Renata Nunes

RENATA NUNES escreve às sextas-feiras. renatanunes@otempo.com.br

Dono das renovações

Publicado em: Sex, 31/10/14 - 03h00

O mundo tem pressa. O tempo passa, e logo mais o ano será outro. As pessoas não correm para realizar antigos projetos. A corrida, agora, é para renovar desejos. Precisam de novos dias para voltar a sonhar. A virada surge como ponto de partida: é o segredo para encontrar a esperança. E justamente o tempo – que tantas vezes nos consome – é quem se apresenta como aliado. Logo ele, o senhor das horas, dos minutos e dos segundos... Construtor em movimento constante, tem nas mãos o poder da renovação. O sábio que vive o embate com seus servos humanos e suas contradições.

Gente como a Irene. Ela não quer ver o tempo passar. Reclama dia e noite de como ele “voa”. Trabalha muito o ano inteiro. Corretora de imóveis, cinquenta e poucos anos. Vive dias de estresse. Quer ficar mais com a família. Projeta metas, nunca cumpre. Viaja pouco. Promete sempre criar alternativas para o ano seguinte. Só promete. Encontrei Irene quando comprava presentes em um shopping. Apressada como sempre. Cheia de sacolas, ela ainda precisava terminar de encontrar os mimos. Tinha só uma hora. Aflita e sem prazer algum de estar ali. O compromisso seguinte sempre a assombra.

Irene não vê a hora de um novo ano chegar. Tem muitos planos para ele, mas nem sequer completou as promessas feitas para o período que acaba em breve. Sinceramente, ela não me parece o tipo de pessoa que pretende, de fato, mudar. Nem ao menos sair da rotina de loucuras. Uma pena, já que o tempo é sempre duvidoso com quem não se guarda para dele usufruir.

A professora Helena quer fazer diferente. Respeita o tempo. Teme as marcas que ele deixa em seu corpo. Por isso, vive sempre entre cremes e projetos. Faz mandingas. Acredita e defende a divisão dos anos. Para esperar a virada, veste-se de branco e cumpre religiosamente a tradição. Pula ondas, come lentilha e reza. Crê que as próprias ações são determinantes para o futuro.

Justamente para ser melhor, Helena quer se livrar logo. Diz que muitas coisas lhe fizeram mal. Seu marido a deixou, ganhou muitos quilos, e a mãe caiu doente. Tudo de uma vez. E a culpa, adivinhem? É do ano. Agora ela quer mudar: fará ginástica e novos amigos. A professora vai sair do atual emprego e espera ansiosamente por um novo amor. O tempo será um divisor de águas. Deposita nele todas suas esperanças. Embora eu tema por Helena, acredito que ele será gentil com seus novos propósitos.

Eu nunca fui a melhor amiga do senhor dos dias. Sempre quero fazer com que ele multiplique as horas. Cobro mais e mais minutos. Ainda assim, recebi do tempo os melhores presentes. Quanto mais ele passa, mais ganho. Serenidade, paciência e amadurecimento. Os anos me mostraram que as mudanças podem vir a qualquer hora. Não dependem de datas. Posso recomeçar no réveillon ou em junho, quando faço aniversário. Também posso escolher o amanhecer de cada dia para fazer planos para curto, médio ou longo prazo.

Independentemente da data, o que desejo realmente para as pessoas é que conheçam os pequenos prazeres. Estão por aí. Pode achá-los entre amigos ou ao lado da família. Eles podem estar em um sorriso e até mesmo no ócio. Um projeto novo de trabalho, um encontro inesperado, ouvir uma boa música, sentir um perfume ou simplesmente dançar podem ser pílulas de felicidade. Não há regra para ter prazer, mas certamente ele faz a vida da gente melhor. Boa procura a todos!

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