Renata Nunes

RENATA NUNES escreve às sextas-feiras. renatanunes@otempo.com.br

Mosquito à brasileira

Publicado em: Sex, 08/04/16 - 03h00
Já dizia um amigo meu: brasileiro quer tirar proveito de tudo...

No fim do mês passado aconteceu com ele. Um sujeito alto, forte, muito bem-nutrido, que nunca teve problemas de saúde, de repente, caiu de cama. Ele, mais um entre tantos outros cidadãos, estava “fora de circulação”, pelo menos por alguns dias. Em plena idade produtiva, estava difícil aguentar as dores de cabeça fortíssimas, o mal-estar, as manchas vermelhas pelo corpo, a febre alta e a raiva. Isso mesmo, uma raiva incontrolável acompanhada de uma revolta absurda.

O cara, que já andava xingando todos os políticos do país (por motivos óbvios), acrescentou o infeliz do mosquito, a quem se refere como “o tal do Aedes”, a sua lista de desafetos. “O desgraçado é pequeno, feio, tem pernas compridas e com listras brancas, desenvolve-se em água parada e ainda pode matar. Pode tanto que vem matando há anos e anos, sem ser eliminado como deveria”, esbraveja para quem possa ouvir. Pior. Não bastasse transmitir a dengue, a “praga ainda inventou de propagar o zika vírus e a chikungunya”.

Nestes dias, já de volta ao trabalho em sua loja, foi abordado por homens que se intitularam “técnicos de saúde e segurança”. Muito bem-uniformizados, inclusive com camisas com a logomarca da prefeitura, cobraram dele R$ 100 para combater os focos do mosquito em seu estabelecimento. Além da verificação, estava incluída a colocação de um produto que espantaria os tais mosquitos (por isso o custo). O senhor da loja da frente não quis pagar. Os moços disseram que o denunciariam à Vigilância Sanitária e que seria multado.

Recém-saído da dengue, e ainda com fortes lembranças das dores, o homem não pensou duas vezes. Mesmo alertado pelo concorrente, foi ao caixa, pegou o dinheiro e pagou feliz da vida. O ódio pelo mosquito o cegava diante da circunstância mais do que duvidosa. 
 
No dia seguinte à visita, ao abrir os jornais, imaginem, ficou surpreso. Estava estampado em letras grandes: Golpe baixo no combate à dengue – falsos agentes de saúde faturam alto no rastro da epidemia cobrando para combater focos do Aedes e oferecendo produtos ineficazes. Ele, obviamente, sentiu-se o ser mais ignorante da face da terra. Além de ser picado por um mosquito esquisito daqueles, foi enganado por estelionatários. Logo ele, um cara culto, politizado, que se julga tão inteligente, foi passado para trás, de forma tão primária. 

Agora, certamente, ficará mais atento. Só não diminuiu a raiva que sente pelo mosquito, pelas autoridades competentes que deveriam trabalhar mais e melhor para dar fim ao Aedes, pelo povo que não faz sua parte na limpeza e, ainda, pelos “filhos da mãe” que levaram sua grana. 

O pior vocês não sabem! Ele está tão irritado que anda perseguindo mosquitos por onde passa. Acha o bicho tão esperto que o vê como “bandido”. Disse que, se no “mundo dos mosquitos” o dinheiro tivesse algum valor, o Aeds estaria levando algum por fora só para faturar umas picadas a mais. Era só o que faltava, um mosquito à brasileira! Já chega a corrupção que anda espalhada pelo país afora – dos políticos e daqueles que querem levar vantagem em tudo na vida. 

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