PAULO HADDAD

O planejamento para negociação

No atual contexto político-institucional, em quase todos os Estados, os governadores não controlam os instrumentos fiscais, financeiros e regulatórios para promover o desenvolvimento socioeconômico

Por Da Redação
Publicado em 08 de agosto de 2019 | 03:00
 
 

O que fazer com o planejamento nos Estados quando as finanças públicas estão em crise e não há recursos fiscais nem mesmo para as despesas correntes de pagamento de funcionários e do custeio da máquina administrativa?

Historicamente, observa-se que, a partir dos anos 1980, os governos estaduais começaram a abandonar o estilo de planejamento clássico e caminharam em direção ao estilo de planejamento para a negociação. É princípio básico para a factibilidade do estilo de planejamento clássico que o número de objetivos e metas fixados deva ser pelo menos igual ao número de instrumentos que o poder público controla. Ou seja, o governo não pode estabelecer mais metas do que o número de instrumentos de política econômica de que dispõe.

No atual contexto político-institucional, em quase todos os Estados, os governadores não controlam os instrumentos fiscais, financeiros e regulatórios para promover o desenvolvimento socioeconômico e socioambiental por meio de programas e projetos, com exceção das poucas unidades da Federação com maior superávit fiscal, como é o caso principalmente de São Paulo.

A principal explicação para a emergência do planejamento para a negociação, ocorrida desde 1964, foi o esvaziamento, pelo poder central, dos instrumentos de política econômica de que os Estados podiam lançar mão para atingir determinados objetivos de desenvolvimento econômico e social. O planejamento passou, então, a ser compreendido como o desenvolvimento máximo da capacidade latente de negociação dos Estados, onde se tornava dominante a disputa por recursos de fundos e programas definidos exogenamente pelas agências nacionais e internacionais de planejamento e de fomento.

Desde o final dos anos 1980, com o avanço da redemocratização do país e a ampliação das eleições diretas para todos os níveis de governo, novas funções de planejamento foram se acoplando às administrações estaduais, destacando-se as funções de reprogramação endógena, de compensação e de ativação social. A estratégia de reprogramação endógena visa a reorientar a alocação dos recursos da administração direta e indireta sob o controle do poder público estadual para atender as mudanças em sua agenda de desenvolvimento (ver, por exemplo, as experiências de choque de gestão). A estratégia de políticas compensatórias procura analisar os efeitos das políticas macroeconômicas e setoriais do governo federal sobre economias estaduais específicas, por meio da discriminação espacial de sua operação ou da obtenção de ações compensatórias (ver, por exemplo, a atual disputa pelo ressarcimento dos recursos fiscais da Lei Kandir). E, finalmente, a estratégia de ativação social que procura mobilizar recursos latentes nas economias estaduais até então não mobilizados em virtude do padrão de organização política do processo de crescimento econômico adotado (ver experiências de desenvolvimento endógeno e de planejamento participativo).

No estilo de planejamento para negociação, é indispensável que seja elaborado um conjunto de programas e projetos para fins de captação e atração de recursos em instituições públicas e privadas, nacionais e internacionais. Afinal, essas instituições não financiam ideias, mas sim programas e projetos.