Marcio Coimbra

Márcio Coimbra escreve todas as quartas-feira em O TEMPO

Preço do negacionismo

Publicado em: Qua, 19/05/21 - 05h00

A pandemia já cobrou um preço muito alto da sociedade brasileira, em termos de vidas, mas também diante do desgaste brutal da economia. Os erros do governo foram fundamentais nessa equação, desde a negação do problema, passando pela aposta em tratamentos ineficazes, ausência de testagem em massa, crença na imunidade de rebanho e falta de uma política séria diante da compra de vacinas.

Em breve o Brasil atingirá o inimaginável número de meio milhão de mortos. Esse número não encontra paralelo em nossa história e certamente se tornará uma triste marca, com a qual teremos que conviver para sempre. Aquilo que causa maior repulsa é que estamos falando de um número que poderia ter sido evitado, por meio da imunização em massa ou mesmo pela realização de modelos de testagem eficazes que evitariam maior disseminação do vírus.

Nosso governo errou em todas as frentes, e se tornou impossível não responsabilizar Bolsonaro pelos equívocos na condução dos instrumentos de combate ao vírus. Negar e minimizar o problema transformou-se numa política que fez com que o número de vítimas escalasse de forma assustadora e desnecessária. Ao incentivar a população a seguir os mesmos dogmas, o governo agiu de forma irresponsável, deixando de defender aqueles que deveria proteger.

A testagem, realizada de forma estratégica, poderia ajudar a evitar a disseminação do vírus e manter a economia aberta, com as devidas cautelas, em determinadas áreas. Diante das dimensões continentais do Brasil, não teríamos outro caminho a seguir. Contudo, a opção foi negar a gravidade do vírus e deixar os testes estocados até que perdessem a sua validade. Uma atitude no mínimo irresponsável.

A aposta na cloroquina como tratamento precoce também cobrou seu preço, uma vez que Bolsonaro deixou de investir na compra de imunizantes e patrocinou, com dinheiro público e uso das forças militares, a produção, distribuição e incentivo do uso de um medicamento que, além de possuir efeitos colaterais perigosos, mostrou-se ineficaz para o tratamento da Covid-19. O apoio a um tratamento precoce, ineficaz e arriscado, está, inclusive, sendo alvo de investigação e pode vir a responsabilizar o Planalto.

Como se não fosse o bastante, Bolsonaro deixou de apostar na vacina como saída da crise. Ao contrário de Donald Trump, que também negou a gravidade da pandemia, mas comprou quantidades imensas de doses de imunizantes de todos os laboratórios que os desenvolviam, Bolsonaro se moveu em sentido oposto, refém de uma visão de mundo limitada e arcaica. Ao apostar somente em um laboratório, deixou um país com enorme capacidade de vacinação sem imunizantes para aplicar em sua população. Sem a atuação do governo de São Paulo, o país estaria completamente à deriva.

O preço do negacionismo de Bolsonaro custará caro. O país poderia, assim como os americanos, estar com a economia retomada e muitas vidas salvas. Refém de suas crenças, Bolsonaro fez o oposto e jogou o país na escuridão. Será preciso um esforço enorme para emergir deste fosso onde nos encontramos. Nosso povo merece mais do que isso.

 

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