PAULO HADDAD

Ao mesmo tempo: crise social e ambiental em nossa casa comum

O risco de se fazer mais do mesmo ou pior no próximo mandato

Por Da Redação
Publicado em 27 de abril de 2018 | 03:00
 
 
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Com o início do processo eleitoral para o novo mandato de presidente da República, os candidatos já começaram a apresentar suas propostas de governo. O que se tem visto até agora são inúmeras entrevistas que, de certa forma, pretendem aperfeiçoar, avançar e tornar mais eficaz o que o governo Temer não está conseguindo realizar: o equilíbrio fiscal, associado a um conjunto de reformas econômicas e político-institucionais (previdenciária, tributária, política e administrativa).

Se for apenas assim, é grande o risco de se fazer mais do mesmo ou ainda pior no próximo mandato presidencial. Afinal, o Brasil já acumulou um grande número de políticas econômicas malsucedidas, as quais prenunciam as benesses de um processo de desenvolvimento sustentável que acaba nunca acontecendo, na síndrome de “tudo bem no ano que vem”.

Na verdade, está mais do que na hora de lideranças e partidos políticos enfrentarem os problemas estruturais de nossa economia, incorporando as aspirações do povo brasileiro numa agenda de grandes transformações, confrontando velhos dilemas com ideias renovadas.

Um dos documentos que contêm e provisionam um programa que pode sintetizar uma agenda de grande transformação do Brasil é a encíclica “Laudato Si”, do papa Francisco, divulgada em junho de 2015. Conhecida como “O Cuidado da Casa Comum”, foi construída com a colaboração de mais de cem dos mais destacados cientistas do mundo. Em seus diferentes capítulos, funciona como uma lanterna de popa para novas trajetórias de desenvolvimento da humanidade.

A encíclica defende uma ecologia integral, uma vez que o ambiente humano e o ambiente natural se deterioram conjuntamente. Não estamos diante de duas crises separadas, uma ambiental e outra social, mas de uma crise que é, ao mesmo tempo, social e ambiental. “Estratégias para uma solução demandam uma abordagem integrada para combater a pobreza, restaurar a dignidade dos excluídos e, ao mesmo tempo, proteger a natureza”.

Pode-se observar essa tese central da encíclica no caso da formação histórica das áreas economicamente deprimidas. São regiões que incluem quase 2.000 dos cerca de 5.600 municípios brasileiros, caracterizando-se pelos altos índices de pobreza e de miséria de sua população, pelas elevadas taxas de desemprego e de subemprego, pela precária infraestrutura econômica e social. Essas áreas se localizam, principalmente, no Sertão e no Agreste do Nordeste brasileiro, nos vales do Jequitinhonha e do Mucuri, no Norte de Minas e nas regiões desmatadas da Amazônia. Sua população (quase 60% das famílias) vive de mesadas das políticas sociais compensatórias, e suas prefeituras, de transferências fiscais (mais de 70% da receita total) do governo federal.

O que há de comum entre essas áreas? O fato de terem historicamente usado de forma predatória ou não sustentável sua base de recursos naturais renováveis e não renováveis, por meio do extrativismo vegetal e mineral. A degradação dos ativos e serviços ambientais em uma região no presente significa uma população socialmente empobrecida e carente no futuro.

Assim, enquanto se cuida de políticas de estabilização para evitar a insolvência financeira do país, é preciso, simultaneamente, ter consciência de que “uma abordagem ecológica deve sempre se tornar uma abordagem social, deve integrar justiça social nos debates sobre meio ambiente, de tal forma a ouvir ambos o grito da terra e o grito dos pobres”.