Acílio Lara Resende

Coincidências que despertam saudades

Será que o mundo da inteligência já foi embora?

Por Da Redação
Publicado em 06 de agosto de 2020 | 03:00
 
 

Sob o título “Dois centenários”, Fernando Henrique Cardoso, em seu artigo no jornal “O Globo” de 2 de agosto, recorda que, se estivessem vivos, Celso Furtado e Florestan Fernandes – dois renomados intelectuais, além de autores, cada um no seu canto, de obras da maior importância para (digo eu) o desenvolvimento humano em nosso país – completariam 100 anos. “É de intelectuais dessa têmpera – afirmou FHC – que o Brasil precisa: que pesquisam e saibam antever o que pode acontecer. Sem medos nem arrogâncias. Com sabedoria”.

No mesmo domingo, leitor, “O Globo” também publicou longa entrevista com o escritor e jornalista Gay Talese, 88.

Após críticas ao jornalismo (dito por ele) de “pegadinha”, que se utiliza de “métodos que induzem o entrevistado a fazer declarações prejudiciais à sua integridade e reputação”, assim respondeu Talese à pergunta, feita pelo repórter Edward Pimenta, sobre se as mídias sociais estão redefinindo padrões de jornalismo: “Não sei muito e também não me importo com as mídias sociais, já que não faço parte delas nem as acompanho. Estou tão distante da tecnologia moderna que nunca na vida sequer tive um telefone celular. Além disso, nem sei o que é o Twitter. Como jornalista, nunca usei um gravador, eu os detesto, acho que eles não dão ao entrevistado a chance de se defenderem dos praticantes do jornalismo de emboscada e suas perguntas capciosas. Mídias sociais e entrevistas gravadas – concluiu o entrevistado –, armas mais comuns dos jornalistas de hoje, são ferramentas rápidas que servem às mentes preguiçosas”.

Um dia antes, ainda garimpando notícias capazes de fortalecerem a minha esperança em nosso país, li a reportagem sobre o escritor e cronista do “Estadão” Gilles Lapouge, 96, morto em Paris na última sexta-feira. Depois li o comentário sobre ele de William Waack, que trabalhou com ele, em dupla com Araújo Neto, de saudosa memória.

Filho dos mais diletos de São João del Rei, de cuja cidade nunca se desligou ou se distanciou, Jota Dangelo – José Geraldo Dangelo, 88 – foi eleito, por unanimidade, para a Academia Mineira de Letras, como ocupante da cadeira 26, que pertenceu a Bartolomeu Campos de Queiroz. Médico, escritor, mas apaixonado pelo teatro, arena na qual fez de tudo – de ator a diretor –, o novo imortal confessou, em entrevista ao jornal O TEMPO, que o seu celular só recebe e faz chamadas: “Não tenho Instagram, WhatsApp, nada”, afirmou sorrindo.

Será que esse “mundo que já foi embora”, no dizer de William Waack, representado por Celso Furtado, Florestan Fernandes, Gay Talese, Gilles Lapouge e Jota Dangelo (estes são só alguns poucos exemplos de inteligências a serviço da… própria inteligência), pergunto eu, desapareceu mesmo? A resposta fica para você, meu caro leitor.

Aguardo-a com fé.