OTÁVIO GROSSI

O pai, o papel e a função

'O meu convite a você, leitor e leitora, é para que neste Dia dos Pais repense e elabore, como eu fiz, o papel de pai. Função é um conceito frio'

Por Da Redação
Publicado em 08 de agosto de 2022 | 03:00
 
 

Com a proximidade do Dia dos Pais, vejo sempre meu pensamento ser recrutado aos sentimentos e emoções da minha história na relação com meu pai. Ele já se foi deste mundo. Uma ida prematura, considerando sua idade, disposição e biótipo corporal. Teve um infarto fulminante e partiu. Nos últimos dias tivemos fortes exemplos dessa estatística difícil de mortes prematuras por questões cardíacas. O filho do empresário Abílio Diniz foi mais um nesses números, e me solidarizo com a família! Muito ainda precisamos aprender e socializar informações no campo da prevenção a esses adoecimentos. 
 
Mas, voltando ao meu pai, ele foi embora como sempre viveu: sem espaço a conversas ou momentos de desculpas mútuas. Não tínhamos muitos momentos de diálogo ou negociação. Vivíamos, lembro-me, sempre em suspenso com suas atitudes e rompantes emocionais. De uma hora para outra, ele poderia ficar nervoso; e, se fosse contrariado ou se as ocorrências do dia a dia fossem diferentes de suas ideias e concepções, pronto, a confusão estava armada!
 
Apesar de viver negociando – usava isso na profissão como vendedor de automóveis –, dentro de casa, essa competência não era o seu forte. Uma das frases que mais ouvi dele foi: “Cala a boca, que quem manda aqui sou eu!” 
O meu convite a você, leitor e leitora, é para que neste Dia dos Pais repense e elabore, como eu fiz, o papel de pai. Função é um conceito frio. Como se fossem obrigações orgânicas, genéticas e jurídicas que a paternidade elucida. Mas o papel solicita outros vínculos. Faz virem à tona comportamentos que nascem de relações interpessoais.
 
Muitas pessoas poderão ocupar esse papel de pai em nossas vidas. O pai que educa, que protege, que respeita, que orienta, que é gente também, que erra e também acerta. O pai da psicanálise, Freud, nos fazia pensar dizendo que “a maturidade é um retorno à casa paterna”. Nosso retorno e reencontro com nossos imaginários, culpas, medos, alegrias, papéis de poder e lugares equivocados de sacralidade vão ganhar um contorno de evolução quando contextualizarmos tudo o que nos aconteceu, a partir dos papéis e funções. A meu ver, quando fazemos essa ponte de compreensão da importância dessas pessoas em nossas vidas, tudo muda e ficamos em paz. Veremos além dos seus limites e esquisitices!  
 
Hoje, já mais vivido, consigo contextualizar o comportamento de meu pai e compreender o resultado da nossa interação. Ele, me mandando calar a boca, errando, no fundo acabou acertando, aprendi a arte da escuta e do silêncio com a qual hoje trabalho e construo minha carreira como terapeuta de pais e crianças. Os gestos de afeto foram raros, mas nem por isso lembro-me dele com raiva ou tristeza. Hoje sei do aprendizado necessário, acredito no sentido das interações entre todos os seres humanos e compreendo a função e o papel de pai. Desejo-lhe, que ganho chegar o dia deles, possamos nos reconectar ao papel do pai em nossas vidas e caminhar apesar do que nos aconteceu e que sejamos pais de tantos outros! Boas escolhas.
 
*Otávio Grossi, é filosofo, mestre em psicologia, graduando em psicologia, psicopedagogo de autistas. Mentor de empresários e atletas. Autor de “ Conquistas autenticas” e co-autor de “Sobre rodas”, das Edições Candido- RJ. É colunista fixo do jornal O Tempo e especialista do programa Interessa, nas segundas-feiras, na rádio Super FM.