PAULO DINIZ

Um candidato em construção como clone de Donald Trump

A lógica que explica boa parte do sucesso de Jair Bolsonaro

Por Da Redação
Publicado em 20 de fevereiro de 2018 | 03:00
 
 
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Stephen Bannon, o controverso assessor político de Donald Trump, gerou alívio na Casa Branca ao ser demitido em agosto último. Mesmo entre os radicais de direita que acompanham o presidente dos Estados Unidos, Bannon causava mal-estar constante pelas táticas que usa para conquistar e manter o poder: nessa lógica, o ódio coletivo condensado em palavras de ordem tem muito mais poder sobre o eleitorado do que as propostas técnicas dos planos de governo. Na campanha de Trump, a tática de combinar medo e xenofobia com gritos pela construção de um muro na fronteira com o México gerou a mobilização de milhões de pessoas, coisa que as discussões sóbrias de Hillary Clinton sobre imigração não chegaram perto de conseguir.

A lógica destrutiva de Bannon pode explicar boa parte do sucesso que colhe até agora o pré-candidato a presidente da República Jair Bolsonaro. Seus slogans são simplistas e também dão vazão a uma carga de ódio acumulada: armar os cidadãos e aumentar drasticamente as punições criminais, por exemplo, não constam como políticas de segurança pública, mas tocam em cheio no medo da criminalidade que aflige os brasileiros.

Porém, existe um consenso de que Bolsonaro não será capaz de se eleger com base apenas na manipulação do medo da população. Aparentemente, o próprio Bolsonaro concorda com essa avaliação: em sua recente incursão por meios de comunicação, o ex-militar tem mostrado um perfil diferente do que vinha adotando até aqui, e esse deve ser um sinal de preocupação para seus futuros adversários.

É claro que ainda há temas sobre os quais o pré-candidato indica pouco conhecimento, mas é evidente que, em outras áreas, o aconselhamento que recebe vem mostrando resultado. Por exemplo, o discurso contrário à minoria LGBT agora foi substituído por um alegado respeito à forma como “os adultos” escolhem viver suas vidas. Essa condicionante etária serve para introduzir o novo alvo de Bolsonaro: a defesa das crianças contra a influência desvirtuante da chamada “ideologia de gênero”, presente em muitas escolas. Assim, o tema da sexualidade permanece em pauta, atiçando o rancor coletivo contra as diferenças, porém não se pode mais imputar a Bolsonaro a discriminação propriamente dita.

Outro ponto no qual Bolsonaro mostrou mudança foi em relação à economia: substituiu o nacionalismo estatista que vinha defendendo até há pouco por um liberalismo raso que elegeu as estatais como vilãs do país. Para além de defender privatizações, Bolsonaro não arrisca outro palpite senão fazer referência a Paulo Guedes, economista que atua como seu conselheiro. Mesmo ainda longe de concluir seu curso particular de economia, o aluno Bolsonaro já mostra alguns lampejos da sabedoria recém-adquirida: propôs a descentralização para as prefeituras dos recursos da habitação, historicamente concentrados no governo federal.

A relação com o Legislativo, por sua vez, é uma das áreas ainda frágeis no discurso de propostas que Bolsonaro busca construir: considera que o eleitor brasileiro vai renovar profundamente o Congresso e, portanto, em um eventual governo seu, Bolsonaro obteria com facilidade apoio legislativo para as propostas que fizesse. Essa conjunção de hipóteses pouco prováveis, com a qual Bolsonaro conta para governar, indica o quão vulnerável ainda é o pré-candidato em seu raciocínio político.

Construindo-se como candidato diante de todos, Bolsonaro indica que será mais do que um clone tropical de Donald Trump.