Cinema

Duas décadas de filmes e verdades  

Redação O Tempo

Por Giselle Ferreira
Publicado em 25 de abril de 2015 | 03:00
 
 
“Drone”, da norueguesa Tonje Schei, discute mortes causadas pelo aparelho no Paquistão Divulgação

De Leonilson a Orson Welles; da religiosidade brasileira às mortes causadas por drones norte-americanos no Paquistão. Apesar de enxuto em relação à programação de São Paulo e Rio, a edição belo-horizontina do “Festival Internacional de Documentários É Tudo Verdade/It’s All True” segue variada. Dos 109 filmes exibidos nas mostras paulista e carioca, BH apresenta 16 a partir da próxima quarta (29), no CCBB. 

Principal evento sul-americano dedicado exclusivamente ao cinema documental, o “É Tudo Verdade” completa 20 anos e comemora com homenagens aos grandes filmes exibidos nestas duas décadas, ao centenário de Orson Welles e ao aniversário de 80 anos do sergipano Vladimir Carvalho.
 
“Há uma série de momentos inesquecíveis a cada ano. A vinda de mestres como Marcel Ophuls, em 1997, e de Robert Drew, em 2005, as estreias de ‘Santiago’, na abertura de 2006, e de ‘Uma Noite em 67’, na de 2010 certamente estão entre eles”, conta o jornalista Amir Labaki, idealizador e diretor do evento, sobre os grandes destaques destas 20 edições. 
 
De Welles, que completaria 100 anos em 2015, o festival exibe o longa que lhe empresta o nome – “It’s All True – Baseado no Projeto Inacabado de Orson Welles” (1993). De Carvalho, que aos 80 anos continua gravando a todo vapor, “O País de São Saruê” (1971) foi o escolhido por ser seu primeiro documentário de longa-metragem.
 
“Batizar o festival a partir de Welles foi para celebrar, por um lado, a incursão brasileira de um dos maiores cineastas da história. Por outro, foi uma piscadela auto-irônica: tudo é verdade num evento dedicado a obras ancoradas no cinema do real”, revela Labaki, acrescentando que Welles marcou seu nome na história do gênero documentário não só pelas obras do estilo, mas também pelos rastros da realidade deixados em toda sua trajetória.
 
“Orson Welles foi também documentarista – e dos bons. Ele pode ter deixado uma obra documental de poucos títulos efetivamente concluídos, mas mesmo em seus filmes de ficção, elementos não-ficcionais tiveram presença notável. Já Vladimir Carvalho é um dos autores essenciais do documentário moderno no Brasil. Ele é o elo entre a geração de ‘Aruanda’ e do Cinema Novo e a novíssima geração do documentário digital. Era obrigatório celebrar seu 80º aniversário em plena atividade”.
 
Vencedores
A abertura fica por conta de “A Paixão de JL”, de Carlos Nader, que venceu a competitiva nacional pela terceira vez. “A França É Nossa Pátria”, do cambojano Rithy Panh, que levou o prêmio da mostra internacional, fecha o festival na segunda, 4.
 
“Últimas Conversas”, derradeira produção de Eduardo Coutinho (1933-2014), finalizado por João Moreira Salles, não vem a BH, mas o documentarista terá reprisado seu “Santo Forte” (1998). O longa será exibido na “Retrospectiva 20! Vinte aos Pares” juntamente com “Sicário, Quarto 164” (2010), de Gianfranco Rosi. “Paulinho da Viola, Meu Tempo É Hoje” (2003) será exibido no mesmo dia de “Herbert de Perto” (2006), de Roberto Berliner e Pedro Bronz – sobre o vocalista dos Paralamas do Sucesso – e os quatro marcam a efeméride da mostra. Únicos não inéditos na lista, os filmes serão reapresentados pela “honra de terem sido lançados pelo festival”, segundo Labaki. “É incrível como vários deles já se tornaram clássicos”, conclui.
 
Confira algumas sessões imperdíveis
 
“É Tudo Verdade: Baseado Em Um Filme Inacabado de Orson Welles” (EUA, 89min). Dir. Bill Krohn, Myron Meisel e Richard Wilson. Como parte da aproximação dos EUA com a América Latina, Orson Welles é mandado para México e Brasil com um filme encomendado. O que deveria ser um documentário de três episódios acaba como um projeto nunca terminado. O longa em questão refaz a história da saga, com depoimentos do próprio Welles, da equipe, de personagens da trama e trechos dos episódios.
 
“A Paixão de JL” (Brasil, 82min). Dir. Carlos Nader.Vencedor da competição brasileira de longas 2015. Em janeiro de 1990, aos 33 anos, o artista José Leonilson (1957-1993) começa a gravar, em fitas cassete, um diário íntimo. Impressões gerais e comentários sobre os acontecimentos que sacudiam o país e o exterior, como a queda do Muro de Berlim, percorrem suas confissões. Esses registros, testemunhas da sintonia entre sua vida e sua obra, são o esqueleto sonoro-documental a partir do qual trabalhou Nader.
 
“A França É Nossa Casa”. (França/Camboja, 75min). Dir. Rithy Panh. Vencedor da competição internacional de longas de 2015, o filme vale-se de materiais de arquivo de diversas procedências – sem comentários em off nem trilha sonora – para recontar quase um século de colonização francesa na Indochina. Com cenas cotidianas e acompanhando a construção de ferrovias, escolas e teatros, as imagens evidenciam a arrogância de um processo de dominação colonialista. 
 
É Tudo Verdade
CCBB BH (Praça da Liberdade, 450, 
Funcionários, 3431-9400). De 29/4 a 4/5. Sessões às 14h, 16h e 18h. Gratuito.