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Arte na era disruptiva 

Festival Internacional de Linguagem Eletrônica traz mostra que permite que visitante se integre às obras e vivencie novos tipos de experiências

Por Alex Bessas
Publicado em 13 de janeiro de 2018 | 04:00
 
 
Ser “esmagado” entre dois travesseiros gigantes é uma das experiências da mostra Disruptiva Foto: FILE/Divulgação

De uns tempos para cá, visitar museus tem se tornado uma experiência nova. Não necessariamente pelas exposições e mostras que são oferecidas nesses espaços, mas pelo comportamento dos visitantes. Entre selfies, transmissões ao vivo e outras variações de registros de tais momentos, o público, sempre com celular em punho, vem se integrando ao que antes apenas assistia – fato que, em si, denuncia o óbvio: vivemos uma era disruptiva, isto é, que rompe com tradições e inaugura novos paradigmas de comportamento. 

Claro, há quem ainda torça o nariz e estranhe tanta interação. Mas há também quem não sinta incômodo algum diante dessa nova realidade, pelo contrário: o cenário é de entusiasmo. É o caso de Ricardo Barreto e Paula Perissinotto, organizadores do Festival Internacional de Linguagem Eletrônica (File), que traz para o CCBB de Belo Horizonte, a partir da próxima sexta (19), a mostra “A Arte Eletrônica na Época Disruptiva”, que reúne 120 obras, entre instalações imersivas e animações.
 
“É uma mostra que tem interatividade, mas não só: tem ‘vivenciação’, imersão e outras formas de cinetismo”, avisa Barreto, para quem as novas experimentações artísticas significam, para a nossa sociedade, o que o lançamento do primeiro filme representou à sua época. 
 
“É muito claro que houve uma disruptividade do comportamento clássico do espectador diante da obra de arte. Hoje, o público quer participar, se envolver, vivenciar”, analisa. Como exemplo, o curador indica como o público alterou, em seu contato, uma das obras expostas em “Disruptiva”. “A peça ‘Piso’, dos brasileiros Rejane Cantoni e Leonardo Crescenti, foi pensada para que as pessoas ficassem de pé. Mas logo se viu que os visitantes curtiram sentir aquela onda deitados, mudando o sentido, transformando a experiência”, comenta ele, para, em seguida arrematar que “ver as reações das pessoas é contaminante!”.
 
Sucesso
 
A exposição que chega à capital mineira já passou, no último ano, por Brasília. Lá, durante 60 dias, quase 140 mil visitantes estiveram no local, interagindo com as obras e instalações. “Considerando todas exposições que fizemos com o File, conseguimos levar 350 mil pessoas para os museus. Nenhum outro evento de arte e tecnologia do mundo consegue acessar tantas pessoas. Nesse quesito, somos os maiores”, orgulha-se Barreto, lembrando que o público anual pode ser até maior que o alcance do Inhotim, maior museu a céu aberto do planeta.
 
Para chegar a um número tão expressivo, foram anos dedicados a compreender esse novo formato artístico. “Iniciamos em 2000, quando começamos a notar que uma gama de tecnologias modificava nosso comportamento em relação às obras de arte”, lembra o curador. Inicialmente, aliás, havia quem não acreditasse que a proposta fosse ser popular. “Diziam que seria algo para intelectuais e o que a gente viu foi justamente o contrário”, assegura ele, completando que, “nestes 18 anos, o público só vem aumentando, exponencialmente”, afirma.
 
Destaques
 
Ao Pampulha, o curador da mostra indicou alguns destaques de “Disruptiva”. “Eu, particularmente, gosto muito de ‘Physical Mind’ (do holandês Teun Vonk), que consiste em dois balões infláveis. A pessoa deita e, enquanto ele é inflado, tem a sensação de estar indo para o espaço. E tem outro balão, que vai comprimindo a pessoa, criando uma sensação de relaxamento”, detalha. “Teun Vonk quis fazer a obra porque era algo que trazia muita calma para ele”, acrescenta.
 
Dos alemães Thi Binh Minh e Christin Marczinzik, “Swing” é outra experiência inquietante da mostra, consistindo basicamente em um balanço e óculos de realidade aumentada. “Há o cinetismo do balanço físico, comportamento que coincide com o universo virtual. A sensação que você tem é que está voando!”, afirma Barreto, emendando ser algo “profundamente impactante”.
 
Outro trabalho que ganha holofotes é “Shrink 01995”, do belga Lawrence Malstaf, obra que permite que o visitante seja embalado a vácuo entre duas folhas plásticas e suspenso ali, no meio da sala, tornando-se parte da exposição. Em outras instalações, é possível, por exemplo, experimentar trocar virtualmente de sexo para contemplar uma praia deserta.
 
À medida que narra as experiências que a imersão e interação com as obras lhe trouxe, Barreto pondera que só há uma forma de entender, de fato, o que ele está falando. “Quando estiver lá”. Afinal, ao falar sobre, a experiência pode parecer muito abstrata e só “tête-à-tête” é possível compreender esse “brincar com os sentidos”. Para ele, por sinal, a experiência só é completa quando coletiva. Portanto, visitar a mostra com a casa cheia é algo que se integra à proposta de “Disruptiva”. “Vá lá um dia para ver as reações das pessoas. É algo impressionante”, aconselha, com ênfase.
 
Da trajetória do File, esta é sua 18º edição. O fato de começar o ano em Belo Horizonte, pois, é razão de orgulho por parte dos curadores. “Estamos abrindo o ano aqui e é uma honra, já que consideramos BH um cenário interessante, com um público aguçado, curioso. Nós vemos os mineiros dentro desse contexto da inovação, da disruptividade”, elogia Barreto. Ele avisa que a ideia é também “intrigar as pessoas, fazendo com que tenham novas percepções. Assim, será possível sentir tudo de uma outra maneira”, sinaliza, perceptivelmente animado.
 
Disruptiva
18º edição do File – Festival Internacional de Linguagem Eletrônica. CCBB (praça da Liberdade, 450, Funcionários). De 19 de janeiro até 19 de março. De quarta a segunda, das 9h às 21h. Entrada gratuita.