Cida Falabella

Vereadora de Belo Horizonte pelo PSOL

Cida Falabella

É coletivo, sim!

Publicado em: Qui, 08/04/21 - 03h00

Os chamados “mandatos coletivos” nascem de um desejo criativo e inventivo de ocupação da política institucional para radicalizar a democracia. Nos últimos anos, essas experiências se popularizaram no país e no mundo, sem negar outras formas de coletivização de práticas e decisões de mandatos populares que vieram antes. Tenho orgulho de pertencer a essa “nova geração”, que busca atualizar e ressignificar práticas de representação política, formas de participação popular e métodos de mobilização social, gerando também inúmeros debates políticos, jurídicos e legislativos.

Em 2016, quando fui eleita vereadora ao lado de Áurea Carolina, nossa campanha coletiva encantou a cidade com o lema “Votou em uma, votou em todas”. A partir de um processo público de encontros programáticos, diálogos sobre tática eleitoral e pactuações de princípios e compromissos, lançamos 12 candidaturas distintas pelo PSOL que vocalizavam “a cidade que queremos”. Sonhávamos em conquistar um mandato e inventar como seria seu funcionamento coletivo, mas o resultado saiu melhor que a encomenda: elegemos duas vereadoras e formamos um único mandato, aberto e popular, conhecido até fora do país, a Gabinetona.

Nos primeiros dois anos desse projeto feminista e antirracista, experimentamos um compartilhamento radical na Câmara Municipal. Convidamos as outras candidatas para compor a equipe, incorporando suas pautas.

Quebramos as paredes, compartilhando também o espaço físico (forma é conteúdo!), e inauguramos a covereança com Bella Gonçalves, nossa primeira suplente. Também criamos diversas ferramentas de interação com a população para manter uma mobilização social constante e uma atuação parlamentar porosa aos movimentos da cidade.

Dois anos depois, foi a legitimidade desse projeto coletivo único que possibilitou sua expansão, com a eleição de Áurea como deputada federal e Andréia de Jesus como deputada estadual. Experimentamos uma articulação complexa de quatro mandatos parlamentares nas três esferas do legislativo. Uma rede de mais de cem ativistas, em um período de efervescência, trocas e formação coletiva.

Após o resultado das eleições de 2020, Bella Gonçalves e Iza Lourença foram eleitas e me convidaram para ser covereadora, dando continuidade e reinventando a Gabinetona BH. Para mim, assim como no teatro, coletivo é um princípio. E dele não abro mão.

No ano passado, a cidade também elegeu a ColetivA, que reuniu 11 ativistas em uma única candidatura pelo PT, com Sônia Lansky à frente. Uma experiência desafiadora, com seus próprios acordos internos e muito potencial para fazer a diferença na cidade. Infelizmente, por motivos de saúde, Sônia renunciou ao cargo, interrompendo precocemente a experiência institucional da ColetivA. As tentativas de reduzir sua decisão a “pressões partidárias” ou “conflitos internos” mostram total desconhecimento sobre os processos políticos em geral, complexos e dinâmicos como a vida. Sou muito solidária à Sônia, com quem aprendi a importância de uma saúde integral.

Esse não foi o primeiro e provavelmente não será o último mandato coletivo que se dissolve. Mas os desvios e as perdas não podem ser tratados como prova de uma suposta falência de um modelo. Novos arranjos estão sendo constantemente testados, a partir de outras experiências de inovação política.

Desejo força à ColetivA, que já anunciou sua continuidade, agora sem o mandato formal. A luta na institucionalidade é só uma parte da beleza de um processo real, um coletivo que se propõe a colocar a mão na massa para mover as estruturas, fortalecer os princípios democráticos e as lutas populares. O importante é fazer política coletivamente, criativamente, nos territórios, contra as desigualdades, as injustiças e a política da morte.

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