Espaço Gourmet

Não há limites  

O bolo de chocolate é quase uma unanimidade. Confeiteiros da capital incrementam a receita clássica e produzem versões deliciosas

Por Lorena K. Martins
Publicado em 20 de janeiro de 2018 | 04:00
 
 
O campeão da Doce que Seja Doce: bolo da Matilda, feito chocolate 60% com ganache 70% e caramelo belga Foto: Uarlen Valerio

Quem foi criança nos anos 1990 provavelmente desejou experimentar uma fatia do emblemático bolo do filme “Matilda” (1996), devorado inteiro pelo personagem Bruce, a mando da diretora da escola.

Da telona para a vida real, desde 2013 a confeiteira Luana Drumond proporciona a experiência de defrontar-se com uma versão da inspiradora receita na vida real. Antes hospedado no extinto restaurante Belo Comidaria, o Bolo da Matilda – agora oficialmente da Doce que Seja Doce – tornou-se um dos cakes mais famosos da capital mineira, junto a gostosuras como a torta de chocolate com cobertura trufada da Fany Bombons, tradição há 40 anos.

Sim, o bolo de chocolate é uma unanimidade. Mas engana-se quem ainda pensa que não é possível incrementar ainda mais a iguaria. Cada vez mais, chefs confeiteiros, como Luana, se propõem a criar versões inovadoras da receita, prezando sempre por ingredientes de qualidade em todas as etapas da confecção. No caso do Matilda, a receita, que leva o nobre chocolate da Callebaut – uma empresa belga – tanto na massa quanto no recheio, resulta em uma estética “rústica”, porém super atrativa ao olhar. “É um bolo muito simples, com intensidades diferentes de chocolate. Acho que menos é mais, o produto precisa ser mais gostoso do que bonito, sempre”, acredita. “Ele é um bolo fiel e mostra exatamente o que você vai comer”, frisa ela, referindo-se às tentadoras camadas alternadas de chocolate e de caramelo belga.

Assim como Luana, a opção por ingredientes de qualidade faz toda a diferença. E, neste caso, quem manda, claro, é o chocolate. Para o chef confeiteiro Lucas Corazza, jurado do programa “Que Seja Doce” (GNT), é um fator é fundamental. Muitas de suas receitas, vale dizer, usam cacau nacional, produzido por fazendas de ponta.

A execução do bolo de chocolate não guarda muitos segredos. “O brasileiro criou o hábito de comer bolos bem ‘molhadinhos’ – e até ensopados. Mas prefiro uma boa massa, firme e úmida, feita com cacau, para ficar bem escura. O recheio é uma boa ganache com creme de leite fresco, cremosa e brilhante. Tudo adquire uma mesma textura. E é na mordida que você sente a diferença entre a massa e o recheio”, entrega ele, que opta por uma massa com pouca farinha, para obter um bolo denso e aromático, em uma das várias receitas que cria por ano.

 

FOTO: Breno Mayer/divulgação
 
O bolo da T Special Cakes é feito com camadas de brownie, recheio de brigadeiro de doce de leite e ganache de chocolate belga

Novo paladar

Conta a história que a parceria entre bolo e chocolate existe desde o século XVII, na Inglaterra. De lá para cá, ganhou variações e também “menos açúcar”, priorizando o sabor mais próximo ao amargo. A chef pâtissière Mariana Correa, da La Parisserie, incrementa a massa com farinha de avelãs e chocolate belga 50%, enquanto o confeiteiro Thiago Caixeta, da T Special Cakes, trocou uma massa tradicional por uma base de brownie e recheio de brigadeiro de doce de leite. “O amargo com o doce proporciona uma sensação diferente. Também uso sempre uma pitada de sal para realçar o sabor do chocolate e abrir as papilas gustativas”, ensina Thiago.

Para Lucas Corazza, o chocolate amargo está ganhando mais espaço no mercado da confeitaria. “O que ainda me assusta são os bolos que concentram muito açúcar, o que sobrecarrega o paladar e impede a apreciação do sabor por completo, inclusive do ingrediente principal, que é o cacau”.

Receita

Gâteau gianduia (Receita da chef pâtissière Mariana Correa, da La Parisserie)

FOTO: Victor Schwaner/divulgação
Bolo de chocolate callebaut 50% com farinha de avelãs, ganache giandua e avelãs caramelizadas

Ingredientes

- Massa:

60g de farinha de trigo 

1 colher de café de fermento

50g de farinha de avelãs

100g de açúcar refinado

80g de manteiga sem sal

3 ovos

150g de chocolate 50%

- Ganache:

200g de chocolate gianduia 

75g de creme de leite fresco 

25g de leite integral

- Decoração: 

30g de chocolate ao leite

50g de avelãs 

25g de açúcar refinado

Modo de preparo

- Massa:

Derreta o chocolate com 5 colheres de sopa de água, e reserve. Derreta a manteiga e deixe esfriar. Bata os ovos com açúcar até ficar bem fofo. Junte a farinha, o fermento, a manteiga derretida, a farinha de avelãs e o chocolate derretido nessa ordem. Misture bem com uma espátula e asse em forno pré-aquecido a 180ºC, em forma untada, por 45 minutos a uma hora. Espere 5 minutos antes de desenformar. Deixe esfriar completamente antes de decorar.

- Ganache:

Aqueça o leite e o creme de leite. Despeje sobre os chocolates e a pasta de avelãs. Misture até ficar homogêneo. Leve à geladeira até começar a firmar. Coloque em um saco de confeitar com bico liso e decore.

- Decoração: 

Faça um praliné com as avelãs e o açúcar. Deixe esfriar e quebre em pedaços grandes. Decore o bolo. Derreta o chocolate ao leite e faça riscos finos sobre o bolo.

FOTO: Lucas Corazza/Divulgação
Bem brasileiro Priorizando os chocolates nacionais, Lucas Corazza criou o bolo fudge – sobremesa tradicional nos EUA –, com chocolate da Unique, de cacau de origem brasileira. A receita utiliza pouca farinha, mas muitos ovos e manteiga, para deixar a massa bem cremosa.

Clássicos X inovadores

Mesmo apostando em técnicas da culinária francesa, a chef pâtissière Mariana Correa não questiona, em momento algum, o poder da clássica receita do bolo de chocolate com recheio e/ou cobertura de brigadeiro. Mas é fato: a inovação obtida pela exploração de novos sabores – como a prevalência do amargo na receita e as porcentagens de cacau no chocolate – segue sim, em alta.

FOTO: Fany Bombons/Divulgação
A cobertura generosa de chocolate trufado em volta da torta da Fany Bombons

Por outro lado, poucas receitas são tão nostálgicas como o clássico bolo de chocolate – e, nesse caso, por lembrar a infância, o acento da doçura é quase obrigatório. “Os tradicionais ‘bolos da vovó’ sempre terão presença garantida à mesa das famílias, principalmente pelo fato de acionarem a nossa memória afetiva. Afinal, crescemos comendo esses bolos”, analisa a chef. Na Fany Bombons, a torta de chocolate, carro-chefe da casa há anos, combina recheio de brigadeiro à cobertura trufada. Uma delícia.