SANDRA STARLING

Mamãe, não quero ir a Cuba

Ensinar a conhecer a ilha como ela merece: sem preconceitos

Por Da Redação
Publicado em 02 de janeiro de 2019 | 03:00
 
 

Para minha surpresa, tenho observado, ao ler a coluna de leitores deste jornal, que há, entre os que me prestigiam acompanhando meus artigos, aqueles que me acusam de ser uma espécie de fã do regime cubano. Começo por dizer que nunca fui àquela ilha. Confesso que, diferentemente do que se ouve no delicioso merengue de Caetano Veloso, nunca “quis ver a vida lá”. Sim, reconheço que Habana Vieja deve ser mesmo linda. Mas ter conhecido Cartagena de las Indias, cenário de memoráveis obras de Gabriel García Márquez, um grande entusiasta de Cuba, pode servir, de alguma forma, de compensação. Ao longo da vida, bastaram-me Ernest Hemingway, Alejo Carpentier, Ernesto Lecuona, Pablo Milanés, Silvio Rodriguez, Alicia Alonso e a fabulosa turma do Buena Vista Social Club para que minha curiosidade fosse saciada.

No dia 14 de agosto de 1996, por ocasião das comemorações do septuagésimo aniversário de Fidel Castro, proferi um discurso da tribuna da Câmara, como líder da bancada do PT, dizendo: “Prevaleceu e prevalece ainda contra Cuba a lógica da Guerra Fria. A geração do centenário de José Marti, como previu Fidel Castro, realizou uma revolução anti-imperialista, mas Cuba continua longe da democracia e das soluções de seus problemas econômicos e sociais”. E concluí: “Nosso dever é contribuir para romper o isolamento da ilha, colaborando, assim, para que ela se democratize”. Desnecessário dizer que meu pronunciamento foi recebido com reservas pelas autoridades cubanas e por muitos ditos esquerdistas no Brasil. Mas isso não abalou minhas convicções.

Respeito os que me criticam. Afinal, como corretamente afirmou Rosa Luxemburgo, “sem livre debate de opiniões, a vida se estiola em qualquer instituição pública”. Lamento, porém, que os que querem comigo debater opiniões não se atenham a fatos e não se empenhem na busca da verdade para sustentar seus argumentos. Enquanto formos incapazes de entender as motivações e não conseguirmos respeitar as posições dos que pensam de forma diferente, antagonismos serão sempre levados ao paroxismo. Tal qual me vi fazer diante da vitória do capitão da reserva, um político que tenho enorme dificuldade em aceitar.

Considerando que o Estado de Israel passa a ter evidência entre nós, seria bom que nos debruçássemos sobre os ensinamentos dos que buscam, na Palestina, superar as polarizações com iniciativas progressivas de tolerância, aproximação e confraternização. Basta acompanhar os exemplos militantes de Daniel Barenboim, na música, e de Amós Oz – que, infelizmente, acaba de nos deixar – na literatura.

Continuarei, em 2019, a expressar minhas convicções, não me importando muito, como escreveu Vittorio Medioli há poucos dias, “com o julgamento e as críticas dos outros”, preferindo “atender a voz da própria consciência, mesmo quando incompreendida”.

De minha parte, começarei o ano lendo o mais novo livro de Leonardo Padura, “A Transparência do Tempo”. Também ele tem me ensinado a conhecer Cuba, como ela merece ser conhecida: sem preconceitos.