PAULO HADDAD

Investimentos imaginários

O que determina a decisão dos investimentos privados é o grau de incertezas e de expectativas que prevalecem na economia. E a economia brasileira apresenta uma sobrecarga de incertezas

Por Da Redação
Publicado em 13 de agosto de 2020 | 03:00
 
 

O Brasil precisa voltar a crescer. Se, nos próximos meses, o governo federal não dispuser de uma estratégia robusta para a retomada do crescimento, iremos assistir às mazelas sociais e às políticas típicas da transição de uma recessão para uma depressão econômica. Não se pode subestimar o poder do ciclo da pandemia de desestruturar profundamente a capacidade produtiva do país e os níveis de renda e de emprego. Esperar tão somente o avanço das reformas político-institucionais para que as forças de mercado promovam o crescimento é agir como Cristóvão Colombo, que, como disse um deputado inglês, quando partiu não sabia para onde ia, quando chegou não sabia onde estava e o tempo todo foi pago pelo Erário da Espanha.

Num primeiro momento, a retomada do crescimento poderá ocorrer através da mobilização dos recursos ociosos da economia: trabalhadores desempregados ou subempregados, máquinas e equipamentos subutilizados e infraestrutura descongestionada. Nesse contexto, a estratégia de retomada deve acionar instrumentos e mecanismos que promovam a expansão da demanda agregada do consumo ou dos investimentos privados. Num segundo momento, investimentos diretamente produtivos ou de infraestrutura econômica e social são imprescindíveis.

O investimento tem uma dupla face: de um lado, é um componente muito importante da demanda agregada com os seus efeitos multiplicadores e, do outro lado, determina o crescimento da capacidade produtiva do país. Mas, como o investimento é uma decisão orientada para o futuro, é preciso lembrar que ele tem aspectos de irreversibilidade (diferentemente de uma aplicação financeira) e, portanto, opera num contexto de extrema volatilidade. Numa visão mecanicista, o investimento surge tão somente em função do crescimento previsto da demanda e do esgotamento da capacidade produtiva ociosa.

Na verdade, o que determina a decisão dos investimentos privados é o grau de incertezas e de expectativas que prevalecem na economia. E a economia brasileira apresenta, atualmente, uma sobrecarga de incertezas que vão desde o futuro do equilíbrio fiscal nos próximos dois anos até a reação dos capitais externos ao desmonte das políticas ambientais no Brasil. Quando o futuro é incerto, o imperativo de mercado leva os empresários a escolher entre os retornos de se investir hoje e a possibilidade de se poder tomar uma decisão mais informada e menos incerta no futuro. O resto é imaginação de tecnocratas.

Enquanto isto, os auxílios financeiros de emergência às famílias e os empréstimos em condições favorecidas às micro e pequenas empresas têm evitado uma crise econômica mais profunda e um colapso social mais dramático. Mas empresários preferem demanda de mercado, e os desalentados preferem emprego e renda do trabalho, e não políticas assistencialistas, as quais, se perdurarem por muito tempo, podem vir a constituir humilhação e desrespeito ao povo brasileiro.

O grande desafio da política econômica, nos próximos meses, é desenvolver uma estratégia de transição que mantenha os auxílios emergenciais em nível socialmente realista e justo, enquanto os mercados de trabalho voltam a absorver trabalhadores formais e informais. Uma tarefa que parece ser impossível para um governo que se guia pela agenda ideológica, e não pela gestão competente da coisa pública.