PAULO DINIZ

Carreira solo

Pode soar estranho, mas escrever sobre Nikolas Ferreira em uma coluna que trata de política é tarefa difícil

Por Paulo Diniz
Publicado em 26 de março de 2024 | 06:00
 
 

Pode soar estranho, mas escrever sobre Nikolas Ferreira em uma coluna que trata de política é tarefa difícil. Não deveria ser, pois além de Nikolas ser um político, ele vem acumulando vitórias significativas em sua curta carreira: a mais recente foi a conquista da presidência da Comissão de Educação da Câmara dos Deputados, uma das mais importantes. Trata-se de um feito impensável para qualquer deputado novato, em segundo ano de mandato. Isso, para não mencionar a votação estratosférica obtida por ele em 2022, a maior da história nacional, responsável por fazer de Nikolas uma estrela.

Porém, apesar de ser um político, Nikolas Ferreira não faz política. Essa função se caracteriza minimamente pela articulação, negociação, formação de consensos – enfim, atividades que só são possíveis quando há disposição para conversar com os opostos e ceder a esses em alguns itens.

Esse conceito de política, mesmo genérico, está bem distante do que Nikolas Ferreira já mostrou em suas performances no Legislativo federal. Assim, concluir que Nikolas é um político que não faz política não é algo revolucionário. A pergunta que mais merece ser feita, portanto, é relativa aos reais interesses que os demais políticos – aqueles que fazem política – podem ter em relação a esse jovem deputado tão dedicado à própria carreira solo.

Toda a atuação de Nikolas está voltada para a promoção do próprio nome e imagem – não que outros deputados não tentem se tornar mais conhecidos, mas ocorre que é mais comum que o façam por meio da promoção de pautas específicas.

O trabalho de Nikolas, por sua vez, é estéril. Levanta temas para seus discursos, discorre sobre a ameaça que o assunto do dia representaria para as famílias e conclui, deixando apenas si mesmo no olho do redemoinho que ele mesmo atiçou. Sempre com esse mesmo final, Nikolas não reduz o problema a uma questão específica – como uma votação na Câmara, por exemplo –, deixando sempre a discussão suspensa no campo das ideias. A única solução viável é, portanto, o próprio Nikolas Ferreira.

Há pouco que um político tradicional possa ganhar se aliando a alguém como Nikolas Ferreira. Porém, se a parceria não é viável, a coordenação pode ser. O perfil agressivo de Nikolas Ferreira traz desgaste constante à base de apoio governista, de forma que, quanto mais importante o palco no qual ele for colocado, mais dano pode causar.

Episódios recentes indicam que Nikolas coloca o próprio mandato em segundo plano quando quer lançar seus ataques mais radicais – o que se ilustra pelo infame discurso que fez na Câmara usando uma peruca loura.

Aliar-se a quem parece não ter nada a perder pode ser uma excelente opção para quem, tendo muito a perder, ainda assim deseja enfrentar o governo como se não houvesse amanhã. Dessa forma, a ascensão de Nikolas Ferreira nos quadros da direita pode significar exatamente o oposto do sucesso: seus colegas podem estar apenas fornecendo meios para que se faça mais um mártir, tão dramático e útil quanto Bolsonaro.