LAURA MEDIOLI

Os bichos agradecem

Redação O Tempo

Por Laura Medioli
Publicado em 27 de novembro de 2016 | 04:30
 
 
Souzza

Tive o privilégio de crescer num local onde os animais faziam parte do meu mundo, e a convivência com eles me fez não somente entendê-los, mas, acima de tudo, admirá-los com suas peculiaridades, enxergar neles uma beleza alimentada pelo amor e pelo instinto.

Quem tem um cão a seu lado, por exemplo, sabe que esse amor, que nada exige em troca, adoraria ter de você apenas atenção e carinho, mas, se estes não vierem como gostaria, não tem problema, ele te amará do mesmo jeito. Ao chegar em casa, é aquela explosão de felicidade, com os rabos abanando, pulos, latidos, lambidas, todas as formas que encontram para demonstrar a alegria, apenas por você ter voltado.

E, quando adoecemos, quase adoecem juntos. Lembro-me da última vez em que estive mal, com febre e uma indisposição terrível, e as três cadelas de casa se recusavam a sair do meu quarto. Permaneciam quietinhas, sem aprontar a confusão que normalmente aprontam quando estão juntas.

Vlora, minha mais querida pit-lata, olhava-me com uma expressão tão triste como se sentisse a minha dor. E, como se não bastasse, de madrugada, acordo com um movimento no travesseiro do meu marido, que viajava. Sonolenta pelos medicamentos, percebo que o movimento era dela, que, no decorrer da noite, preocupada, veio deitar-se ao meu lado, enquanto as outras duas, aos pés da cama, não arredavam as patas. Um amor que tão logo me curou.

Enquanto escrevo, elas estão aqui, deitadas no chão, cansadas da farra que há pouco fizeram no gramado. Tento descobrir qual delas foi a responsável pela enorme cratera no jardim. Levanto a voz, e apenas uma, Vlora, coloca o rabo entre as pernas e se afasta. Claro, a atitude suspeita denuncia o seu erro.

Abandonada numa rodovia, ainda filhote, Vlora foi recolhida por um amigo que, pela internet, se prontificou a ajudá-la. Minha filha, ao ver aquele rostinho carente na tela de seu computador, não teve dúvidas: correu para adotá-la.

Quando ela chegou em casa, apresentando-me sua nova cachorrinha, me assustei, principalmente após os veterinários constatarem o que eu já desconfiava: a filhote era uma mistura de vira-lata com pit-bull. Como grande parte da população desinformada, eu também tinha um preconceito em relação à raça e fui me inteirar sobre ela. Descobri feras terríveis, criadas a ferro e fogo, treinadas para atacar, ganhar concursos em rinhas e morrer em lutas absurdas e covardes. Mas descobri também cães de estimação, dóceis, brincalhões e carinhosos com as crianças, quando criados em ambientes saudáveis, plenos de cuidados e afeto. Li que vários trabalharam como cães de resgate no 11 de Setembro e que em todo o mundo colaboram com a polícia, ajudam na terapia com crianças, idosos e doentes em hospitais e abrigos. Assim como fez minha pit-lata ao deitar-se ao meu lado, numa madrugada febril.

Minha amiga diz que a Vlora, assim como a Pretinha, ganhou na loteria ao ir para minha casa, onde são praticamente “donas do pedaço”.

Ambas tiveram essa chance, mas muitos outros cães, infelizmente, não têm a mesma sorte de encontrar um bom lar, alimentando-se de ração e de carinho. E nem sempre é preciso ração, basta um pouco de atenção, para torná-los felizes. Como aquele vira-lata magricelo que, deitado na calçada com seu dono, um andarilho de roupas esfarrapadas, fez festa ao vê-lo acordando. O mendigo e seu vira-lata: uma cena que me deixou emocionada. Um cão, quando amado, é o ser mais grato e fiel que existe.

E foi pensando nos cães que não tiveram esses privilégios que eu e o cronista Fernando Fabbrini decidimos lançar o livro “Só de Bicho”.

A ideia inicialmente estava focada nos cães, mas decidimos estender a todos os bichos, sejam moluscos, anfíbios, aves, répteis, mamíferos, enfim, uma fauna inteira com histórias divertidas e comoventes, muitas delas verídicas. A renda do livro será destinada a entidades civis voluntárias protetoras dos animais de rua, que cuidam e promovem castrações, além de encaminhá-los para adoções. Entidades criadas por pessoas que verdadeiramente os respeitam.

À Cão Viver, Rock Bicho e Sociedade Protetora dos Animais de Betim destinaremos essa doação com muita satisfação. E para os leitores que quiserem nos ajudar a ajudá-las, o livro “Só de Bicho” estará disponível nas Drogarias Araújo, nas Livrarias Leitura e no pet shop Animalle – parceiros nessa empreitada.

Trata-se de um livro de crônicas divertido, em que estão reunidas dezenas de histórias já publicadas em jornais e sites, tendo como protagonistas os animais: engraçados, comoventes, malucos, simpáticos e, como diz Fabbrini, às vezes tão humanos como nós.

Quero agradecer a todos os amigos da Sempre Editora que se envolveram nesse projeto. Vocês foram fantásticos.

E, de antemão, agradecer aos leitores que puderem se juntar a nós, colaborando com essa causa. Os nossos amigos, cães e gatos de rua, agradecem.

PS: O livro “Só de Bicho” poderá ser adquirido pelo valor de R$ 30 nas Drogarias Araújo, nas Livrarias Leitura, no pet shop Animalle, nas lojas do Super Notícia e no setor de atendimento ao assinante, pelo telefone 2101-3838. E, claro, nas ONGs Cão Viver, Rock Bicho e Sociedade Protetora dos Animais de Betim.