Acilio Lara Resende

Acílio Lara Resende é jornalista e escreve às quintas-feiras

Acílio Lara Resende

Escrever é escolher palavras

Publicado em: Qui, 06/05/21 - 03h00

Meu irmão Otto Lara Resende, que teria completado no dia 1º de maio 99 anos, foi o primeiro a me advertir sobre o uso das palavras: “Escrever é escolher palavras”, disse-me lá se vão dezenas de anos.

Confesso que não sei quem é o autor da frase ou se de fato existe alguém responsável por ela. Já a encontrei em textos de terceiros, escritores ou cronistas. Escrever sobre política, por exemplo, de janeiro de 2019 para cá, vem-se tornando cada dia mais difícil. A procura das palavras certas não é fácil para os que não as usam como borduna.

Dizia também Otto: “As palavras sangram: elas são sangrentas”. Poucos, porém, enxergam isso. Essa dificuldade aumentou ainda mais com o sofrimento de milhares de brasileiros com a pandemia, que, por sua vez, colaborou para o aumento da polarização política no país. A impaciência e a grosseria têm causado inimizades até em família.

Sim, leitor. Haja energia para enfrentar este tempo de profunda angústia e infelicidade, aqui e no mundo todo. A cada notícia da morte de um amigo ou parente, o coração bate desordenadamente. Lutamos hoje para sobreviver. Parece que só o ministro da Economia, Paulo Guedes, que está sempre com uma fisionomia de quem comeu, mas não gostou, não deseja nem viver, nem sobreviver. Para ele, viver muito não é coisa boa para os cofres públicos. “Todo mundo – exclamou, expondo sua revolta – quer viver 100 anos!”. Um absurdo, não é mesmo?

Continuamos a ser um país não dotado ou mal dotado de bom senso e, agora, de falta de censo. Na realidade, não queremos saber o que somos e, obviamente, insisto, por total falta de bom senso.

O presidente Jair Bolsonaro, na semana passada, voltou a questionar o foco da CPI da Covid no Senado: “Você vê: essa CPI vai investigar o quê? Eu dei dinheiro para os caras. No total, foram mais de R$ 700 bilhões, auxílio emergencial no meio. Muitos roubaram dinheiro, desviaram”, referindo-se, genericamente, a prefeitos e governadores.

Depois de contestar qualquer investigação sobre a conduta tanto sua quanto do seu governo durante a pandemia, e se foi ou não favorável à cloroquina, voltou a preconizá-la: “Pô, se eu tiver um novo vírus aí, eu vou tomar de novo, eu me safei em menos de 24 horas, assim como milhões de pessoas”, disse o presidente, referindo-se ao remédio sem evidência científica de que seja útil no combate à doença.

O destempero com que se aborda a política hoje (com a palavra, o presidente Bolsonaro…) colabora para atos antidemocráticos como os que temos visto em cidades pelo país, que pregam o fechamento do STF e uma “ceifada” no Congresso Nacional, como se a saída para o país dependesse da implantação de uma ditadura militar.

Quando, afinal, aprenderemos com os erros?

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