Paulo Paiva

Professor associado da Fundação Dom Cabral, Paulo Paiva escreve às sextas-feiras

Tirania do imediatismo

Publicado em: Sex, 18/09/20 - 03h00

O dias são difíceis. Estão amargos. Os sonhos de milhões de pessoas acabaram. Coronavírus, desemprego e negócios fechados conspiram para transformar o dia a dia em pesadelo. Corrupção, nesse momento até com a saúde pública, violência e desrespeito ao próximo configuram um tempo sombrio, individualista, sem solidariedade. E o futuro? Só incertezas. Um estado de angústia e um senso de urgência consomem jovens e adultos, homens e mulheres. As redes sociais são os veículos a disseminar tantas informações, reais ou mentirosas. Poucos são os que conseguem distingui-las, assimilá-las, avaliá-las e aprofundá-las. É um estado de total tirania do imediatismo estimulado pelo ímpeto do poder, financeiro ou político. 

Já há muito tempo, o poder financeiro, cuja obsessão pode ser identificada no comportamento do mercado, impõe seus interesses e influencia as decisões de políticas macroeconômicas. Tornou-se comum a prevalência dos resultados imediatos sobre decisões que visariam a soluções duradouras. Até a poupança doméstica foi capturada pela tirania do “curto-prazismo”. 

Uma hora, o mercado exige a ausência do Estado, a desregulação, justificando sua visão imediatista na liberdade individual. Em outra, na crise, reclama a ação do Estado para fornecer crédito e prestar socorro à manutenção da liquidez. Sua voz surda é reconhecida nas variações implacáveis das bolsas de valores e das taxas de câmbio e de juros.

Nos tempos recentes, o político desconhece que um dos pilares da democracia é a alternância dos governantes. O objetivo único dos eleitos é sua permanência no poder a qualquer custo. Não se preocupam com soluções para os problemas estruturais que emperram o desenvolvimento e estimulam a desigualdade nem com o bem-estar da população; portanto, não elaboram e executam planos e estratégias de crescimento. 

Presidente eleito, presidente em campanha. O interesse individual do político se sobrepõe aos interesses coletivos. Em consequência, as decisões de seu governo estão subordinadas ao seu objetivo imediato. 

São inúmeros os exemplos da tirania do imediatismo político nos anos recentes. Não só do governo atual. Aliás, em muitos casos, o comportamento do governo Bolsonaro não se diferencia do governo petista. Ambos subordinaram a gestão a seus interesses particulares. As escolhas são feitas com os olhos nas redes sociais e nos índices de popularidade. É a defesa do corporativismo, sempre. Antes e agora. Pode-se até mudar algum grupo protegido, mas o critério é o mesmo. Mantém o Estado inchado e ineficiente. Não aprofundam as privatizações e as concessões de serviços públicos. Enfim, não administram. 

Na retórica também são iguais. Como se o mundo tivesse começado com eles, transferem as culpas do que não quiseram fazer para as gestões anteriores. 

E do povo? Ah, do povo, querem somente os votos.

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