Raimundo Couto

Jornalista especializado no setor automotivo, escreve às quartas-feiras no caderno Veículos

As voltas que o mundo dá (fim)

Publicado em: Qua, 07/02/18 - 02h00

E, finalmente, havia chegado o grande momento. Por alguns segundos, senti uma adrenalina que é difícil de ser comparada a qualquer outra situação assim. Ainda teria uma surpresa, uma volta em um cockpit duplo com Nicolas Prost, filho do tetracampeão Alan Prost, guiando a “milhão” pelas curvas de Paul Ricard. Vamos nessa?

Findo o tempo dos colegas “roda dura”, descemos para o pit lane. Escutei uma voz feminina chamando meu nome e me avisando de que eu seria o segundo brasileiro a entrar na pista. Minhas vistas escureceram. Tanta adrenalina correndo que mal acompanhei o desempenho do parceiro. Ao meu redor parecia não ter ninguém. Apenas o carro, que me aguardava silencioso rente ao muro que divide o boxe da pista. Entrei nele sem dificuldade, mas entrar não é bem o termo. “Escorregar” ficaria mais apropriado. Você desliza para dentro de um tubo e fica quase no nível do chão. Para a parte da F-1, são escalados quatro instrutores para cada “piloto”. Dois te amarram ao cinto de quatro pontos e você mal consegue respirar. Um terceiro fica ao lado e aciona o motor, além de auxiliar no engate da segunda marcha.

De dentro do capacete e com a viseira aberta, me lembrava daquele dia em 1977. Estava lá, dentro de um F-1, em Paul Ricard, e teria a responsabilidade de sair com ele dos boxes e completar duas voltas. Motor ligado, segunda marcha engatada e olho fixo no quarto instrutor, que gesticulou orientando a forma de acelerar. Primeiro algumas pisadas fortes e parece que eu iria explodir o motor, mas foi pouco. Ele acenou para pisar mais forte. E depois para eu manter o pé direito em uma posição que permitiria soltar bem devagar a embreagem para o carro não morrer e nem pular como um cavalo selvagem.

Senti um tranco e o F-1 rola na pista de Paul Ricard, o instrutor se assustou e logo tratou de deixar livre a passagem. É impressionante a rapidez com que o carro ganha velocidade, logo saímos dos boxes e chegou a primeira curva, contornada com o cuidado de um pai que traz seu filho para casa depois de sair da maternidade. Ele parecia amistoso, mas a menor pisada mais brusca, ele retrucava, gritava, me empurrava para trás como se estivesse dizendo: vá devagar. Eu acatei, mas assim que a Mistral apareceu na frente, fiz subir o giro do motor, que aceitava troca de marchas somente após os 5.500 rpm. Muito difícil quase impossível descrever aquela sensação de acelerar e acionar a borboleta do lado direito. Terceira, quarta, quinta, sexta marcha...muito vento, emoção, e fim da reta. Hora de pisar no freio, que respondeu de imediato. Com cautela contorno a última curva da primeira volta e passei em frente aos boxes onde recebi, simbolicamente, a bandeirada que significava a permissão para a derradeira volta. Como em uma cartilha, segui todas as recomendações, velocidade (controlada) nas retas e muita atenção nas curvas. Ao aproximar do boxe acionei o dispositivo e desliguei o motor do F-1. A fera rodou silenciosa e parou no local indicado. E... game over. 

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