Fernando Fabbrini

Escreve todas as quintas-feiras no Portal O Tempo

Quem mata mais

Publicado em: Qui, 25/04/19 - 03h00

Estive em Fernando de Noronha algumas vezes a passeio e a trabalho, produzindo vídeos para o Projeto Tamar, que lá tem uma base. Acabei aprendendo muito sobre tartarugas marinhas, sendo até capaz de identificar as espécies e lembrar seus nomes científicos complicados.

Em mais de 20 anos de monitoramento, nunca houve sequer um ataque de tubarão em Noronha. Isso se explicava pelo perfeito equilíbrio ecológico preservado. Turistas se encantavam, sobretudo, na praia do Sueste, onde podiam mergulhar em meio a arraias, tartarugas, peixes multicoloridos – e tubarões serenos, de barrigas cheias. De repente, a surpresa ruim. Ataques pipocaram e, recentemente, o mais grave aconteceu: nadando lá, um rapaz perdeu a mão e parte do antebraço levados por um tubarão-tigre, espécie extremamente agressiva.

Algo mudara. Influenciada talvez pela incidência frequente de ataques também nas praias de Recife (mais de 60 desde 1992, sendo vários fatais), a turma se assustou. E muitos já pensam duas vezes antes de programarem férias no mais belo arquipélago de nossa costa. Garimpando informações de sites especializados, descobri dados surpreendentes e inquietantes sobre o ranking dos matadores que nos rodeiam e ameaçam.

Vejam só: o tubarão está em último lugar, com menos de dez mortes por ano, empatado com os lobos. Para aqueles que pensam visitar a África, vou avisando: não deem moleza. Elefantes e leões matam cem pessoas por ano. Os hipopótamos – inacreditável! – alcançam a marca de 500, mais de um ataque por dia, e os crocodilos não estão pra brincadeira: em torno de mil humanos vão para o beleléu para saciar seus apetites furiosos.

Subindo na escala dos matadores, encontraremos aqueles que nos liquidam silenciosamente e por dentro: vermes, parasitas de todo tipo; doenças como Chagas, esquistossomose e outras. Esse grupo responde por 10 mil mortos anualmente, principalmente nas comunidades humildes, carentes de saneamento básico.

A coisa começa a ficar mais séria quando entram em cena os cães – sejam domésticos, de caça, de guarda ou de rua. Ataques de cachorro matam cerca de 25 mil pessoas mundo afora, ano após ano. E as serpentes, rápidas e implacáveis na hora do bote, vão além: 50 mil humanos morrem picados por elas nos quatro cantos do mundo.

E assim chegamos ao segundo e ao primeiro lugar desse ranking assustador. Na vice-liderança, o que vamos encontrar? Ora, é fácil: lá está o próprio homem, bicho estranho e agressivo que mata pelas razões mais estúpidas – por ciúme; por diferenças de crença ou ideologia; para roubar; para se vingar; pelo prazer de fazer sofrer seus semelhantes; por “não aceitar o fim da relação”, e outras causas hediondas. Sabe quantos humanos morrem, em média, por ano, vítimas de homicídios? Quase 500 mil. E não sei se aqui já foram computados números crescentes da violência nas ruas do nosso país. Deve dar mais, com certeza.

Tchan-tchan! Vamos ao campeão dos assassinos! Quem arrisca um palpite? Vou dar uma pista: ele não tem garras nem dentes afiados; é lento; é frágil e pode ser eliminado com um simples tapa ou uma raquete elétrica. Exatamente: no topo dos matadores estão os mosquitos. Aqui se incluem vários tipos do inseto – Culex, Anopheles, Haemagogus e o nosso conhecidíssimo Aedes aegypti. Nada menos que 750 mil pessoas, em média, morrem no mundo a cada ano, vítimas das doenças causadas por eles.

Portanto, humanos, atenção redobrada. Não podemos subir as estatísticas mundiais apenas por descuido ou descaso – fatores genuinamente nacionais. Aliás, nisso a gente já é recordista há muitos anos. Belo Horizonte continua com ruas imundas e lixo espalhado por toda parte. O campeão dos matadores agradece e voa feliz rumo às nossas casas.

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