Chuteiras e Gravatas
Na última sexta-feira, o Comitê de Ética da Fifa suspendeu o presidente da CBF, Marco Polo Del Nero, por 90 dias. A punição ainda pode ser aumentada, por mais 45 dias, se a entidade quiser estender o gancho. O dirigente, acusado pela Justiça americana de integrar um esquema de corrupção e lavagem de dinheiro, já recorre da decisão, na tentativa de reassumir a cadeira mais poderosa do futebol brasileiro. Nos bastidores, eram favas contadas: em abril do ano que vem, Del Nero seria reeleito presidente da confederação para o período de 2019 a 2023, sem concorrentes e sem muito esforço. As articulações para a escolha de seus vice-presidentes estavam até adiantadas. São oito vices, cinco de cada região do país e três indicados pelo mandatário. Um dos vices seria Castellar Guimarães Neto, atual presidente da Federação Mineira de Futebol. O dirigente mineiro, que assumiu um cargo na Fifa no começo do ano, ganhou força e prestígio nos últimos anos, municiado pelas conquistas dos times do Estado em âmbitos nacional e internacional.
Alternativas
Zico, Ronaldo e Romário, três ex-atacantes, de engajamento político, ídolos do futebol brasileiro, tentam se mobilizar para lançar seus nomes como alternativas à presidência da CBF. A questão é que, para se inscrever como candidato a presidente da confederação, é preciso do aval de, pelo menos, cinco federações e de oito clubes, algo que, no momento, não é tão simples, já que todos estão (ou estavam) amarrados ao interesse de apoiar Del Nero no pleito.
Situação
Del Nero está em maus lençóis. Embora ele já tenha apresentado recurso, a Fifa não deve se posicionar por agora, já que entrou em recesso de fim de ano. Além disso, o resultado do julgamento de José Maria Marin nos Estados Unidos, que pode sair a qualquer momento, vai respingar diretamente em uma sentença condenatória de Del Nero no Comitê de Ética da Fifa. Depois disso, só uma apelação ao Tribunal Arbitral do Esporte, que leva meses, poderia salvá-lo.
Estratégia
Com a suspensão de Del Nero, as conversas para a eleição estão paradas no momento. Regimentalmente, o presidente pode convocar eleições nos 12 meses que antecedem o término do mandato. Como Del Nero sairia em abril de 2019, ele já faria o pleito em abril de 2018. Mas por que tanto tempo antes assim? Escolher o mandatário antes da Copa do Mundo, em junho e julho, evitaria desgastes e críticas à direção da CBF em caso de mau desempenho da seleção no Mundial.
Manobras
Del Nero, na verdade, tinha arquitetado planos para permanecer no posto até 2027. O novo estatuto, aprovado em março, prevê apenas uma reeleição, mas isso só passaria a valer na próxima disputa. Ou seja, ele poderia vencer o pleito de agora, ficaria de 2019 a 2023 e, depois, por mais um quadriênio, de 2024 a 2027. Nada como mudar as regras com o campeonato em andamento, algo que muito coronéis do esporte nos ensinam há anos, não é mesmo?
Pesos
As artimanhas de Del Nero para se garantir no poder não ficaram por aí. Na mesma reforma do estatuto, as federações ganharam mais pesos do que os clubes. O votos das federações estaduais são multiplicados por peso 3, os dos 20 clubes das Séries A, por 2, e os dos 20 clubes da Série B, por peso 1. Na prática, as 27 federações, por si só, já conseguem indicar o presidente, já que somariam 81. Se os 40 times se unissem, chegariam só a 60.
Explico
Para quem não é de redes sociais, a hashtag #sqn significa “só que não”. A expressão é usada para dizer o contrário do que pensa. Por exemplo: “Adoro futebol, #sqn”. A se tomar por base os casos de Blatter, ex-presidente da Fifa, e de Platini, ex-presidente da Uefa, a suspensão de Del Nero pela Fifa é um indicativo de que o brasileiro não apitará mais por aqui. Julgados culpados pela entidade, os dois primeiros foram banidos do futebol por oito anos.