Decisão

STJ suspende cobrança de precatórios que empreiteira faz a Betim

Presidente do Superior Tribunal de Justiça atendeu ao pedido realizado pelo município em cobrança feita pela Andrade Gutierrez

Publicado em 30 de outubro de 2020 | 19:52

 
 
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O Superior Tribunal de Justiça (STJ) suspendeu, na tarde de ontem, o bloqueio que tinha sido determinado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) e que previa a retenção de receitas da Prefeitura de Betim, na região metropolitana, para pagar parte dos precatórios cobrados pela empreiteira Andrade Gutierrez – o total da cobrança chega a R$ 480 milhões. 

Essa dívida é considerada fraudulenta pela Procuradoria Geral do Município e é questionada pela Polícia Civil, pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e por uma auditoria independente, que atestou falsificação na assinatura de agentes públicos e já tinha um parecer contrário do Ministério Público de Minas Gerais.

A decisão de suspender o bloqueio foi do presidente do STJ, ministro Humberto Martins, que deferiu o pedido do município. No último dia 6, o TJMG cassou uma liminar que suspendia o pagamento dos precatórios cobrado pela AG. Após essa decisão, estava previsto, para a próxima semana, o bloqueio de recursos das contas municipais, o qual poderia chegar a R$ 131 milhões. O ministro do STJ encaminhou a decisão de ontem para o TJMG. A íntegra dela deverá ser publicada na próxima terça-feira.

“O STJ atendeu a um recurso da prefeitura para suspender o bloqueio de receitas que estava previsto para os próximos dias. O presidente do STJ tem prerrogativa para anular liminarmente uma sentença do TJ, e foi o que aconteceu”, explicou o procurador geral de Betim, Bruno Cypriano.

Com essa decisão, o município também ganha tempo para dar prosseguimento às outras ações que tramitam na Justiça e que contestam a cobrança. Uma delas é a ação rescisória proposta pela Associação dos Servidores Efetivos Arquitetos e Engenheiros de Betim (Amae) e que, nesta semana, foi assumida pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). A prefeitura também faz parte do processo. 

“Essa decisão também nos dá mais tempo para o andamento das ações que correm na Justiça contestando a cobrança, como a ação rescisória que tramita no Tribunal de Justiça que foi assumida nesta semana pelo Ministério Público, que pede a anulação da cobrança”, acrescentou. 

Para o procurador de Betim, a decisão do STJ atende “à ordem pública”, já que a retenção de receitas para pagar a AG “inviabilizaria por completo o atendimento à população”. “O bloqueio de recursos prejudicaria a prestação dos serviços públicos municipais, ainda mais em plena pandemia. Realizar os pagamentos neste momento, como estava previsto, seria colocar a população em risco por causa da falta de atendimento. Estamos no início do período chuvoso, e isso é outro agravante, porque o município tem que fazer as ações de prevenção e atendimento à população. E, se o bloqueio fosse feito, tudo isso ficaria prejudicado”, completou. 

A AG cobra de Betim por obras realizadas há quase 40 anos. Porém, em 2017, a prefeitura encontrou indícios que comprovariam que o município já tinha pagado pelas obras. Segundo uma perícia, entre 1980 e 1985 a empreiteira recebeu o dobro do valor do contrato. Auditoria do TCU também constatou “potenciais irregularidades”. Laudos grafotécnicos atestaram que há assinaturas falsas no documento usado pela AG para iniciar a cobrança.

Após o julgamento, ocorrido no dia 6, em que o Tribunal de Justiça cassou a liminar que suspendia o pagamento dos precatórios, a Prefeitura de Betim recebeu a ordem para realizar o pagamento de parte da cobrança. A previsão era que o município tivesse um bloqueio de até R$ 131 milhões nos próximos dias. Esse valor corresponde, por exemplo, a três vezes o orçamento anual da Secretaria Municipal de Assistência Social. 

MP assume ação rescisória
No último dia 26 de outubro, o Ministério Público também ingressou no TJMG com um pedido de anulação da cobrança de R$ 480 milhões que a AG faz contra Betim, além de uma liminar para suspender o mesmo pedido de bloqueio dos R$ 131 milhões contra o município. 

A solicitação do MPMG, feita por meio do procurador de Justiça Marcos Paulo Cardoso Starling, teve como base uma ação rescisória proposta pela Associação dos Servidores Efetivos Arquitetos e Engenheiros de Betim (Amae), proposta em agosto deste ano, diante das diversas fraudes descobertas pela Prefeitura de Betim no processo que originou a cobrança da AG. “A entidade é uma associação de servidores efetivos de Betim que quer defender o patrimônio público, pois ela é uma terceira interessada no caso, já que, no seu estatuto, está a defesa do patrimônio público. E, caso esse bloqueio fosse efetivado, poderia comprometer até a folha de pagamento dos próprios servidores”, explicou o advogado Joab Ribeiro Costa, que assina a ação rescisória em nome da Amae.

Venda ilegal será denunciada à PF
Na próxima semana, a Prefeitura de Betim também fará denúncia na Polícia Federal (PF) sobre a venda irregular dos precatórios que a AG cobra de Betim. Essa transação, considerada suspeita pelo município, já foi denunciada na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), órgão que regulamenta o mercado de precatórios. A transação, ocorrida no dia 2 de outubro para o fundo Masone, contrariou as regras da CVM, já que ocorreu quando o precatório ainda estava suspenso por ordem judicial e não poderia ser vendido, pois há várias ações judiciais que o contestam. 

O mesmo fundo tem 66% de seu capital atrelado a precatórios da AG, que pertence ao Banco Modal, citado em investigações da PF sobre fraudes no sistema financeiro e pagamento de propinas a políticos e empresários na Lava Jato. 

Seis dias após o fundo Masone adquirir o precatório da AG, a Quadra Gestão de Recursos Financeiros, que faz a gestão do fundo, aplicou R$ 350 milhões na Renova Energia, empresa que está em recuperação judicial e que também foi alvo de operações da PF.