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Opinião

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Publicado em: Sex, 24/07/20 - 03h00

Recentemente, Mary Lea Trump, sobrinha do chefe do executivo dos EUA, anunciou que o lançamento de seu livro de memórias “Too Much and Never Enough: How My Family Created the World's Most Dangerous Man” (“Demais e Nunca o Suficiente: Como Minha Família Criou o Homem Mais Perigoso do Mundo”, em tradução livre) deverá ocorrer em 28 de julho, semanas antes da Convenção Nacional Republicana, que, provavelmente, indicará Donald Trump à reeleição.

No livro, Mary assegura que seu tio se transformou em uma “ameaça à saúde, à segurança econômica e ao tecido social do mundo”, além de ser um sujeito com baixa autoestima, que necessita humilhar terceiros. “Seu ego é frágil e precisa ser constantemente reforçado, porque, no fundo, ele sabe que não é nada do que diz ser”, escreveu.

Um casal carioca, entretanto, mostrou que não é necessário ostentar bilhões de dólares na conta bancária ou mesmo ser o chefe político de uma grande nação para que o espírito de superioridade transcenda o próprio indivíduo. Basta ser “engenheiro civil. Formado, e muito melhor que você!”.

A fala supracitada faz parte de um vídeo exibido em reportagem do programa Fantástico, da TV Globo, no último dia 5, que chocou o país. Na matéria, a equipe de jornalistas acompanhava uma ronda da Vigilância Sanitária no primeiro dia da reabertura dos bares e restaurantes no Rio de Janeiro quando flagrou aglomerações nos estabelecimentos. O casal, contrariando às autoridades de saúde por não usar máscaras, valeu-se do argumento citado para desacatar o fiscal que havia notificado as irregularidades.

É provável que a postura agressiva do engenheiro civil formado e sua esposa tenha sido motivada pela falta de entendimento de que o fiscal atuava para o bem comum.

De acordo com o professor Mario Sergio Cortella, indivíduos arrogantes são aqueles que consideram que não têm mais nada a aprender, e avaliam que apenas os seus desejos são corretos. Talvez isso explique, embora não justifique, o comportamento beligerante do casal, que, ao que tudo indica, considera o próprio anseio de diversão mais relevante que a saúde pública.

Diante da repercussão negativa, a autora das ofensas, Nívea del Maestro, foi rapidamente identificada e demitida do seu emprego com direito a nota pública da ex-empregadora afirmando que repudia o comportamento da ex-colaboradora.

Quanto ao outro autor das ofensas, o “engenheiro civil formado e muito melhor que você”, foi igualmente identificado como Leonardo Barros. Assim como a esposa, ele afirma que perdeu o emprego em um projeto sigiloso de gerenciamento de risco e passou a ser profundamente questionado pela sociedade e atacado nas redes sociais, principalmente, depois da descoberta de sua inscrição no programa de auxílio emergencial.

Curiosamente, mesmo diante de todas as consequências negativas que o casal sofreu, ambos não demonstraram arrependimento. Em entrevista posterior aos fatos, consideraram que não haviam feito nada de errado e ainda questionaram a capacidade dos telespectadores de interpretar o que foi claramente dito, subestimando o que o psicólogo norte-americano Howard Gardner chama de inteligência linguística de inúmeros brasileiros.

Esse é exatamente o perfil de um sujeito com falta de humildade. Jamais assume os próprios erros e ainda desdenha dos demais. Assim como afirmou Mary Lea Trump, “seu ego é frágil e precisa ser constantemente reforçado, porque, no fundo, ele sabe que não é nada do que diz ser”.

 

Gabriel Viegas também é professor no curso de Direito da Faculdade Batista de Minas Gerais

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