PAULO HADDAD

A extraordinária complacência com as desigualdades e o desemprego

O tempo é de mobilização para grandes transformações

Por Da Redação
Publicado em 31 de agosto de 2018 | 03:00
 
 

No limiar do processo eleitoral de 2018, pode-se observar que os dois problemas estruturais mais graves da sociedade brasileira são, atualmente, as elevadas taxas de desemprego e a crescente concentração da renda e da riqueza. A taxa de subutilização da força de trabalho, que inclui, além dos desempregados, os subempregados e aqueles que desistiram de procurar emprego, atingiu, nos primeiros meses de 2018, um contingente de quase 28 milhões de brasileiros, segundo o IBGE.

Além da desorganização que as diferentes formas de desemprego e subemprego provocam nas condições de vida das famílias, há muitas outras mazelas que levam à perda da autoestima dos que trabalham, à necessidade de aceitar trabalho aquém da qualificação profissional, ao retorno de famílias recém-constituídas para a casa dos pais, à frustração de se postergarem os projetos de vida etc.

É falacioso explicar a enorme dimensão dos desempregados e subempregados pelo desequilíbrio entre a demanda pelas novas especializações da mão de obra e a disponibilidade de trabalhadores inadaptáveis nos mercados. Esse problema existe, mas o desemprego generalizado atinge qualificados e não qualificados e, principalmente, desalentados, que se tornam não empregáveis na longa espera por um emprego. A questão é mais grave para nossos jovens, cuja taxa de desemprego é o dobro da taxa média da economia, tornando-os propensos à ansiedade, ao estresse emocional e à depressão psicológica.

Quanto à concentração da renda e da riqueza no Brasil, estudos liderados por Thomas Piketty mostram que o 1% mais rico de nossa população detém quase 30% da renda dos brasileiros, a maior concentração de renda do mundo. Os seis brasileiros mais ricos concentram, juntos, a mesma renda que os 100 milhões de brasileiros mais pobres, segundo estudos da Oxfam. Uma concentração de renda que, sem dúvida, tem se acentuado com a política de austeridade fiscal, a qual, desde 2014, segundo o Banco Mundial, gerou adicionalmente à história da pobreza no Brasil quase 5 milhões de pobres, além de 3 milhões de miseráveis.

Pois bem, nesse contexto de empobrecimento da classe média, de reversão da mobilidade social e de insatisfação e desalento dos desempregados, era de se esperar que os grupos sociais politicamente mais conscientizados pressionassem os candidatos à Presidência da República a se comprometer efetivamente com políticas e programas de geração de emprego e de combate à pobreza e à concentração da renda e da riqueza. Políticas e programas consistentes e críveis que não se limitem à comunicação social de peças publicitárias e de diretrizes genéricas e que não desconheçam os desacertos das experiências passadas.

É possível afirmar que a população brasileira está complacente e conformista com o status quo da realidade socioeconômica do país? Pode ser que sim, para os que vivem em regiões onde o crescimento econômico ainda está dinâmico (áreas cuja base produtiva é o agronegócio, por exemplo) ou os que continuam a acumular riqueza financeira em pleno processo recessivo.

Mas, para a grande massa de brasileiros que está a perder renda e emprego, imersa nas incertezas e tensões do cotidiano, e que está vendo sua vida se desestruturar rápida e inesperadamente, o tempo é de mobilização para grandes transformações socioeconômicas e político-institucionais. Pode ser que esteja, em seu horizonte não muito distante, um ponto de inflexão de mudanças abruptas e descontínuas visando construir um país mais justo, mais desenvolvido, mais sustentável e menos corrompido administrativamente.