Wilson Campos

Escorço histórico da resiliente serra do Curral

Fachada se mantém, mas é preciso curar feridas

Por Wilson Campos
Publicado em 23 de junho de 2022 | 03:00
 
 

Em 1958, o governador mineiro José Francisco Bias Fortes solicitou ao ministro da Educação o tombamento da serra do Curral. O parecer do Departamento Jurídico do Estado, que fundamentou o pedido, manifestava a preocupação do governo com as atividades mineradoras, consideradas capazes de provocar o desaparecimento da serra.

Apenso ao Ofício 2.018/1958, o parecer afirmava: “(...) Não pairam dúvidas sobre a possibilidade do tombamento da aludida serra; os monumentos naturais, bem como os sítios e paisagens, são susceptíveis de tal medida, quando dotadas pela natureza de uma feição notável e inconfundível”.

Em 1960, o processo de tombamento 591-T-58 seguiu os trâmites legais e originou os atos da inscrição de número 29, registrados às folhas do Livro de Tombo de número 1 (arqueológico, etnográfico e paisagístico), que consagraram o tombamento do conjunto paisagístico do pico e da parte mais alcantilada da serra do Curral. A proteção do patrimônio histórico estava assegurada em âmbito federal.

Em 1969, a Companhia Urbanizadora da Serra do Curral (Ciurbe), sociedade de economia mista controlada pelo Estado de Minas Gerais e proprietária dos terrenos, deu início à implantação da chamada “Cidade da Serra”. A urbanização foi concluída por sua sucessora, a Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado de Minas Gerais (Codeurb).

Em 1973, os projetos de parcelamento foram aprovados pela Prefeitura de Belo Horizonte (Decretos 2.317 e 2.383), com a denominação do local como “Bairro das Mangabeiras”.</CW>
Também nesse ano, o governador Rondon Pacheco, preocupado com a integridade do bem tombado, determinou a constituição de uma comissão especial para avaliar as atividades de mineração na serra do Curral e considerou “non aedificandi” todos os terrenos situados acima do Anel da Serra (atual avenida José do Patrocínio Pontes).

Desde 1976 surgiram sucessivos decretos municipais, a maioria permitindo edificações residenciais, instalação de empreendimentos e exploração de minério de ferro. Da mesma forma, o Estado contribuiu para o processo de degradação da serra, notadamente de 1978 a 2022. 

Em 2013, a prefeitura editou a Lei 10.630, que alterou a Lei de Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo e estabeleceu novos parâmetros urbanísticos, com o intuito de promover a construção de grandes empreendimentos, inclusive em zonas de proteção ambiental.

Em 2022, o Estado, sempre à mercê das mineradoras, autorizou novas atividades por grandes períodos, além das já existentes, que estão transformando a área natural e ambiental em um verdadeiro queijo suíço.

As feridas causadas nas costas da serra do Curral a tornaram frágil, mas não a ponto de acabar com a sua resiliência natural, capaz de suportar os golpes nos flancos e nos fundos e ainda manter uma fachada verde com vista para a cidade. Mas quem vai, de fato, curar as feridas? 

Requer-se, portanto, ao governador Romeu Zema que faça como os governadores Bias Fortes e Rondon Pacheco – proteja a serra do Curral – e determine no âmbito estadual o seu tombamento definitivo.

 

Wilson Campos é advogado, especialista com atuação nas áreas de Direito Tributário, Trabalhista, Cível e Ambiental