Foi-se o tempo em que o Carnaval durava apenas três dias. Agora, ele começa muito antes e termina depois do feriado regulamentar. Está mais do que consolidado que, para a sociedade brasileira atual, três dias não são suficientes para extravasar sua alegria.
Um cidadão estrangeiro estranharia o porquê dessa alegria. Com os olhos críticos de boa parte dos brasileiros, mas com a frieza dos que não estão envolvidos na festividade, ele não se dá essa trégua e não vê motivos para o povo comemorar com tanta euforia.
O Brasil dos últimos tempos é um país triste, e, talvez por isso mesmo, mais tenha o povo necessidade de exibir sua felicidade, não aquela da ditadura do bem-estar, conforme reportagem de O TEMPO de domingo último, mas aquela do corpo, física mesmo.
Como tentou o antropólogo Roberto DaMatta, uma das formas de compreender a sociedade brasileira é pelo Carnaval, esta festa em que as desigualdades sociais se desfazem e é promovido um enorme congraçamento libertador do indivíduo da depressão.
O fenômeno é particularmente experimentado hoje em Belo Horizonte, há até pouco uma sociedade trancada e moralista, que agora adere, aos milhares, aos blocos, centenas deles, ocupando os espaços públicos e apropriando-se da cidade dividida.
Os primeiros blocos a sair arrastaram multidões e, evidentemente, também provocaram incidentes. Dadas as dimensões dos grupos, a heterogeneidade e a diversidade, se já produzem estranhamentos internamente, muito mais a quem esteja acomodado ao conforto burguês.
Uma festa com essa envergadura é naturalmente transgressora, impondo suas vontades no sentido do exercício da tolerância e da superação dos preconceitos. Nessas circunstâncias, ao poder público resta um mínimo de controle, ao prover a infraestrutura.
Aos incomodados, fica a certeza de que tudo voltará ao normal a partir da Quarta-Feira de Cinzas.
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