FLÁVIO SALIBA

A política brasileira e as artes do capeta

Redação O Tempo

Por Da Redação
Publicado em 08 de dezembro de 2017 | 03:00
 
 

O capeta está na moda. Não só nas preleções do fundamentalismo cristão ascendente, como também nos corredores dos Três Poderes, onde ele é visto, com certa frequência, de terno e gravata ou toga. Há quem afirme tê-lo visto em suas tradicionais vestes vermelhas contando potocas nos confins do Brasil. O desarranjo é tanto que a maioria silenciosa, que resolveu protestar nas ruas nos últimos anos, calou-se e deixou o debate sobre a crise política brasileira por conta das minorias radicalizadas de direita e de esquerda.

Para as primeiras, o capeta surge nas figuras de Gramsci, de George Soros, da globalização e, pasmem, da ONU. Gramsci, por haver influenciado o pensamento social brasileiro com sua tese da hegemonia cultural de inspiração anarco-marxista, teria contribuído para abalar o sistema capitalista e as tradições judaico-cristãs, promovendo o caos e criando as condições ideais para a emergência “pacífica” do socialismo. Esse capeta, de fato, ficou na moda entre muitos intelectuais e militantes de esquerda.

Outro capeta, o bilionário George Soros, segundo intelectuais como Olavo de Carvalho, seria responsável pelo financiamento, mundo afora, de centenas de instituições e ONGs esquerdistas, ambientalistas e contrárias às tradições cristãs. Por sua vez, a globalização, como já comentei aqui, foi, a princípio, bem recebida pela direita, sobretudo pelas elites econômicas, que nela viam maiores oportunidades de investimento e geração de riquezas. No entanto, a tradicional visão nacionalista de parcelas das Forças Armadas parece haver ganhado fôlego junto à direita tradicional com a eleição do isolacionista Donald Trump. Paradoxalmente, a esquerda, que antes esconjurava a globalização, hoje parece vê-la como o derradeiro passo do capitalismo para o paraíso socialista.

Outro capeta, a ONU, é vista como um indesejável governo universal, representante das grandes corporações e do universalismo comunista, ao promover a diversidade étnico-cultural, conceber e financiar práticas contrárias aos interesses nacionais, promover programas de controle da natalidade e propor a ideologia de gênero e, mesmo, o conteúdo do ensino nas escolas. Além do mais, e aí tem o dedo de Trump, a ONU incentivaria políticas ambientais ilusórias, posto que, segundo ele, não há comprovação de que a ação do homem interfira na degradação ambiental do planeta.

A esquerda, por sua vez, não diz claramente a que veio, mesmo porque se desmoralizou com o desastre de seus governos, as alianças políticas espúrias, os escândalos de corrupção e a prisão de suas principais lideranças. Restam-lhe os temas de uma duvidosa inclusão social e dos novos movimentos culturais que, por puro oportunismo, adotou como seus, enfurecendo a direita e trazendo a discussão para o campo dos costumes, tão ao gosto dos regimes totalitários. Contrária, por pura pirraça, às reformas econômicas, políticas e institucionais indispensáveis ao país, coloca-se ao lado do que há de pior na política brasileira, vale dizer, ao lado do atraso.