PAULA PIMENTA

Saudade

Redação O Tempo

Por Da Redação
Publicado em 06 de junho de 2015 | 03:00
 
 
pico

“A saudade é o sentimento mais sincero, pois só se manifesta quando pensamos em pessoas, coisas ou lugares que amamos”.

Essa frase veio em um cartão que recebi anos atrás, na época da minha adolescência, quando eu estava fazendo intercâmbio nos Estados Unidos. Até hoje, ela me vem à cabeça, mas lembro que, certa vez, eu a mencionei a um amigo, e ele discordou, dizendo que também era possível sentir saudade de coisas ruins. Depois de pensar um pouco, cheguei à conclusão de que talvez ele tivesse razão, pois nesse mesmo intercâmbio a minha saudade era tanta que eu sentia falta até das brigas com o meu irmão e dos professores mais chatos do colégio. Mas, no fundo, sei que eu gostava era do que vinha por trás disso: a reconciliação fraterna e os colegas que compartilhavam aquelas aulas chatas comigo.

Duvido que alguém sinta saudade de algo realmente ruim. Saudade é aquela vontade de reviver um momento marcante, de rever aquela pessoa querida, de voltar a algum lugar onde fomos felizes, de sentir um cheiro que remeta a algo ou alguém, de comer certa comida... Interessante é que podemos tentar matar a saudade, mas pode ser que ela não queira ser excluída. Podemos voltar ao mesmo lugar, mas é difícil não ficarmos comparando com a outra vez e reparando as diferenças. Se as lembranças realmente forem muitas, podemos nem curtir o momento, e a nova viagem acabar se tornando uma mera tentativa de reviver o passado. Porque, no fundo, o que queríamos não era voltar no lugar, e sim no tempo.

Por esse motivo, tenho até um pouco de receio de visitar certos locais onde eu tenha sido muito feliz. É como se os novos acontecimentos pudessem substituir aquela imagem perfeita que eu tinha do lugar. Claro, a nova viagem pode ser ainda melhor... Mas, e se não for? Provavelmente macularia a minha memória, pois geralmente a última lembrança é a que fica.

Quanto melhor a situação, mais forte é a saudade. Interessante é que ela se manifesta igualmente por pessoas, lugares ou acontecimentos. Faça um teste: tente se lembrar de um lugar onde você gostaria de estar o tempo todo, mas que você não visita há séculos... Não dá vontade de pegar o primeiro avião/trem/ônibus/carro e ir pra lá neste minuto? Agora, pense naquele acontecimento feliz, que marcou sua vida. O que você não daria para revivê-lo, para poder sentir aquela emoção novamente? Por último, pense em alguém que, entre todas as outras pessoas do mundo, você gostaria que estivesse ao seu lado neste momento. Mesmo que tenha encontrado essa pessoa há poucas horas, basta começar a pensar nela que a vontade de estar perto aparece, não é? Lugares, acontecimentos, pessoas. Três tipos de saudades distintas, mas com os mesmos sintomas: o pensamento longe, aquele aperto no peito e a vontade de ter uma máquina do tempo à disposição no quintal de casa...

Como eu disse antes, acho bem difícil sentir saudade de coisas ruins. Da minha parte, prefiro guardar esse sentimento para quem (ou pelo que) me fez bem algum dia e, com isso, reviver aquela felicidade, pelo menos na memória. Pode ser dolorido, mas é uma angústia doce, suave, um sentimento puro que deixa a certeza de que em algum lugar perdido no passado, algo trouxe felicidade suficiente para continuar vivendo na lembrança, mesmo tempos depois...

Agora, ao ler a frase do início, me vem novamente aquele intercâmbio que fiz aos 17 anos. Na ocasião, eu achava que não suportaria toda aquela falta que sentia do Brasil. Mas, hoje, vejo que passou muito rápido, que eu poderia ter aproveitado bem mais e que a saudade acentua os outros sentimentos, nos deixando mais sensíveis. Neste momento, a situação se inverteu. Sinto saudade do intercâmbio, das cartas, dos meus amigos da época, e, especialmente, de toda aquela saudade que eu sentia...