Michele Borges da Costa

MICHELE BORGES escreve no Magazine às sextas-feiras. michele@otempo.com.br

Previsões para 2014

Publicado em: Sex, 10/01/14 - 02h00

São só dez dias, mas 2014 já se apresenta menos glorioso que previsível. Das listas de fim de ano, passando pelos endereços escolhidos para a virada ou dando uma passeada pelo noticiário, muito do mesmo. Não que seja de todo ruim.

Atire a primeira lentilha quem nunca reciclou as promessas para a próxima temporada. E quem nunca as abandonou antes de o Carnaval chegar. Faz todo o sentido querer parar de fumar, guardar dinheiro, emagrecer, começar uma atividade física, passar mais tempo com os amigos, ser mais organizado, beber menos ou dar um tempo do Facebook. E é muito compreensível que parte desses compromissos já tenha se dissolvido a essa altura. Sem sofrimento, já que eles podem voltar no próximo dezembro. Além disso, manter pendências também é uma forma de enfrentar o dia seguinte.

Sobre a virada, é assim desde a invenção do calendário, essa poderosa ferramenta de marketing. Meia-noite do dia 31 de dezembro é oficialmente a hora marcada para todo mundo ser feliz, levantar os braços para o brinde, desfilar mandingas e rituais... Não deixa de ser bonito ver milhares de pessoas em uma mesma vibe, acreditando com fé que o ano que se apresenta promete ser aquilo que se deseja. Corajoso é quem se recusa a entrar na onda.

Mas como estamos no hemisfério Sul, num país tropical, com verão quente e úmido – características que nem todo o aquecimento global conseguiu mudar –, chove e chove muito. Como no ano passado, e no anterior, e em toda a última década, e nos janeiros do século XX, cidades ficaram debaixo d'água, enchentes arrastaram o que encontraram pela frente, milhares de pessoas perderam suas casas, dezenas perderam a vida. As autoridades também voltaram a aparecer sobrevoando o cenário de lama e explicando que, outra vez, choveu mais que o previsto para o período. Quem, afinal de contas, faz essas previsões?

E mesmo ainda recém-nascido, o ano repetiu o que já deveria ser proibido por decreto celestial: crianças morrendo pela irresponsabilidade de alguns ou pela crueldade de outros.
Também não precisa ser vidente, meteorologista ou pesquisa de boca-de-urna para saber o que vem por aí.

Espectadores acanhados vão reclamar da baixaria no “BBB”. Foliões de sofá vão reclamar do resultado do Carnaval do Rio. Cientistas políticos vão reclamar da falta de inovação nas propostas dos candidatos. Compradores impulsivos vão reclamar das promoções da Black Friday.

Desconhecidos vão gritar juntos e dar abraços efusivos a cada gol do Neymar. Amigos de infância vão bater-boca e romper relações por conta de suas posições políticas. Desconhecidos e amigos vão mudar de opinião sobre as manifestações várias vezes ao dia.

Em 2014, é certo que os cientistas estarão mais perto da cura do câncer, mas ainda assim mais de 7 milhões de pessoas morrerão derrotadas pela doença. É certo que Belo Horizonte ganhará uma nova maneira de ir de um lugar para o outro, mas ainda assim quem vive aqui perderá uma parte boa da vida preso no trânsito. É certo que meia dúzia de atrações internacionais vai fazer shows inesquecíveis no nosso quintal, mas ainda assim outras duas dúzias vão passar do Rio direto para Porto Alegre.

Não importa o que acontecer nos próximos 355 dias, para mim será o ano da saudade, de nunca mais o abraço, do “benzinho” sem resposta. Quando 2014 morrer, um pedaço de mim terá morrido também.

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