FLÁVIO SALIBA

Mobilidade e ousadia nas intervenções urbanas: Rio e BH

Mesmo na bancarrota, Rio de Janeiro dá lição de ousadia

Por Da Redação
Publicado em 03 de agosto de 2018 | 03:00
 
 

Não sou frequentador assíduo do Rio de Janeiro, onde o clima de insegurança, promovido pela verdadeira guerra civil ali instalada nas últimas décadas, me deixa temeroso. No entanto, em recente visita àquela cidade, fiquei agradavelmente surpreso com as intervenções urbanas que, apesar da crise econômica e da corrupção política que levaram o Estado do Rio à bancarrota, transformaram amplas áreas da capital fluminense em espaços particularmente belos e agradáveis.

A região da Cinelândia, servida por uma confortável linha de metrô e, hoje, livre do trânsito infernal, transformou-se num aprazível logradouro por onde circula, em mão dupla e sem maiores obstáculos para os pedestres, o VLT que a interliga à praça Mauá, à região portuária, em franco  processo de renovação com a criação do bulevar Olímpico, e ao aeroporto Santos Dumont. Trata-se de uma intervenção urbana bem-sucedida de transformação de áreas degradadas e mesmo violentas em espaços de convivência civilizados e atraentes para o turista. Para isso foi necessário ter, além de recursos, muita ousadia, uma qualidade talvez mais afeta aos cariocas que a nós, belo-horizontinos. A maior dessas ousadias foi, a meu ver, a interdição do trânsito em quase toda a extensão da avenida Rio Branco, a principal via de ligação do centro à zona Sul da cidade do Rio. 

Faço essas considerações para me referir a assunto já abordado nesta coluna e debatido com estudiosos do trânsito de Belo Horizonte. Trata-se da equivocada decisão tomada, ainda nos anos 70, pela antiga Metrobel, de induzir o trânsito da capital para as avenidas que cortam em diagonal os eixos ortogonais do traçado viário circunscrito pela avenida do Contorno. Após anos de observação e coleta de dados, demonstrei que a distribuição do fluxo de veículos pelas vias ortogonais traria vantagens tais como a perfeita sincronização de semáforos – dificultada pelos cruzamentos de três ou quatro ruas e avenidas –, maior segurança nas travessias de pedestres e racionalização dos percursos a serem seguidos pelo motorista. Isso evitaria, ainda, o sem-número de voltas para localizar endereços, devido ao seccionamento de ruas e às frequentes inversões de sentido do trânsito, que desorientam, inclusive, veteranos motoristas da cidade. Mais do que isso, o fechamento total ou parcial das avenidas que cortam diagonalmente o xadrez viário liberaria espaços que somam mais de 1 milhão de metros quadrados, possibilitando a criação de amplas áreas verdes, espaços de convivência e, quem sabe, a implantação de uma extensa malha de VLTs, e não uma medíocre e dispendiosa linha de metrô ligando a atual rodoviária à Savassi, a ser concluída, com muita sorte, lá pelo final do século. Apenas a título de ilustração: duas linhas paralelas de VLT ocupam menos de 9 m de largura, o que viabiliza sua implantação, inclusive, nas vias ortogonais da cidade. Mas isso é otimismo em demasia numa cidade que já foi a terceira maior e melhor capital brasileira.