LUIZ CABRAL INÁCIO

Olhos azuis nada inofensivos

Redação O Tempo

Por Da Redação
Publicado em 09 de outubro de 2014 | 03:00
 
 
Ilustração Acir Galvão

Existem atores que realmente vieram ao mundo para brilhar. Qualquer papel que eles façam é motivo pra parar, analisar, aplaudir, pois eles sempre vão se destacar. Protagonista de duas tramas conduzidas por misteriosos assassinatos em série, o ator Bruno Gagliasso está no ar na TV e no cinema em papéis sombrios que provam, mais uma vez, a sua versatilidade. Em “Isolados”, filme que está em cartaz nos cinemas, ele vive o estranho psiquiatra Lauro, que é cercado, junto com sua mulher Renata (Regiane Alves), por assassinos em uma casa no meio do mato. Já na TV, ele pode ser visto na pele de um serial killer no seriado “Dupla Identidade”, da Globo, produção assinada por Glória Perez.

Em ambos os casos, o suspense move a história. Assisti aos três primeiros episódios da série (no difícil horário de sexta-feira à noite, depois do “Globo Repórter”), e logo de cara percebi que o psicopata Edu foi feito para Gagliasso: muito mais que um rostinho bonito acima de qualquer suspeita, o bom moço esconde ser um frio assassino – o que o ator demonstra a cada olhar puro que se transforma em macabro. E poucos artistas da sua geração fariam tão bem esse louco – que sente o maior prazer em decidir a morte de suas vítimas – da forma como Gagliasso está fazendo. Nem mesmo o pedante rumo que Glória Perez sempre dá a suas tramas, puxando para o lado social, deixa cair o ritmo da série. Uma pena ser às sextas tão tarde. Um viva à internet, onde as reprises surgem sem muito alarde.

Já no filme “Isolados”, o protagonista Lauro surta, mas não é como o Edu. Ele surge como o mocinho, mas carrega um mistério maior, que não é liberado logo de cara. Eu, que nunca tinha visto um filme nacional de suspense, me surpreendi. A trilha pra causar medo à la brasileira é um pouco exagerada, mas funciona. Porém, a fotografia obscura da região serrana do Rio dá um tom fúnebre essencial. É feita uma homenagem a José Wilker, pois esse foi o último trabalho dele antes de sua morte, e Gagliasso realmente se coloca em cena como maioral.

E não é de se admirar que ele se sobressaia nesses papéis com tanta naturalidade: a carreira de Bruno Gagliasso é marcada por pesonagens polêmicos, densos, sempre intensos. Seu primeiro papel de destaque foi Rodrigo, em “Chiquititas” (2000), na sua lista de favoritas. Iniciou na Globo em “As Filhas da Mãe” (2001) como José, o filho de Regina Casé. Em “A Casa das Sete Mulheres” (2003) foi Caetano, um pequeno gaúcho republicano. O pontapé para o auge chegou em “Celebridade” (2003): viveu o problemático Inácio, e agarrou com firmeza aquela oportunidade. Mais um personagem ilimitado com o afetado Júnior, em “América” (2005). Teve beijo gay, mas a censura não deixou nem uma bitoquinha genérica. Ricardo apaixonou-se por uma mulher mais velha e casada em “Sinhá Moça” (2006), a Patrícia Pillar. O bad boy Ivan, de “Paraíso Tropical” (2007), só sabia confabular. O Eduardo, de “Ciranda de Pedra” (2008), só veio pra constar. Já o esquizofrênico Tarso, de “Caminho das Índias” (2009), foi daqueles inesquecíveis, feitos pra pompear. Como Berilo, em “Passione” (2010), terminou com duas mulheres, todo soberano. Como o louco vilão Timóteo, de “Cordel Encantado” (2011), teve o fim merecido de um perverso insano. O mocinho Franz de “Joia Rara” (2013) foi um presente. E, por fim, apareceu o Bruno, de “Dupla Identidade” (2014), esse psicopata prepotente, a pura imagem delinquente.

Tão novo, tão talentoso e com tantos papéis distintos e expressivos. Não se engane com esses olhos azuis inofensivos, eles sempre são transgressivos.