Murillo de Aragao

O passado cobra uma conta que compromete nosso futuro

Publicado em: Qua, 24/05/17 - 03h00

No momento em que o Brasil ensaiava sair da pior recessão de sua história, ainda recuperando-se do mais trágico e incompetente governo que já passou por Brasília, explode o escândalo das gravações do empresário Joesley Batista, do grupo JBS.
Tudo, do começo ao fim, é uma opereta para deixar o presidente da República ao alcance de um diálogo claramente armado para incriminá-lo. A insistência de Joesley em vê-lo deveria indicar alguma espécie de problema.
Tudo indica que o generoso acordo de delação premiada feito entre a Procuradoria Geral da República e Joesley Batista tenha embutido a entrega da cabeça do presidente Michel Temer, a partir de uma operação pré-combinada. Uma espécie de teste de fidelidade do João Kleber.
Adiante, aparece a história de uma propina de R$ 480 milhões a ser paga em 20 anos. Quem, em sã consciência, acredita que, em tempos de operação Lava Jato, possa existir uma situação que gere uma propina tão volumosa e de tão longo prazo?
Outro ponto crítico é o papel de Rodrigo Santos da Rocha Loures. Teria ele feito o que fez a mando de alguém? Por que teria recebido o dinheiro? A que pretexto? Como, a esta altura dos acontecimentos, alguém se expõe tanto?
Não deixa de ser patético Rodrigo Loures correndo com uma mala e jogando-a no porta-malas de um carro, olhando para os lados e entrando num táxi. Nada mais bandeiroso. Tanto quanto os policiais deixarem o carro ir embora sem conseguir segui-lo. Pareciam Fucker e Sucker, policiais do “Casseta & Planeta”.
A divulgação pela imprensa de que Temer teria concordado com o pagamento de mesada ao ex-deputado Eduardo Cunha, hoje preso, também foi claramente manipuladora. Apesar de o diálogo – como um todo – ser trágico, não houve concordância com o pagamento de mesada. Ao insinuar que controlava procurador e juízes, Joesley deveria ter sido repreendido de pronto pelo presidente, e a afirmação ser alvo de investigação posterior.
O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, também teve parcela significativa nessa trágica comédia de erros. Deveria ter tido cautela, tratando-se de um presidente da República. Parece que ele e o procurador geral da República, Rodrigo Janot, queriam marcar logo uma posição sobre o tema sem sequer tomar o cuidado de investigar a veracidade das gravações de Joesley.
O vazamento da informação, mais um entre uma dezena no âmbito dos escândalos recentes, deveria provocar uma megainvestigação séria que a PGR não parece querer empreender. A midiatização da Justiça, e o vazamento é um de seus instrumentos, faz parte da comédia de erros.
Assim como o presidente deve ser investigado, caberia uma investigação profunda do comportamento da Justiça. Inclusive em relação ao generoso acordo de delação com os irmãos Batista. Será que o Conselho Nacional de Justiça tem coragem? Quem paga o pato pelos erros de todos os envolvidos é o povo brasileiro.
As tão necessárias reformas ficarão adormecidas? Provavelmente, sim. Em um imenso “esforço de reportagem”, a reforma trabalhista poderá avançar. Já a da Previdência deve ficar paralisada. O ideal seria o Congresso prosseguir debatendo-as e aprovando-as. Mas com certeza o que já era difícil poderá ficar impossível.
Para o presidente, o atual mandato foi uma tragédia. Recessão, corrupção, impeachment e escândalos. Foi o passado cobrando uma conta alta por nossa omissão diante da política na hora de escolher os políticos que comandam nossos destinos. Uma conta que atrapalha nosso futuro.

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