CRISTOVAM BUARQUE

Um regime de partido único no Brasil?

Redação O Tempo

Por Da Redação
Publicado em 13 de maio de 2011 | 00:00
 
 

Quando lemos os jornais, temos a sensação de que estamos caminhando para um regime de partido único no Brasil. E com tendências diferentes, como, aliás, ocorreu com todos os partidos únicos do mundo e com seus conflitos internos.

De um lado, o governo está conseguindo juntar quase todos os partidos como tendências de um grande partido único de governo, além de cooptar as organizações do movimento social.

De outro lado, a oposição está se diluindo pela perda de propostas alternativas. Os partidos de oposição têm se limitado a ser apenas denunciadores.

É claro que isso facilita governar, mas não ajuda o funcionamento da democracia. Ao juntar todo mundo, há a perda da perspectiva crítica do governante e o risco dele cometer erros por falta de alertas. O grande mérito da democracia está na capacidade da sociedade de identificar e corrigir erros dos governos. Ao desfazer os outros partidos, os descontentamentos não têm para onde caminhar.

Na Tunísia, havia um imenso partido, mas o presidente dava o direito de surgirem outros pequenos partidos, desmoralizados. Os descontentes não encontravam partidos alternativos que os representassem, foram para a praça e derrubaram o governo por meio de atos de rua, a única alternativa viável diante de partidos únicos.

O Brasil precisa ter democracia para abarcar os descontentes, com partidos organizados, consolidados e com programas capazes de evitar que o povo, por falta de partido, tenha que ir para a rua quando precisar manifestar seu descontentamento.

A imensa capacidade do ex-presidente Lula era de juntar partidos diferentes, não em torno de programas nem de ideologias, mas de cargos e acordos específicos. Além disso, ele conseguiu juntar as forças não partidárias. As organizações não governamentais viraram associadas; os sindicatos ficaram amarrados; os estudantes, passivos; os intelectuais, calados. Precisamos de intelectuais que falem, de estudantes que caminhem nas ruas, de sindicatos que reivindiquem, de ONGs que fiscalizem.

Que possam radicalizar, dizendo que este país tem de ter hospital igual para todo mundo, que é indecente uma pessoa viver ou morrer porque tem ou não tem dinheiro. E que tenham coragem de dizer que é imoral existir escola boa e escola ruim. Escola é escola ou não é escola; não existe boa ou ruim. Ao não radicalizar, o governo absorve as ideias moderadas que eles têm e fica tudo igual.

A democracia brasileira, não daqui a um mês, ou daqui a dois meses, ou daqui a cinco meses, ou daqui a cem meses, mas ao longo de alguns anos ou talvez de algumas décadas, corre risco. Não resiste a um processo democrático construído a partir de alianças tão amplas que o que sobra do outro lado são concessões para que continue funcionando, sobretudo quando essas concessionárias partidárias não têm propostas, não têm programas, não têm ideias.