FLÁVIA DENISE

#entonação

Redação O Tempo

Por Da Redação
Publicado em 23 de novembro de 2015 | 03:00
 
 
Souzza

SMS, WhatsApp, Gtalk, chat do Facebook, Snapchat. Ao contrário da previsão dos “Jetsons”, que via um futuro cheio de videofones, os seres humanos parecem não ter muito interesse em transformar as ligações de vídeo, nas quais podemos olhar nos olhos de nosso interlocutor, em sua principal forma de contato diário. A verdade é que não queremos ser vistos a qualquer hora do dia. Preferimos condensar nossos pensamentos em pequenas pílulas de texto.

Como não poderia deixar de acontecer, ao resolver um problema criamos outro. Interações em vídeo e áudio são levemente constrangedoras porque estamos expondo nuances que nem sempre queremos demonstrar, como um tom de voz que mostra raiva, alegria ou desconfiança – ou um movimento involuntário da face que trai nossa surpresa ou até mesmo uma risada inadequada. Ao escrever e enviar um curto encadeamento de palavras acreditamos estar construindo um filtro poderoso, no qual só passa aquilo que queremos.

No entanto, a realidade da palavra escrita é um pouco mais complicada. Ao abrir mão de todas as nuances que a voz e o movimento facial nos oferece, perdemos grande parte do sentido da mensagem. Assim, um comentário dúbio como “você me faz passar cada vergonha”, pode ser interpretado como uma piada ou uma repreensão – sentido duplo impossível se a frase viesse acompanhada por um sorriso ou olhar duro.

Felizmente, o ser humano é excelente em resolver problemas. Como marcar uma frase como piada, bronca, brincadeira ou repreensão? A resposta encontrada é simples: criando marcações literais na frase. Em vez de aumentar o texto para que ele descreva como nos sentimos e o ambiente em que estamos, como faziam nosso antepassados com suas longuíssimas cartas, preferimos explicitar nosso sentido com emoticons e hashtags. “Você me faz passar cada vergonha #chatiado” é bem menos dúbio do que sua versão anterior.

Infelizmente, o ser humano é ainda melhor em julgar os outros seres humanos do que em resolver problemas. Assim, uma forma simples e genial de tornar eficiente a comunicação escrita se torna sinal de ignorância da “real utilidade da hashtag”, que foi criada para categorizar tipos de informação na web (ao usar uma hashtag em um local onde ela se torna um link, você está associando o seu conteúdo com milhões de outros sobre o mesmo assunto).
Eu sei que as coisas são mais simples quando cada ferramenta tem um só uso. Mas elas são infinitamente mais interessantes quando nos permitimos outras formas de aplicá-las. Afinal, somos ou não somos o povo que inventou uma palavra específica para “gambiarra”?

Assim, da próxima vez que você escutar, ler ou sentir vontade de expressar comentários sobre como os nativos da internet estão subvertendo a língua e destruindo suas nuances, lembre-se de que eles estão seguindo os passos de absolutamente todas as pessoas que vieram antes de nós ao adaptar sua língua à sua realidade, criando mecanismos para se comunicar com clareza. Não importa que a hashtag foi criada como uma ferramenta para ajudar a pesquisa online. Não importa que ela seja usada onde não pode ser clicada. O importante é ela ser útil para esclarecer o significado em uma era em que a palavra escrita ganha relevância. #prontofalei