Luiz Tito

Luiz Tito escreve de segunda a sábado em O TEMPO

Fé demais

Publicado em: Ter, 08/01/19 - 02h00

O presidente Jair Bolsonaro, certamente alarmado pela escassez dos recursos que encontrou em caixa, identificou na operosa reforma da Previdência a porta de entrada pela qual entende necessário passar e assim reservar parte do Orçamento nacional para empreender uma marcante agenda de governo. Há apenas meia semana sentado na cadeira de presidente, ele e seu grupo começam a “descer do palanque” para preparar os caminhos a serem tomados com o entendimento de que não há espaços para errar.

Bolsonaro empalma o desejo de significativa parcela da sociedade, que tem demandas muito claras e urgentes, algumas difíceis de serem atendidas porque passam, primeiro, pelo crivo de um Orçamento sem gorduras, herdado de Michel Temer, e depois por um arcabouço legal fabricado para engessar o Estado e conservar privilégios, especialmente. Além disso, desde que confirmada sua eleição, esperam-se de Bolsonaro soluções que aos poucos vão deixando claro o que foi campanha eleitoral e o que é governar um país. Apenas como registro, os militares chamados para o grupo mais próximo do presidente têm demonstrado uma postura equilibrada e tendente à moderação. Sorte nossa.

O debate aberto por Bolsonaro sobre a Previdência Social e seu principal produto, a aposentadoria, até o momento apenas tangenciou a questão com a indicação de que a idade mínima para a concessão do benefício ao trabalhador privado deveria ser de 57 anos para as mulheres e 62 para os homens. Isso é apenas uma das mais leves faces do drama da Previdência, pelo que indicam as estatísticas. Já na década de 80, quando todos os estudos técnicos mostravam uma acelerada transição demográfica no país e, assim, alertava para o envelhecimento da população, era óbvia a consequente implosão do modelo previdenciário vigente. Pouco de concreto se fez.

Em resumo, se a propalada reforma não se aprofundar nem atacar principalmente a concessão da aposentadoria dos servidores públicos, em especial do Judiciário e do Legislativo, não há o que se fazer, porque não pode ser considerado republicano que a média dos benefícios pagos aos servidores do Poder Executivo seja, mensalmente, de R$ 9.100; do Legislativo, de R$ 28 mil; do Judiciário, de R$ 25 mil; e dos servidores do Ministério Público, de R$ 31 mil, contra a média de R$ 1.650 dos benefícios pagos aos trabalhadores privados. Ainda para serem considerados estão os critérios para cálculo dos benefícios dados aos militares das Três Armas e das polícias militares em todo o país, todos brindados com generosa contagem de tempo para suas aposentadorias, além dos privilégios que incorporam aos seus vencimentos. Palmas para o superministro Paulo Guedes, que denunciou frontalmente que as dificuldades para empreendermos tão prioritária reforma, de maneira justa e eficaz, estão em que os maiores afetados por eventuais cortes de benesses são os que legislam e os que julgam, exatamente aqueles que mais poderiam perder com a supressão de privilégios, muitos desses de franca imoralidade.

Com um Congresso excessivamente fragmentado, como será o que toma posse em fevereiro, guardadas as exceções, de duvidosa qualidade política e até moral, o que esperarmos? Como se ter fé em mudanças?

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