no país, e não como um direito. Entretanto, os jovens concluem a graduação e nem sempre conseguem bons empregos.
A mesma realidade é vivenciada por José Blanco, morador de Trinidad. O jovem de 27 anos trabalha como professor de salsa, aproveitando-se da curiosidade dos turistas em aprender o ritmo latino. Reticente em falar o que pensa sobre o socialismo, ele diz que o sistema não é bom para todos.

O estudante gosta da cidade onde nasceu, mas não está satisfeito com a vida que leva em Cuba. O sonho dele é deixar o país. “Para onde você gostaria de ir?”, questionou a reportagem. “Para qualquer lugar. Só queria sair e conhecer algo diferente”, respondeu.

A vontade de viajar e presenciar a vida em outro país está expressa na letra da música “Pasaporte”, da banda Havana de Primeira, uma das preferidas dos cubanos: “Un pasaporte, sin fecha (sem data) de vencimiento, libre como el viento, a caminar por otros corazones, por otras vidas”.
A música foi indicada por Lídia Gomes, moradora de Havana, após relatar que um familiar se casou com uma turista e já não vive mais em terras cubanas. Ao oficializar a união com um estrangeiro, diz a jovem, o cubano consegue deixar o país com maior facilidade. “Precisamos de uma autorização consular. Antes a situação era pior. O governo amenizou as regras recentemente, mas, com o que ganho, nunca vou conseguir uma passagem”, diz Lídia.

Noel Rozo é mais radical. Para ele, o governo se apoia na ideia de que o embargo econômico gera quase todos os problemas da ilha, justamente para que os cubanos não possam viajar e comparar a realidade deles com a de outros países. Outro insatisfeito, o estudante Roberto Leal resume o sentimento da juventude: “queremos ter o direito de sonhar diferente”.

Respeito. Entre os mais velhos a imagem de Fidel Castro ainda é reverenciada como a do grande líder revolucionário. Uma parcela significativa de cubanos se diz grata a ele pela história de luta junto a outros líderes históricos, como Che Guevara e Camilo Cienfuegos.

“Eu o amo para sempre”, declara uma moradora de Trinidad, ao comentar o atual momento. Mercy Días lembra que os moradores saíram às ruas para comemorar, tanto a retomada da relação de Cuba com os Estados Unidos, como a libertação pelo governo norte-americano de três cubanos presos. Ela considera que a história de Cuba sempre será motivo de orgulho. “Apoiamos a nossa querida revolução cubana e o seu máximo líder, Fidel Castro, quem sempre foi e sempre será nosso melhor exemplo a seguir”.

Pelas ruas das cidades, nas estradas e nos estabelecimentos, ainda estão outdoors e frases com os ideais socialistas. Num desses dizeres, uma fala histórica de Fidel ajuda a entender a longevidade dessa comunhão entre povo e governo: “...compañeros, obreros y campesinos: esta es la revolución socialista y democrática de los humildes, con los humildes y para los humildes”.